Manual De Recomendações Da ABN Em Parkinson 2010

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Elza Dias-Tosta
Carlos Roberto de Mello Rieder
Vanderci Borges
Ylmar Correa Neto
e colaboradores
Doença de
Parkinson
Recomendações
Doença de
Parkinson
Recomendações
Elza Dias-Tosta
Carlos Roberto de Mello Rieder
Vanderci Borges
Ylmar Correa Neto
e colaboradores
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2 Doença de Parkinson – Recomendações
Doença de Parkinson – Recomendações 3
PARTICIPANTES
AILTON DE SOUZA MELO
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor de Neurologia. Departamento de Neurociências
e Saúde Mental, Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia.
ALEXANDRE ALUÍZIO COSTA MACHADO
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Doutor em Neurologia pela Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo. Médico Assistente do Serviço de Neurologia do Hospital das Clínicas da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo.
ANA LÚCIA ZUMA DE ROSSO
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Neurologista Responsável pelo Setor de Distúrbios
do Movimento do Serviço de Neurologia Prof. Sergio Novis, Hospital Universitário Clementino Fraga Filho,
Universidade Federal do Rio de Janeiro.
ANDRÉ CARVALHO FELÍCIO
Membro Efetivo da Academia Brasileira de Neurologia. Médico Neurologista pela Universidade Federal de
São Paulo. Doutorado em Curso pelo Departamento de Neurologia e Neurocirurgia da Universidade Federal de
São Paulo.
ANTONIO LÚCIO TEIXEIRA JR.
Membro Efetivo da Academia Brasileira de Neurologia. Médico Neurologista e Psiquiatra. Professor da Faculdade
de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais.
ARLETE HILBIG
Membro Efetivo da Academia Brasileira de Neurologia. Professora Adjunta do Departamento de Clínica Médica
da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre. Doutora em Medicina, Clínica Médica pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
CARLOS FREDERICO LEITE DE SOUZA LIMA
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Mestre em Neurologia dos Distúrbios do Movimento pela
Escola Paulista de Medicina. Coordenador do NUPEDIM - Núcleo Pernambucano de Distúrbio do Movimento,
Serviço de Neurologia Clínica do Hospital Universitário Oswaldo Cruz - PE.
CARLOS ROBERTO DE MELLO RIEDER
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Coordenador do Departamento Científico de Transtornos
do Movimento da Academia Brasileira de Neurologia. Professor de Pós-Graduação em Ciências Médicas da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Coordenador do Grupo de Distúrbios do Movimento do Hospital das
Clínicas de Porto Alegre. Pesquisador do CNPq.
CLÉCIO DE OLIVEIRA GODEIRO JR.
Membro Efetivo da Academia Brasileira de Neurologia. Pós-Graduando do Setor de Transtornos do Movimento da
Universidade Federal de São Paulo. Professor Auxiliar da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
DÉBORA PALMA MAIA
Membro Efetivo da Academia Brasileira de Neurologia. Neurologista pela Universidade de São Paulo/Ribeirão
Preto. Mestre em Saúde da Criança e do Adolescente pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de
Minas Gerais.
4 Doença de Parkinson – Recomendações
DELSON JOSÉ DA SILVA
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Neurologista e Coordenador do Núcleo de Neurociências
da Universidade Federal de Goiás.
DENISE HACK NICARETTA
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Doutora e Mestre em Medicina pela Universidade Federal
Fluminense. Responsável pelo Ambulatório de Distúrbios do Movimento da 24ª e 25ª Enfermarias da Santa Casa
de Misericórdia do Rio de Janeiro, Serviço do Prof. Sérgio Novis.
EGBERTO REIS BARBOSA
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Livre-Docente do Departamento de Neurologia da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
ELIZABETH M.A. BARASNEVICIUS QUAGLIATO
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professora Doutora. Colaboradora do Departamento de
Neurologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas.
ELZA DIAS-TOSTA
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. PhD pela Universidade de Londres. Presidente da
Academia Brasileira de Neurologia.
FLÁVIO AUGUSTO SEKEFF SALLEM
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Membro da Movement Disorders Society.
FRANCISCO EDUARDO COSTA CARDOSO
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor Titular de Neurologia, Departamento de Clínica
Médica, Universidade Federal de Minas Gerais.
GERALDO NUNES VIEIRA RIZZO
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Especialista em Neurologia, Neurofisiologia e Medicina
do Sono. Serviço de Neurologia e Neurocirurgia do Hospital Moinhos de Vento. SONOLAB - Laboratório de Sono,
Porto Alegre.
GUILHERME GUSTAVO RICCIOPPO RODRIGUES
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Mestre em Neurologia pela Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto. Médico Assistente do Setor de Neurologia Cognitiva e Distúrbios do Movimento do Hospital das
Clínicas de Ribeirão Preto. Professor de Neurologia da Faculdade de Medicina do Centro Universitário Barão de Mauá.
HÉLIO AFONSO GHIZONI TEIVE
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor Adjunto de Neurologia. Chefe do Serviço de
Neurologia e do Setor de Distúrbios do Movimento do Hospital das Clínicas da Universidade Federal do Paraná.
HENRIQUE BALLALAI FERRAZ
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor Livre-Docente da Disciplina de Neurologia da
Universidade Federal de São Paulo. Chefe do Setor de Transtornos do Movimento da Disciplina de Neurologia da
Universidade Federal de São Paulo.
JOÃO CARLOS PAPATERRA LIMONGI
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Doutor em Neurologia pela Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo. Neurologista do Grupo de Distúrbios do Movimento do Departamento de Neurologia
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Doença de Parkinson – Recomendações 5
JOÃO SANTOS PEREIRA
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor Associado da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro. Member of The Movement Disorder Society.
JOSÉ MARCELO FERREIRA BEZERRA
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor Adjunto Doutor da Faculdade de Ciências
Médidas, Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Coordenador do Ambulatório de Distúrbios do Movimento do
Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro.
LUIZ AUGUSTO FRANCO DE ANDRADE
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor Livre-Docente de Neurologia e Pesquisador do
Instituto do Cérebro (Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa), Hospital Israelita Albert Einstein.
MÁRCIO DA CUNHA ANDRADE
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Mestre em Neurologia pela Universidade Federal de
Pernambuco. Coordenador do Ambulatório de Distúrbios do Movimento da Universidade Federal de Pernambuco.
MARCUS VINICIUS DELLA COLETTA
Membro Efetivo da Academia Brasileira de Neurologia. Neurologista pela Universidade Federal do Paraná.
Coordenador do Ambulatório de Distúrbios do Movimento da Universidade Federal do Amazonas. Mestre em
Medicina Interna, Universidade Federal do Paraná.
MARIA SHEILA GUIMARÃES ROCHA
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Doutora em Neurologia pela Universidade Federal de São
Paulo. Chefe da Neurologia do Hospital Santa Marcelina.
MARIANA SPITZ
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Doutora em Neurologia pela Universidade de São Paulo.
Professora de Neurologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
MÔNICA SANTORO HADDAD
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Médica Assistente do Ambulatório de Distúrbios do
Movimento da Divisão de Clínica Neurológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade
de São Paulo.
NASSER ALLAM
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Coordenador do Serviço de Parkinson e Transtornos do
Movimento do Hospital de Base do Distrito Federal e Pesquisador Adjunto do Laboratório de Neurociências e
Comportamento da Universidade de Brasília.
ORLANDO GRAZIANI POVOAS BARSOTTINI
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor Afiliado-Doutor. Departamento de Neurologia
e Neurocirurgia da Universidade Federal de São Paulo, Escola Paulista de Medicina. Coordenador dos Setores
de Neurologia Geral e Ataxias da Disciplina de Neurologia Clínica da Universidade Federal de São Paulo, Escola
Paulista de Medicina.
PAULO CARAMELLI
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor Adjunto do Departamento de Clínica Médica da
Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais.
6 Doença de Parkinson – Recomendações
RENATO PUPPI MUNHOZ
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Médico Neurologista. Mestre em Medicina Interna
Universidade Federal do Paraná. Chefe do Serviço de Neurologia, Pontifícia Universidade Católica do Paraná e da
Associação Paranaense de Portadores de Parkinsonismo.
RICARDO NITRINI
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Neurologista. Professor Livre-Docente da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo. Coordenador do Grupo de Neurologia Cognitiva e do Comportamento do
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
ROBERTA ARB SABA RODRIGUES PINTO
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Mestre em Neurologia pela Universidade Federal de São
Paulo. Médica Assistente do Hospital do Servidor Público Estadual.
ROBERTO CÉSAR PEREIRA DO PRADO
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Doutor em Neurologia pela Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo. Professor Adjunto de Neurologia da Universidade Federal de Sergipe.
SARAH TEIXEIRA CAMARGOS
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Doutora pela Universidade Federal de Minas Gerais e
National Institutes of Health. Professora Adjunta da Clínica Médica da Universidade Federal de Minas Gerais.
SÔNIA MARIA CÉSAR DE AZEVEDO S.M.M. GOMES
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Médica Assistente Doutora da Universidade Federal de
São Paulo. Coordenadora do Ambulatório de Distúrbios dos Movimentos do Hospital do Servidor Público Estadual
de São Paulo.
VANDERCI BORGES
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professora Afiliada da Disciplina de Neurologia da
Universidade Federal de São Paulo. Médica Neurologista do Setor de Transtornos do Movimento da Universidade
Federal de São Paulo.
VITOR TUMAS
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Setor de Distúrbios do Movimento e Neurologia
Comportamental. Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento. Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo. Campus Universitário Monte Alegre.
WAGNER DE GÓES HORTA
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Médico Neurologista. Coordenador do Ambulatório de
Transtornos dos Movimentos do Hospital Universitário Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará.
YLMAR CORRÊA NETO
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor Adjunto Doutor da Universidade Federal
de Santa Catarina. Coordenador do Ambulatório de Distúrbios dos Movimentos do Hospital Universitário da
Universidade Federal de Santa Catarina.
Doença de Parkinson – Recomendações 7
$OENÀA DE 0ARKINSON n 2ECOMENDAÀµES
Copyright® 2010, Academia Brasileira de Neurologia - Produzido por Omnifarma Editora Ltda.
Proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer sistema,
sem prévio consentimento de Omnifarma Editora Ltda.
Todos os direitos reservados para Academia Brasileira de Neurologia.
Doença de Parkinson : recomendações /
Elza Dias Tosta da Silva...[et al.]. -- 1. ed. --
São Paulo : Omnifarma, 2010.
Outros autores: Carlos Roberto de Mello Rieder, Vanderci Borges,
Ylmar Correa Neto e colaboradores.
Bibliografia.
ISBN 978-85-62477-05-8
1. Mal de Parkinson 2. Mal de Parkinson - Diagnóstico 3. Mal de
Parkinson - Tratamento. I. Silva, Elza Dias Tosta da. II. Rieder, Carlos
Roberto de Mello. III. Borges, Vanderci. IV. Correa Neto, Ylmar.
CDD-616.833
10-08817 NLM-WL 359
DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)
(CÂMARA BRASILEIRA DO LIVRO, SP, BRASIL)
Índices para catálogo sistemático
1. Doença de Parkinson : Medicina 616.833
Impresso no Brasil 2010
8 Doença de Parkinson – Recomendações
Doença de Parkinson – Recomendações 9
SUMÁRIO
Editorial ......................................................................................................................... 
Elza Dias-Tosta
2ECOMENDAÀµES PARA OTRATAMENTO DA DOENÀA DE 0ARKINSON............................... 
Carlos Roberto de Mello Rieder, Vanderci Borges,
Ylmar Corrêa Neto, Elza Dias-Tosta
2ECOMENDAÀµES PARA OTRATAMENTO DA FASE INICIAL DA DOENÀA DE 0ARKINSON .... 
Coordenação: Vanderci Borges e Luiz Augusto Franco de Andrade
Composição: Ana Lucia Zuma de Rosso, Roberta Arb Saba Rodrigues Pinto,
Alexandre Aluizio Costa Machado, Carlos Frederico Leite de Souza Lima
4RATAMENTO DA FASE AVANÀADA DA DOENÀA DE 0ARKINSON COM
ESTRAT£GIAS TERAPäUTICAS PARA mUTUAÀµES MOTORAS EDISCINESIAS ........................ 
Coordenação: Henrique Ballalai Ferraz e Egberto Reis Barbosa
Composição: Orlando Graziani Povoas Barsottini, Denise Hack Nicaretta,
Débora Palma Maia, Flávio Augusto Sekeff Sallem
4RATAMENTO DAS COMPLICAÀµES NEUROPSIQUIÖTRICAS ................................................ 
Coordenação: Francisco Cardoso e Ylmar Corrêa Neto
Composição: João Santos Pereira, Roberto César Pereira do Prado,
Guilherme Gustavo Riccioppo Rodrigues, Antonio Lúcio Teixeira Jr.
4RATAMENTO DA DEMäNCIA NA DOENÀA DE 0ARKINSON ................................................. 75
Coordenação: Vitor Tumas, Mônica Santoro Haddad
Composição: Ricardo Nitrini, Paulo Caramelli, Marcus Vinicius Della Coletta,
Maria Sheila Guimarães Rocha
4RATAMENTO DOS DIST¢RBIOS DO SONO DA DOENÀA DE 0ARKINSON ............................... 85
Coordenadores: Geraldo Nunes Vieira Rizzo e Hélio Afonso Ghizoni Teive
Composição: Renato Puppi Munhoz, Nasser Allam,
Wagner de Góes Horta, Sarah Teixeira Camargos
4RATAMENTO DAS DISAUTONOMIAS NA DOENÀA DE 0ARKINSON ...................................... 
Coordenadores: Elizabeth M.A. Barasnevicius Quagliato e Ailton de Souza Melo
Composição: André Carvalho Felício, Arlete Hilbig,
João Carlos Papaterra Limongi, Mariana Spitz
)NDICAÀµES DE TRATAMENTO CIR¢RGICO NA DOENÀA DE 0ARKINSON ............................ 
Coordenação: Carlos Roberto de Mello Rieder e Delson José da Silva
Composição: Márcio da Cunha Andrade, Sônia Maria César de Azevedo S.M.M. Gomes,
Clécio de Oliveira Godeiro Jr., José Marcelo Ferreira Bezerra
10 Doença de Parkinson – Recomendações
ERRATA
Na página 35, atualizamos o tópico como segue abaixo:
Doença de Parkinson – Recomendações 35
tolcapone 600 mg/dia e levodopa + riboavina), totalizando 298 pacientes,
avaliaram como objetivo nal o UPDRS II após 12 meses. Os grupos em
uso de tolcapone obtiveram maior redução do UPDRS II em relação ao
placebo. Diarreia foi mais frequente nos grupos estudados (tolcapone), as-
sim como discinesias. No mesmo ano foi publicado estudo semelhante por
Dupont e cols.91, que comparando também três grupos (levodopa + tolca-
pone 300 mg/dia; levodopa + tolcapone 600 mg/dia e levodopa + placebo),
totalizando 97 pacientes, tinham como objetivo primário comparar a dose
diária total e frequência de tomadas da levodopa após dois meses. O tolca-
pone propiciou redução maior da dose de levodopa (não estatisticamente
signicativa) e maior redução do UPDRS II (objetivo secundário) à custa
de maior incidência de efeitos colaterais.
Conclusões: Não evidência de que a associação de um inibidor da
COMT à levodopa na fase inicial da DP possa prevenir discinesias (um
estudo Classe II). É possível que o uso de um inibidor da COMT em fases
iniciais possibilite o uso de doses menores de levodopa e alguma melhora
funcional (atividades de vida diária), porém propicia maior incidência de
efeitos colaterais (quatro estudos Classe II).
Recomendações: Considerando as conclusões acima, não existe atual-
mente uma indicação para o uso de inibidores da COMT nas fases iniciais
da DP. O potencial benefício de melhorar aspectos de atividade de vida
diária é ofuscado pelo potencial maior de efeitos colaterais e aumento das
complicações motoras.
ESTRATÉGIAS DE TRATAMENTO NA FASE INICIAL DA DP
Quando iniciar o tratamento? O que se sugere é que o tratamento farmaco-
lógico deve ser iniciado, preferencialmente, quando do diagnóstico.
Como tratar um paciente com DP com idade inferior aos 65 anos?
Recomendações: Nos casos em que os pacientes apresentam boa qualida-
de de vida e sem impacto funcional, pode ser utilizado: anticolinérgico (ní-
vel B) especialmente quando o tremor é o sintoma principal, amantadina
(nível C), agonistas dopaminérgicos (Nível A), selegilina (nível B) ou rasa-
gilina (não existe no Brasil) como monoterapia. A associação com a levo-
dopa deve ser considerada nos casos de resultados que não atinjam a expec-
tativa do paciente. Devemos ressaltar que a levodopa deve ser utilizada nas
menores doses úteis. Quando importante impacto funcional, emocio-
nal, prossional (com risco de perda de emprego) e na qualidade de vida,
devemos iniciar o tratamento com agonista dopaminérgico ou levodopa.
Doença de Parkinson – Recomendações 11
EDITORIAL
Se é verdade que a medicina hoje é uma ciência exata baseada
em evidências, não é menos verdade que o tratamento, como é conhecido
desde tempos imemoriais, seja uma arte e é por isso que todos os dias
continuamos a falar da arte da medicina. É uma arte porque não se
pode menosprezar a experiência pessoal e mais ainda a individualização
do tratamento, segundo as características pessoais, genéticas e
socioeconômicas do paciente. Cada indivíduo expõe seu sofrimento
de modo próprio e é neste ponto que a atenção do médico deve estar
focalizada, para, apropriadamente, fazer da medicina uma arte baseada
em evidências.
É com este espírito que a ABN se preocupa em colocar esta
publicação à disposição dos neurologistas, com as mais recentes
propostas terapêuticas da doença de Parkinson. Para chegar a este
grau de excelência foram reunidos 43 especialistas de todo o Brasil, que
discutiram livremente e, sem qualquer interferência externa, propuseram
estas RECOMENDAÇÕES. Estão aqui reunidas as experiências pessoais e
os conhecimentos da literatura médica sobre todos os sintomas motores
e não-motores da DOENÇA DE PARKINSON. É uma leitura prática e de
fácil assimilação, que permitirá consultas rápidas, dirimindo dúvidas que
certamente ocorrem aos médicos durante sua vida profissional.
Ressaltamos e agradecemos a dedicação dos colegas Carlos
Roberto Rieder, Vanderci Borges e Ylmar Correa, que assumiram para
si a coordenação e execução desta publicação e permitiram que hoje
estejamos colocando à disposição de todos esta obra que certamente
valoriza a literatura médica neste campo do conhecimento.
Elza Dias-Tosta
Presidente da Academia Brasileira de Neurologia
12 Doença de Parkinson – Recomendações
Recomendações
para o tratamento da
doença de Parkinson
Carlos Roberto de Mello Rieder, Vanderci Borges,
Ylmar Corrêa Neto, Elza Dias-Tosta
Doença de Parkinson – Recomendações 15
Recomendações para o tratamento
da doença de Parkinson
Carlos Roberto de Mello Rieder
Vanderci Borges
Ylmar Corrêa Neto
Elza Dias-Tosta
INTRODUÇÃO
A doença de Parkinson, descrita por James Parkinson em 1817, é uma do-
ença neurodegenerativa caracterizada por sintomas motores (rigidez, bradi-
cinesia, tremor de repouso e instabilidade postural) e não-motores (distúr-
bios neuropsiquiátricos, do sono, autonômicos e sensitivos).
O controle dos sintomas da doença de Parkinson se faz através do tra-
tamento farmacológico, não-farmacológico e cirúrgico.
A Academia Brasileira de Neurologia identicou a necessidade de di-
fundir conhecimentos sobre o tratamento da doença de Parkinson, adap-
tando a melhor evidência nacional e internacional à realidade brasileira.
Para tanto convocou um grupo de 43 médicos especialistas do Depar-
tamento Cientíco de Transtornos do Movimento da Academia Brasileira
de Neurologia, oriundos de vários centros brasileiros, todos diretamente
envolvidos no atendimento de pacientes com doença de Parkinson.
OBJETIVO
Estabelecer recomendações, baseadas em evidências, para auxiliar nas deci-
sões sobre o tratamento da doença de Parkinson no Brasil.
METODOLO GIA
Da seleção de temas e participantes. Foi atribuição exclusiva da diretoria do
Departamento Cientíco de Transtornos do Movimento da Academia Bra-
sileira de Neurologia a identicação dos principais problemas no tratamento
da doença de Parkinson, bem como a seleção dos participantes da reunião.
Do nanciamento e da organização. Com o intuito de contribuir para o -
nanciamento da reunião de Recomendações em doença de Parkinson, a
Academia Brasileira de Neurologia entrou em contato com representantes
de indústrias farmacêuticas oferecendo oportunidade equânime de patrocí-
16 Doença de Parkinson – Recomendações
nio, ressalvando vedação contratual de interferência na seleção dos temas e
dos participantes, bem como, vedação de participação sob qualquer forma
da reunião decisória. Apenas uma indústria aceitou fornecer apoio incon-
dicional, recebendo o direito de distribuir uma versão impressa das conclu-
sões do evento.
Uma empresa independente (Omnifarma) foi contratada para organizar
a logística do evento e da publicação. Os participantes selecionados foram
divididos em 7 grupos, preparando o rascunho das Recomendações, que
foram aprovadas por votação (maioria de 75%) de todos os membros, após
discussão e eventual modicação, durante os dias 15 e 16 de maio de 2010.
Os participantes foram informados da identidade do patrocinador
após aceitarem a incumbência, não recebendo remuneração para tal, e ten-
do como obrigação a declaração de potenciais conitos de interesse.
Da seleção das evidências. Foi realizada uma revisão da literatura e as fontes
de pesquisa utilizadas foram MEDLINE e Cochrane Library nos anos de
1989 a 2009.
Os seguintes tópicos foram elaborados como pautas em relação à doen-
ça de Parkinson:
t Tratamento da fase inicial.
t Tratamento da fase avançada da doença com estratégias terapêuticas
para utuações motoras e discinesias.
t Tratamento das complicações neuropsiquiátricas (psicose, depres-
são, ansiedade, síndrome de desregulação dopaminérgica).
t Tratamento da demência.
t Tratamento dos distúrbios do sono associados.
t Tratamento das complicações disautonômicas.
t Indicações cirúrgicas.
A classicação dos estudos (quatro classes) e dos níveis de evidência
(quatro níveis) foi baseada nas recomendações da Academia Americana de
Neurologia publicadas em 2008 (Tabelas 1 e 2).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É necessário salientar que se buscou revisar o melhor da literatura atual,
identicando os estudos com os melhores níveis de evidência disponíveis
até o momento. Todavia, este documento não deve servir de diretriz rígida
de tratamento da doença de Parkinson em nosso meio, pela impossibili-
dade de comportar variações individuais biológicas, clínicas, sociocultu-
rais e econômicas que se reetem no cuidado dos pacientes. Especialmente
Doença de Parkinson – Recomendações 17
Tabela 1. Classificação dos estudos.
Classe I. Um ensaio clínico aleatório, controlado da intervenção de interesse com a ava-
liação do resultado mascarado ou objetivo, numa população representativa. Ca-
racterísticas da linha de base pertinentes são apresentadas e substancialmente
equivalentes entre os grupos de tratamento ou não há ajustamento estatístico
adequado para as diferenças.
Os seguintes requisitos também são necessários:
a. Objetivos principais claramente definidos.
b. Alocação oculta claramente definida.
c. Critérios de exclusão/inclusão claramente definidos.
d. Contabilidade adequada para retiradas (pelo menos 80% dos pacientes de-
vem concluir o estudo) e “crossovers” com números suficientemente baixos
para ter mínimo potencial de viés.
e. Para não-inferioridade ou ensaios de equivalência alegando comprovar a efi-
cácia de uma ou ambas as drogas, também são necessários os seguintes:*
1. O tratamento padrão usado no estudo é substancialmente semelhante ao
utilizado nos estudos anteriores, que estabelece a eficácia do tratamento
padrão (por exemplo, para uma droga, o modo de administração, dose e
dosagem de ajustes são semelhantes ao anteriormente indicado para ser
eficaz).
2. Os critérios de inclusão e exclusão para seleção dos pacientes e os re-
sultados dos pacientes sobre o tratamento padrão são substancialmente
equivalentes dos estudos anteriores, o que institui a eficácia do tratamen-
to padrão.
3. A interpretação dos resultados do estudo baseia-se numa análise de casos
observados.
Classe II. Um estudo clínico aleatório controlado da intervenção de interesse numa popu-
lação representativa com avaliação de resultado mascarado ou objetivo e que
perde um dos critérios a-e acima ou um estudo de coorte prospectivo, corres-
pondido com avaliação do resultado mascarado ou objetivo, numa população
representativa que atende os requisitos b–e acima. As características da linha
de base pertinentes são apresentadas e substancialmente equivalentes entre
os grupos de tratamento ou não há ajustamento estatístico adequado para as
diferenças.
Classe III. Todos os outros ensaios (incluindo bem definidas histórias naturais de controles
ou pacientes que servem como seu próprio controle) em uma população repre-
sentativa, onde o resultado é avaliado de forma independente, ou independen-
temente derivado por medição de resultados objetivos.
Classe IV. Estudos que não atendem aos critérios das Classes I, II ou III, incluindo a opi-
nião de consenso ou especialistas.
*Note que números 1 a 3 na Classe Ie são necessários para a Classe II em ensaios de equiva-
lência. Se qualquer um dos três estiver ausente, a Classe é automaticamente rebaixada para
uma Classe III.
quando se tem a tríplice combinação de manifestações pouco frequentes da
doença, presença de múltiplas comorbidades e consequente uso de diversas
medicações, bem como a existência de reações idiossincráticas às drogas, a
possibilidade de responder a uma questão clínica com evidências robustas é
18 Doença de Parkinson – Recomendações
pequena. Também diculdades no desenho ético de pesquisas em seres hu-
manos, especialmente quando necessário o uso de placebo ou a suspensão
de tratamento ecaz, mesmo que parcialmente, fazem com que algumas
questões clínicas quem sem resposta, necessitando de decisão baseada na
tradição da prática médica, mesmo que empírica. Neste sentido, a experi-
ência dos participantes no projeto foi fundamental para a elaboração de
um documento de recomendações nacionais.
O Departamento Cientíco de Transtornos do Movimento da Acade-
mia Brasileira de Neurologia agradece a todos os médicos especialistas par-
ticipantes pelo empenho e disponibilidade, e à Roche Farmacêutica pelo
apoio incondicional ao projeto de Recomendações em doença de Parkinson.
Tabela 2. Níveis de evidência.
A. Estabelecido como eficaz, ineficaz ou prejudicial (ou estabelecer como útil/preditiva ou
não útil/preditiva) para uma dada condição na população especificada. (Classificação nível
A requer pelo menos dois estudos Classes I consistentes)*.
B. Provavelmente eficaz, ineficaz, ou prejudicial (e provavelmente útil/preditiva ou não
útil/preditiva) para uma dada condição na população especificada. (Classificação de -
vel B requer pelo menos um estudo Classe I, ou dois estudos Classe II consistentes).
C. Possivelmente eficaz, ineficaz ou prejudicial (e possivelmente útil/preditiva ou não útil/
preditiva) para uma dada condição na população especificada. (Classificação de nível de
C requer pelo menos um estudo de Classe II ou dois estudos Classe III consistentes).
U. Dados insuficientes ou conflitantes; tendo em conta os conhecimentos atuais, o trata-
mento (ensaio, previsão) não é comprovado.
Em casos excepcionais um convincente estudo Classe I pode ser suficiente para a recomen-
dação A se: (1) todos os critérios são preenchidos, (2) a magnitude do efeito é grande (grau
relativo de melhor resultado >5 e o limite inferior do intervalo de confiança >2).
Recomendações para o
tratamento da fase inicial
da doença de Parkinson
COORDENAÇÃO
Vanderci Borges e Luiz Augusto Franco de Andrade
COMPOSIÇÃO
Ana Lucia Zuma de Rosso, Roberta Arb Saba Rodrigues Pinto,
Alexandre Aluizio Costa Machado,
Carlos Frederico Leite de Souza Lima
Doença de Parkinson – Recomendações 21
Recomendações para o
tratamento da fase inicial da
doença de Parkinson
COORDENAÇÃO
Vanderci Borges
Luiz Augusto Franco de Andrade
COMPOSIÇÃO
Ana Lucia Zuma de Rosso
Roberta Arb Saba Rodrigues Pinto
Alexandre Aluizio Costa Machado
Carlos Frederico Leite de Souza Lima
INTRODUÇÃO
A levodopa (L-dopa) é a terapia mais ecaz no controle dos sintomas pre-
sentes na doença de Parkinson (DP); no entanto, não é desprovida de efei-
tos adversos, tanto periféricos (náuseas, vômitos e hipotensão) como cen-
trais (psicoses e complicações motoras como as utuações e as discinesias).
São várias as drogas que são utilizadas para o tratamento na fase inicial
da DP além da levodopa, entre elas: amantadina, anticolinérgicos, inibi-
dores da MAO-B e agonistas dopaminérgicos. Neste capítulo a utilização
dos fármacos na fase inicial da DP foram revisados segundo critérios de
evidências cientícas1,2.
ANTICOLINÉRGICOS
A terapia anticolinérgica foi o primeiro tratamento amplamente utilizado
no Parkinsonismo, e por quase um século permaneceu como a única pos-
sibilidade terapêutica para esta patologia. Antigamente, aceitava-se que o
efeito dos anticolinérgicos se dava pela sua ação muscarínica periférica, e
apenas a partir de 1945 é que foi denida a acetilcolina como sendo um
neurotransmissor cerebral3.
Os primeiros ensaios clínicos com a terapia anticolinérgica para a DP
foram datados dos anos 40 e tiveram seu auge nos anos 50. Apesar de não
se enquadrarem em ensaios de boa qualidade, eles ainda constituem a fonte
principal dos dados utilizados nas pesquisas com este tipo de terapia4. Com
22 Doença de Parkinson – Recomendações
a introdução da levodopa e a descoberta de efeitos cognitivos indesejados
frequentes pelo uso dos anticolinérgicos, o interesse pelo seu uso desde en-
tão apresentou um declínio5.
O exato mecanismo de ação dos anticolinérgicos ainda é desconhecido,
embora se acredite que eles atuem no desequilíbrio entre a dopamina es-
triatal e a atividade colinérgica. Existem dois tipos de receptores colinérgi-
cos, os muscarínicos e os nicotínicos6. Os anticolinérgicos utilizados na DP
são especícos para os receptores muscarínicos7.
Atualmente, acredita-se que os anticolinérgicos tenham mais efeitos co-
laterais do que outras drogas antiparkinsonianas, principalmente com res-
peito a sintomas cognitivos e neuropsiquiátricos. Também é relatado um
melhor efeito terapêutico deste tipo de medicação, predominantemente,
nas formas clínicas de tremor. Como consequência do seu efeito antimus-
carínico periférico, a terapia anticolinérgica é contraindicada em pacien-
tes com glaucoma de ângulo fechado, taquicardia, hipertroa prostática,
obstrução gastrointestinal e megacólon5. Eles também podem causar bor-
ramento visual com diculdade de acomodação, retenção urinária, náusea,
etc. Todos estes efeitos são mais frequentes no idoso ou em pacientes com
distúrbios cognitivos associados. Portanto, o uso de anticolinérgicos está
contraindicado em pacientes com demência associada.
Outro dado recente sobre o uso de anticolirgico na DP é retirado de
um trabalho de 2003 de Perry et al., que ao examinarem 120 casos de DP
e quanticar marcadores histológicos para a doença de Alzheimer, de acor-
do com o tipo e a exposição a anticolinérgicos, concluíram que havia uma
relação direta entre maior densidade de placas amiloides nos casos tratados
com anticolinérgicos comparados com os não tratados e com os que tive-
ram uso por curto período8.
Os anticolinérgicos são ecazes no tratamento na fase inicial da DP? Apenas 9
ensaios clínicos utilizaram um desenho duplo-cego e randomizado e inclu-
íam 221 pacientes (Classe II)9-17. Porém, a heterogeneidade dos dados des-
tes estudos torna impossível a aplicação de métodos estatísticos para se fa-
zer uma análise combinada. Também tinham uma amostra pequena. Mas,
apesar destes aspectos, a análise destes dados é suciente para provar que
o efeito antiparkinsoniano dos agentes anticolinérgicos é melhor do que o
efeito placebo; porém, esses dados são relacionados ao uso por curta dura-
ção. Todos os 9 estudos, exceto um, evidenciaram uma melhora signica-
tiva em comparação ao grupo placebo. A ocorrência de sintomas adversos
neuropsiquiátricos e cognitivos foi relatada em seis estudos (35 pacientes).
Doença de Parkinson – Recomendações 23
O motivo mais frequente para a retirada da medicação durante os estudos
foi a intolerância aos anticolinérgicos.
Conclusões: Tanto em monoterapia quanto associado a outros antipar-
kinsonianos, os anticolinérgicos foram mais ecazes que o placebo na me-
lhora da função motora. Porém, o uso clínico destas medicações pode ser
limitado pelos efeitos adversos (Nível B).
Recomendações: Medicações anticolinérgicas podem ser utilizadas no
tratamento sintomático da DP, tanto em monoterapia quanto seu uso de
forma combinada, mas não devem ser a droga de primeira escolha, pelo
seu alto índice de efeitos colaterais indesejados e pela sua ação mais limita-
da ao tremor (Nível B).
AMANTADINA
Inicialmente usada como medicação antiviral para tratamento de inuen-
za, a amantadina melhorava os sintomas parkinsonianos dos pacientes
que eram submetidos a este tratamento. Portanto, ela tem sido usada para
tratamento dos sintomas parkinsonianos desde sua descrição inicial em
1969 por Schwab et al.18. Com o passar dos anos, e a descoberta de novos
tratamentos, incluindo os agonistas dopaminérgicos, o seu uso terapêuti-
co na DP foi cando mais limitado, devido ao seu modesto efeito e curta
duração19.
É aceito que a amantadina tem um benefício transitório quando utili-
zada na DP. Por denição, esse “benefício transitório” teria uma duração de
6 a 12 meses. Este fenômeno está relacionado à taquilaxia, que seria um
rápido aparecimento de perda de resposta de um medicamento após ad-
ministração repetitiva. Numa revisão sistemática realizada sobre este tema
em 1999, num total de 1.093 pacientes tratados, cou concluído que não
há dados consistentes de que realmente exista este benefício transitório em
pacientes tratados com a amantadina20.
Embora o seu mecanismo preciso de ação seja incerto, este medica-
mento apresenta uma função de antagonista não competitivo do receptor
NMDA21 e também aumenta a liberação de dopamina e retarda sua recap-
tação na fenda sináptica22,23.
A amantadina é ecaz no tratamento da fase inicial da DP? Seis trabalhos
compararam amantadina, tanto como monoterapia ou como terapia adju-
vante, com placebo, num total de 215 pacientes. Os seis trabalhos eram
duplos-cegos, randomizados, porém com limitado número de pacientes
(estudo Classe III). Um total de 215 pacientes recebeu amantadina ou
24 Doença de Parkinson – Recomendações
placebo num período de 6 a 64 semanas. Todos os trabalhos armam um
possível efeito da amantadina na DP. Porém, algumas ressalvas são impos-
tas. O número insuciente de pacientes limita a signicância estatística dos
resultados; nenhum dos trabalhos fornece detalhes do método de rando-
mização e, por último, não houve critérios para diferenciar DP de outras
síndromes parkinsonianas24-29.
Conclusão: Existem poucos estudos que comprovam a ecácia e segu-
rança do uso da amantadina na fase inicial da DP. Isto pode ser explicado,
pois a maioria dos estudos foi realizada na década de 70, quando a pesqui-
sa clínica não exigia critérios mais rigorosos como os que são feitos atual-
mente. Existe evidência Nível C de ecácia do uso da amantadina na fase
inicial da DP.
Recomendação: A amantadina pode ser usada como monoterapia para
tratamento da fase inicial da DP, porém não é a droga de primeira escolha,
pelo seu efeito limitado e de curta duração.
INIBIDORES DA MONOAMINA-OXIDASE B (MAO-B)
Selegilina. A selegilina, também conhecida como L-Deprenil, causa inibi-
ção irreversível da enzima MAO-B, enzima responsável pelo metabolismo
da dopamina, aumentando, portanto, a neurotransmiso dopaminérgica.
A dopamina cerebral depois de liberada na sinapse é recaptada pelo neu-
rônio pré-sináptico. Dentro do neurônio e das células da glia a MAO-B
degrada a dopamina. Embora a MAO-B pareça atuar especicamente so-
bre a dopamina, em doses altas pode induzir a inibição da MAO-A. Esta
especicidade da MAO-B permite que a utilização da selegilina não esteja
associada ao efeito hipertensivo e taquicárdico (“cheese eect”) que costuma
ser observado com a utilização dos inibidores não seletivos da MAO. Este
aumento da disponibilidade da dopamina dentro das células seria um dos
possíveis mecanismos de ação da droga30. Outro mecanismo plausível para
a ação da selegilina seria a sua metabolização em derivados anfetamínicos
que podem ter alguma atividade antiparkinsoniana decorrente do efeito es-
timulante sobre o SNC.
Os efeitos adversos (>1%) incluem fraqueza, náuseas, dor abdominal,
boca seca, hipotensão ortostática e insônia. Menos comumente (<1%)
pode ocorrer hipertensão, arritmias, angina, edema periférico, síncope,
alucinações, tontura, confusão, cefaleia, ansiedade, depressão, rash, fotos-
sensibilidade, constipação, perda de peso, anorexia, diarreia, nictúria, hi-
perplasia prostática, retenção urinária, disfunção sexual, tremor, coreia,
discinesias, borramento da visão31.
Doença de Parkinson – Recomendações 25
Rasagilina. O mesilato de rasagilina é um inibidor seletivo e irreversível da
enzima MAO-B e sua ação se faz por um aumento dos níveis de dopamina
extracelular no estriado, uma vez que a MAO-B é uma das enzimas que
degradam a dopamina32. A sua ação também se faz por um dos metabóli-
tos, que é o 1- aminoindano, mas que não é inibidor da MAO-B. Tem sido
proposta uma ação neuroprotetora33 cujo mecanismo seria independente
da inibição da MAO-B. A rasagilina é absorvida rapidamente pelo trato
gastrointestinal e metabolizada pelo fígado. Seu metabólito principal é o
aminoindano, que apresenta potencial antiparkinsoniano34. Não é metabo-
lizada em anfetamina. A rasagilina não sofre alteração com a ingestão con-
junta de alimento, portanto pode ser administrada junto ou não à refeição.
Cerca de 60% é eliminada pela urina e 21% pelas fezes.
Os efeitos colaterais mais comuns são: ansiedade, insônia, hipotensão
postural, tontura, dor abdominal, cefaleia, náuseas.
Não deve ser utilizada em menores de 18 anos, e não existem estudos
clínicos em gestantes. No puerpério pode inibir a lactação. Pode ser utili-
zada em pacientes idosos sem ajuste da dose. Não existe restrição ao uso da
tiramina. Deve ser administrada com cuidado em pacientes que apresen-
tam insuciência hepática leve e não deve ser utilizada em pacientes com
insuciência grave, sendo necessária a monitorização das enzimas hepáticas.
Não deve ser associada com outros inibidores da MAO, uoxetina e
uvoxamina. O uso concomitante com drogas simpatomiméticas pode
causar efeitos colaterais mais sérios.
A rasagilina não se encontra disponível no Brasil.
Os inibidores da MAO-B são ecazes no tratamento da fase inicial da DP? No
estudo DATATOP35 foram incluídos 800 pacientes na fase inicial da DP.
O objetivo principal foi estudar a ação do tocoferol e da selegilina em re-
tardar o início da deterioração motora e a necessidade do uso da levodopa
em pacientes não tratados em estágio I ou II de HY. Foi demonstrado atra-
vés de uma análise interina que a utilização da selegilina reduzia o risco do
uso da levodopa em cerca de 50%, o que poderia signicar uma redução
do ritmo de progressão da doença. O mesmo não foi observado com o to-
coferol (Classe I). Uma extensão deste estudo por 14±6 meses teve início
(Classe II). Nos pacientes que não tinham atingido o objetivo principal, a
droga experimental foi retirada e a selegilina 10 mg poderia ser iniciada se
o paciente apresentasse deterioração motora. Os resultados mostraram que
o benefício de se retardar o início da levodopa se mantinha por nove meses
no grupo selegilina e uma melhora nos escores da UPDRS também foi ob-
26 Doença de Parkinson – Recomendações
servada nestes pacientes comparados ao placebo, embora sem signicância.
A retirada da selegilina por dois meses piorou os escores motores, o que
aponta para um efeito sintomático36.
O aspecto de segurança foi analisado e a conclusão foi de que não havia
evidência do aumento da mortalidade em pacientes que utilizavam selegili-
na como monoterapia ou em combinação com levodopa37 (Classe II).
Um trabalho semelhante ao DATATOP38, em que foi comparada a se-
legilina ao placebo, 157 pacientes foram incluídos. A duração foi de 12
meses com a retirada das drogas experimentais por dois meses antes do iní-
cio da levodopa (Classe II). Houve um retardo de quatro meses do início
da levodopa nos pacientes com selegilina. Um efeito sintomático foi obser-
vado em três semanas e três meses. Com a retirada das drogas houve uma
piora clínica em ambos os grupos, embora sem diferença estatística signi-
cativa. Houve um declínio motor mais lento medido através da UPDRS
nos pacientes que utilizaram selegilina comparados ao placebo (p<0,01).
Uma metanálise utilizando 17 artigos randomizados39 concluiu que a
selegilina usada precocemente retarda a necessidade de levodopa e quan-
do usada concomitantemente são necessárias doses mais baixas. Isto ocorre
provavelmente devido ao efeito sintomático. Com relação à mortalidade
não foi observado aumento. Outros dois estudos (Classe I) mostraram que
a selegilina associada à levodopa não demonstrou benefício consistente nos
sintomas da DP40,41. Uma revisão sistemática da Cochrane Database42 teve
como objetivo analisar a evidência de estudos clínicos randomizados e con-
trolados para a ecácia e segurança do uso por longo prazo dos inibidores
da MAO-B no início da DP. Foram incluídos dez estudos de 1989 a 2003,
sendo nove com selegilina e um com lazabemida. O seguimento médio foi
de 5,8 anos. Foi concluído que a selegilina apresenta pequeno efeito sinto-
mático sobre o controle motor medido pela UPDRS. Existe boa evidência
de que a selegilina poupa doses de levodopa. Entretanto, alguns estudos
mostram que ao nal de três anos todos os pacientes estarão recebendo le-
vodopa. O tempo médio de retardo da introdução da levodopa quando se
utilizam os inibidores da MAO varia de 4,1 a 8,7 meses.
Revisões realizadas pela MDS43 e pela AAN44 sugerem que a selegilina
apresenta um efeito modesto no controle sintomático da DP na fase inicial.
Com relação à rasagilina, o estudo TEMPO45 avaliou a ecácia da rasagi-
lina em monoterapia (Classe I) em duas doses de 1 mg e 2 mg comparan-
do com placebo. Houve melhora do UPDRS em comparação ao placebo
e melhora na escala de qualidade de vida, mostrando um efeito nos sinto-
mas da DP como monoterapia. Mais recentemente, no estudo ADAGIO
Doença de Parkinson – Recomendações 27
(Classe I)33, que incluiu 1.176 pacientes com extensão de 72 semanas, os
resultados mostraram que no tratamento precoce com 1 mg de rasagilina a
piora clínica foi menor do que no grupo de tratamento tardio.
Conclusões: Existem evidências Nível B de que a selegilina apresenta
um efeito sintomático discreto no tratamento da fase inicial da DP como
monoterapia. Não existem evidências sucientes (Nível U) da melhora dos
sintomas quando associada à levodopa. Com relação à mortalidade não
existem evidências de que o uso da selegilina esteja relacionado com maior
aumento de mortalidade (Nível U). Existem evidências de que a rasagilina
1 mg apresenta um efeito sintomático como monoterapia (Nível A).
Recomendações: A selegilina pode ser utilizada no tratamento inicial da
DP em casos com sintomas leves por apresentar um efeito sintomático leve
(Nível B), podendo assim postergar o início da necessidade da levodopa.
A G ONISTAS DOPAMINÉRGICOS
Os agonistas dopaminérgicos (AD) são uma boa alternativa para o trata-
mento da DP. Podem ser classicados em ergolínicos (derivados do ergot)
e não-ergolínicos; em nosso meio os mais utilizados são: a bromocriptina
(derivada do ergot) e o pramipexol.
Vários estudos foram feitos quanto à indicação e período de introdução
dos agonistas dopaminérgicos, se na fase inicial da doença como monote-
rapia ou em associação com a levodopa e na fase avançada para auxiliar no
controle das complicações motoras.
Diferentemente da levodopa, os AD agem diretamente sobre os re-
ceptores dopaminérgicos D2 like (estimulando receptores pós-sinápticos),
além disso, não dependem das enzimas conversoras de dopamina (dopa-
descarboxilase).
Dentre os AD que dispomos no Brasil encontram-se a bromocriptina
(derivada do ergot), piribedil e o pramipexol (não-ergolínico).
AD não-ergolínicos. Pramipexol. O pramipexol é um agonista dopaminér-
gico não derivado do ergot, cuja administração é oral46. Estudos mostram
que in vivo e in vitro o pramipexol age nos receptores da subfamília D2,
com maior anidade com o subtipo D347. A anidade pelos receptores
não-dopaminérgicos é baixa, porém o mesmo tem algum efeito sobre os
receptores alfa-2.
Quanto à farmacocinética, o pramipexol é absorvido rápida e comple-
tamente após sua administração oral, com biodisponibilidade maior que
90%. A concentração plasmática máxima ocorre dentro de 1 a 3 h, e sua
28 Doença de Parkinson – Recomendações
meia-vida é de 10 h. Apenas 10% da droga é metabolizada, sendo elimi-
nada por via renal. Um aspecto interessante é que o pramipexol não se liga
signicativamente às proteínas plasmáticas, portanto não interferência
da dieta quando da sua administração. Os efeitos colaterais mais comuns
são: sonolência excessiva diurna, hipotensão ortostática, vertigem, insônia e
alucinações.
Ropinirol. Assim como o pramipexol, o ropinirol é um agonista dopa-
minérgico não-ergolínico, com alta anidade pela subfamília D2 de recep-
tores dopaminérgicos (D2, D3 e D4). Os efeitos colaterais são semelhantes
aos do pramipexol.
Piribedil. É um agonista dopaminérgico com anidade para os recepto-
res D2 e D3 e tem ação antagonista alfa-2 adrenérgica48. Tem como efeitos
colaterais: hipotensão postural, sonolência e distúrbios gastrointestinais.
AD derivados do ergot. Bromocriptina foi o primeiro agonista dopaminér-
gico usado no tratamento da DP. É um agonista do receptor D2-like e um
agonista parcial de D1-like. Assim como os derivados do ergot, a bromo-
criptina tem efeito antagonista 5-HT2 e pouco efeito adrenérgico. Este
agonista diminui a prolactina plasmática e pode induzir náuseas49.
A administração é oral, mas não há absorção completa da droga, e atin-
ge pico plasmático em 70 a 100 minutos50,51. Tem metabolização hepática
e meia-vida de 6 a 8 horas. Noventa por cento se liga a proteínas plasmáti-
cas. Sua eliminação é renal e 5% são eliminados na sua forma in natura.
Os efeitos adversos mais comuns incluem os gastrointestinais (náuseas
e vômitos), cardiovasculares (hipotensão ortostática) e neuropsiqutricos
(psicose, confusão e alucinações). Fibrose pleuropulmonar e/ou peritoneal
e edema dos MMII também podem ocorrer com o uso da bromocriptina.
Os efeitos gastrointestinais e cardiovasculares podem melhorar com a ad-
ministração da domperidona52,53. Altas doses e titulação rápida estão asso-
ciadas a mais eventos adversos54.
Os AD não-ergolínicos são ecazes no tratamento da fase inicial da DP? Eles
são ecazes como monoterapia? Estudos com pramipexol. Um estudo reali-
zado em 2000 pelo Parkinsons Disease Study Group comparou o uso da
levodopa vs. pramipexol na fase inicial da DP. Tal estudo era randomizado,
controlado com levodopa, com duração de dois anos, prospectivo, e utili-
zou pramipexol como monoterapia. Cento e cinquenta pacientes recebe-
ram levodopa e 150 receberam pramipexol como monoterapia. Foram dez
semanas para escalonamento da dose e 21 meses de seguimento. De acordo
Doença de Parkinson – Recomendações 29
com a necessidade clínica dos pacientes, poderia ser administrada levodopa
a partir da 11ª semana. Os resultados mostraram que 53% dos pacientes
que faziam parte do grupo que usava pramipexol necessitaram de suple-
mentação de levodopa, contra 39% dos pacientes que usavam levodopa. A
dose suplementar foi semelhante nos dois grupos (Classe I)55.
Na fase inicial da DP o pramipexol pode ser utilizado, como monote-
rapia, com bons resultados, como mostram dois56-57 estudos realizados na
década de 90. Tais estudos são randomizados, pramipexol × placebo, sendo
escalonada a dose do agonista. Como resultados, houve melhora da respos-
ta motora e das atividades da vida diária quando pacientes foram submeti-
dos ao UPDRS (Classe I).
Estudos com ropinirol. Existem diversos estudos demonstrando a ecácia do
uso do ropinirol em monoterapia na fase inicial da DP. Adler e cols.58 estu-
daram o ropinirol em monoterapia comparado com o placebo (Classe I),
em 241 pacientes com DP em fase inicial. Após seis meses, o grupo do ro-
pinirol mostrou melhora no UPDRS III de 24% contra 3% do grupo pla-
cebo. O ropinirol foi bem tolerado apesar de maior incidência de náuseas
e tontura. Como extensão deste estudo, por mais seis meses Sethi e cols.59
avaliaram a porcentagem de pacientes que permaneceram em monoterapia
como objetivo primário e a porcentagem de pacientes com resposta insu-
ciente como objetivo secundário. No grupo de ropinirol, maior número de
pacientes não necessitou de levodopa (44% × 22%), menor número apre-
sentou resposta insuciente (12% × 30%) e a melhora no UPDRS III (mo-
tor) foi sustentada. Em revisão recente, Kulisevsky e cols.60 incluíram 40 es-
tudos randomizados para avaliar a tolerabilidade e a segurança do ropinirol.
As conclusões foram de um perl de segurança favorável e efeitos adversos
mais frequentes que o placebo e semelhantes aos outros agonistas (pramipe-
xol). Nas recomendações da Academia Americana de Neurologia de 200261
o ropinirol, assim como o pramipexol, é uma opção quando o paciente ne-
cessita de terapia dopaminérgica, mostrando menor incidência de complica-
ções motoras, porém mais efeitos colaterais que a levodopa. Na revisão pu-
blicada pela Movement Disorders em 200262, o ropinirol mostrou ecácia
como monoterapia sintomática e na redução da incidência de discinesias.
Estudos com piribedil. Um estudo63 randomizado placebo controlado (Clas-
se I) comparou o piribedil ao placebo em doses de 150 a 300 mg/dia e
o objetivo principal foi avaliar a alteração da escala UPDRS parte III. O
objetivo secundário foi avaliar a porcentagem de pacientes que responde-
30 Doença de Parkinson – Recomendações
ram ao tratamento (melhora de 30% na UPDRS). Levodopa poderia ser
associada após a titulação e adaptação se houvesse necessidade. Após sete
meses houve melhora signicativa no grupo que usou piribedil em relação
ao placebo, assim como a proporção de pacientes que se mantinham em
monoterapia era maior no grupo piribedil (p<0,001).
Conclusões: Há evidências da eficácia do pramipexol e do ropinirol
quanto à melhora dos sintomas motores da DP como monoterapia na fase
inicial da doença (Nível A). Há evidências Nível B de que o piribedil é e-
caz em monoterapia sintomática inicial na DP.
Recomendações: Tanto o pramipexol como o ropinirol podem ser usa-
dos como terapia inicial na DP com o intuito de atenuar o parkinsonismo.
Não existem diferenças signicativas quanto ao efeito sintomático e tolera-
bilidade entre o ropinirol e o pramipexol. Até o momento o ropinirol não
está disponível no mercado brasileiro.
Existem evidências de que os AD não-ergolínicos retardam o aparecimento de
complicações motoras? Estudo recente do Parkinson Study Group CALM-
PD, publicado em 200964, avalia o ecácia e complicações motoras após
seis anos da administração de pramipexol × levodopa nos pacientes na fase
inicial da DP. Esta análise foi feita inicialmente com 301 indivíduos, sendo
que 151 utilizaram o pramipexol e 150 a levodopa (a introdução de le-
vodopa ou qualquer outro antiparkinsoniano era permitida caso houvesse
necessidade). Os pacientes foram avaliados entre outubro de 1996 a agosto
de 1997 e um subgrupo até agosto de 2003 (n=222). Após seis anos obser-
vou-se que os escores da Schwab and England eram similares nos dois gru-
pos. Quanto às complicações motoras (wearing o, on-o, discinesias), estas
eram mais comuns no grupo que utilizou a levodopa inicialmente (68,4%
× 50%). Houve maior sonolência no grupo do pramipexol, mas não houve
diferença estatisticamente signicante nos escores da UPDRS (Classe III).
Desta forma, a utilização do pramipexol na fase inicial da DP permite
o aparecimento de menor taxa de complicações motoras (Nível A). O mes-
mo já havia sido observado no estudo publicado em 200055 (Classe I).
A melhora na qualidade de vida ocorre tanto no grupo do pramipexol,
por menor incidência de complicações motoras, quanto da levodopa pela
melhor resposta motora65.
Os quadros de ataques de sono associados ao uso do pramipexol po-
dem ocorrer, portanto este efeito sempre deve ser informado ao paciente,
orientando-o quanto a possibilidade disto acontecer quando o mesmo está
dirigindo66,67.
Doença de Parkinson – Recomendações 31
Em estudo bem desenhado (Classe I), Rascol e cols.68 compararam a in-
cidência de discinesias após cinco anos de uso de levodopa ou ropinirol. O
grupo do ropinirol apresentou menos discinesias (20% × 45%; P<0,001)
porém o grupo da levodopa apresentou UPDRS motor melhor (diferença
de 4,7 pontos de queda). Em estudo exploratório (Classe III), Hauser e
cols.69 estenderam o estudo anterior por mais cinco anos no grupo que per-
maneceu somente com ropinirol (28 pacientes completaram); a incidência
de discinesias permaneceu menor (52% × 77%), porém com a introdução
da levodopa este benefício se perdeu.
Conclusões: Existe um menor risco de desenvolver complicações moto-
ras com o uso do pramipexol. (Nível B). O ropinirol reduz o aparecimento
de discinesias por pelo menos cinco anos (Nível B). Pode ser considerada
uma droga segura em longo prazo, sem necessidade de monitorização es-
pecíca (Nível A). Tanto com o ropinirol como com o pramipexol, deve-se
ter atenção quanto a eventual efeito de hipersonolência e “crises” de sono.
Recomendação: O pramipexol e o ropinirol podem ser utilizados na fase
inicial da DP e reduzem o aparecimento de discinesias, postergando a in-
trodução da levodopa ou permitindo usá-la em doses menores.
Existem indicações para o uso dos AD ergolínicos na fase inicial da DP? Quan-
to ao controle dos sintomas da DP, sobre a bromocriptina quando usada
como monoterapia não há evidências que mostrem maior benefício em re-
lação à levodopa (Classe I)70.
Existe estudo comparando a bromocriptina com outro agonista dopa-
minérgico, porém não mostra evidência de maior ecácia (Classe I)71.
Uma revisão sistemática da Cochrane que analisou a ecácia e seguran-
ça da combinação precoce da bromocriptina com a levodopa em retardar o
início das complicações motoras mostrou não haver evidências para o uso
desta associação como uma estratégia para prevenir ou retardar o início das
complicações motoras na DP (Classe I)72.
Outra revisão sistemática da Cochrane avaliou os estudos randomiza-
dos, controlados, comparando a monoterapia com bromocriptina × levo-
dopa na fase inicial da doença para prevenir complicações motoras (Classe
I)73. Apesar de estes estudos serem muito heterogêneos, a bromocriptina foi
considerada possivelmente ecaz em retardar as complicações motoras.
Conclusões: Quanto ao controle dos sintomas da DP, sobre a bromo-
criptina, quando usada como monoterapia, parece não haver evidências
que mostrem maior benefício em relação à levodopa ou outro agonista
(Nível C). Quanto à precoce combinação da levodopa com bromocriptina
32 Doença de Parkinson – Recomendações
para melhora dos sintomas não evidências sucientes para armar sua
ecácia (Nível A). Quanto à combinação precoce da bromocriptina com a
levodopa, na fase inicial da doença para prevenir complicações motoras, há
evidências para armar sua ecácia (Nível A).
Recomendação: A bromocriptina pode ser utilizada na fase inicial da DP
como monoterapia e para prevenir complicações motoras.
LEVODOPA
A levodopa é absorvida no duodeno e jejuno proximal e tem uma meia-
vida plasmática variando de 50 a 120 minutos. Perifericamente sofre a ação
das enzimas dopa-descarboxilase e da catecol-O-metiltransferase (COMT),
sendo convertida em dopamina e 3-O-metildopa, respectivamente. Atra-
vessa a barreira hematoencefálica por meio dos sistemas de transporte ativo
utilizados por outros aminoácidos de cadeia leve74.
O provável mecanismo de ação central baseia-se na noção de que os
terminais sinápticos nigroestriatais sobreviventes dos parkinsonianos cap-
tam a levodopa e a cascata enzimática do neurônio encarrega-se de conver-
tê-la em dopamina, estocá-la em vesículas e liberá-la para a fenda sinápti-
ca. Existem hipóteses alternativas, como a de que a dopamina convertida a
partir da levodopa exógena não ca estocada em vesículas, mas livre no ci-
toplasma neuronal. Outras evidências apontam para o fato de que a maior
parte da levodopa administrada oralmente é convertida em dopamina em
outros neurônios não-dopaminérgicos do cérebro ou que esta conversão
ocorra nas células da glia adjacentes aos receptores DA estriatais75.
Os efeitos colaterais mais comuns em curto prazo são: distúrbios gas-
trointestinais (náuseas e vômitos), sonolência e hipotensão ortostática. O
uso prolongado da levodopa induz o aparecimento das utuações motoras
e das discinesias e também dos fenômenos não-motores.
Quais as evidências do benefício da utilização da levodopa na fase inicial da DP?
Encontramos quatro publicações na literatura com recomendações para o uso
da levodopa na fase inicial da DP. A primeira data de 199376, realizada pela
AAN, e conclui que a levodopa é a droga mais ecaz para o tratamento dos
sintomas motores, principalmente para a bradicinesia e a rigidez (Classe I).
Um estudo Classe I ELLDOPA77 mostrou que a utilização de levodopa
com três doses diferentes em pacientes com DP na fase inicial compara-
dos com placebo mostrou uma melhora signicativa do UPDRS após 40
semanas. Quando a medicação foi retirada por duas semanas, o UPDRS
mantinha-se melhor nos pacientes medicados com levodopa. Os pacientes
Doença de Parkinson – Recomendações 33
que utilizaram doses de 600 mg apresentaram discinesias. A dose da levo-
dopa está relacionada ao aparecimento de discinesias.
Um estudo Classe I78 e dois Classe II79,80 compararam a levodopa com
AD na fase inicial da DP. A conclusão desses estudos sugere que a levodo-
pa, a cabergolina, o ropinirol e o pramipexol são ecazes para o tratamento
dos sintomas motores, assim como melhoram os pontos na escala de ativi-
dades de vida diária, porém a levodopa é mais ecaz nesses aspectos que os
agonistas dopaminérgicos. Estes, por sua vez, propiciam menos complica-
ções motoras que a levodopa, porém produzem mais efeitos adversos como
alucinações, sonolência e edema.
A recomendação nal desse estudo é a de que em pacientes que necessi-
tam de tratamento com agentes dopaminérgicos, tanto a levodopa quanto
um agonista dopaminérgico podem ser usados (evidência Nível A, Classe I
e Classe II).
Em relação à levodopa de liberação controlada, quando comparada à
de liberação rápida, somente um estudo publicado81 e a recomendação
é a de que, ao se considerar o tratamento inicial com levodopa, ambas as
formulações podem ser utilizadas, sendo que a frequência de complicações
motoras é semelhante nos dois tipos (Nível C, Classe II).
Também em 2002 a MDS publica revisão baseada em evidência sobre a
ecácia e a segurança da levodopa82. Em 2005, foi realizada uma revisão do
artigo anterior83, porém não foram encontradas evidências diferentes das
apresentadas em 2002.
Conclusões: Existem evidências de que a levodopa é ecaz e benéca na
fase inicial da DP (Nível A). A levodopa como monoterapia é mais ecaz
que o pramipexol e o ropinirol em monoterapia, quanto à melhora dos
sintomas motores (Nível A). Não existem evidências de que levodopa de
liberação lenta previna o aparecimento de complicações motoras (Nível B).
Existem evidências de que quanto maior a dose total diária de levodopa,
maior o risco de aparecimento de complicações motoras (Nível A).
Recomendações: A levodopa pode ser utilizada na fase inicial da DP tan-
to em monoterapia ou associada a outros antiparkinsonianos nos pacientes
que necessitam de um melhor controle motor. Recomenda-se iniciar com
as menores doses.
INIBIDORES DA CATECOL-ORTO-METILT RANSFERASE
O uso de inibidores da catecol-orto-metiltransferase (COMT) é efetivo no tra-
tamento da fase inicial da DP? O uso de inibidores da COMT na fase inicial
da DP vem sendo pesquisado com o objetivo principal de determinar se
34 Doença de Parkinson – Recomendações
eles podem prevenir ou postergar o aparecimento das complicações moto-
ras. A droga mais extensamente estudada é a entacapona. No estudo Classe
II de Brooks e cols.84, o objetivo primário, nos pacientes não utuadores,
foi comparar, após seis meses, a variação no UPDRS II (média do esta-
do on e o) entre o grupo em uso de levodopa/carbidopa e o grupo em
uso de levodopa/carbidopa/entacapona, mostrando discreta superioridade
neste último grupo (queda de 0,6 pontos × 0,1 pontos). Em 2004 Smith
e cols.85, em modelo experimental de saguis tratados com MPTP (Classe
IV), compararam o uso de entacapona associado à levodopa vs. o grupo
somente em uso de levodopa (doses similares de levodopa) e, após 16 dias,
obtiveram menor pico de discinesias no primeiro grupo. Esta conclusão
sugeriu a possibilidade de reprodução dos mesmos resultados em huma-
nos. Neste mesmo ano, Olanow e cols.86 publicaram estudo avaliando 750
pacientes durante 26 semanas, em uso de levodopa e sem utuações, as-
sociando entacapona ou placebo (Classe II), porém no objetivo primário
de avaliar a variação no UPDRS III (motor) não houve diferença estatísti-
ca. O grupo em uso de entacapona obteve alguma superioridade na escala
de qualidade de vida (PDQ-39) à custa de maior incidência de náuseas.
Mais recentemente, Fung e cols.87 avaliaram como objetivo principal a me-
lhora na escala de qualidade de vida PDQ-8 comparando entacapona ou
placebo associados a levodopa (pacientes com utuações mínimas ou sem
utuações). O grupo recebendo entacapona obteve 1,4 pontos a mais nes-
ta escala (P=0,021) após 12 semanas, principalmente devido à melhora de
sintomas não-motores (Classe II). Hauser e cols.88 compararam o uso da
entacapona e placebo associados a levodopa, em pacientes com DP de iní-
cio recente (Hoehn & Yahr 1-2,5 e < 5 anos de sintomas) e como objetivo
primário a variação nas escalas de UPDRS II e III em 39 semanas. O gru-
po da entacapona apresentou pequena diferença a seu favor (2,3 pontos) e
sem diferença com relação à incidência de utuações motoras (Classe II).
A presença de efeitos colaterais dopaminérgicos foi maior no grupo da en-
tacapona. Finalmente, em estudo realizado entre 2004 e 2008 e não publi-
cado (STRIDE-PD Study)89, comparando o tempo para aparecimento de
discinesias, o grupo em uso da entacapona mostrou maior incidência destas
complicações em relação ao grupo placebo, após período variável de 134 a
208 semanas (Classe II). O uso da mesma dose de levodopa em ambos os
grupos (placebo × entacapona) certamente contribuiu para este resultado
desfavorável. Em relação ao tolcapone, existem somente dois estudos Clas-
se II que avaliam seu uso em fases iniciais da DP. Waters e cols.90 em estu-
do comparando três grupos (levodopa + tolcapone 300 mg/dia; levodopa +
Doença de Parkinson – Recomendações 35
tolcapone 600 mg/dia e levodopa + riboavina), totalizando 298 pacientes,
avaliaram como objetivo nal o UPDRS II após 12 meses. Os grupos em
uso de tolcapone obtiveram maior redução do UPDRS II em relação ao
placebo. Diarreia foi mais frequente nos grupos estudados (tolcapone), as-
sim como discinesias. No mesmo ano foi publicado estudo semelhante por
Dupont e cols.91, que comparando também três grupos (levodopa + tolca-
pone 300 mg/dia; levodopa + tolcapone 600 mg/dia e levodopa + placebo),
totalizando 97 pacientes, tinham como objetivo primário comparar a dose
diária total e frequência de tomadas da levodopa após dois meses. O tolca-
pone propiciou redução maior da dose de levodopa (não estatisticamente
signicativa) e maior redução do UPDRS II (objetivo secundário) à custa
de maior incidência de efeitos colaterais.
Conclusões: Não evidência de que a associação de um inibidor da
COMT à levodopa na fase inicial da DP possa prevenir discinesias (um
estudo Classe II). É possível que o uso de um inibidor da COMT em fases
iniciais possibilite o uso de doses menores de levodopa e alguma melhora
funcional (atividades de vida diária), porém propicia maior incidência de
efeitos colaterais (quatro estudos Classe II).
Recomendações: Considerando as conclusões acima, não existe atual-
mente uma indicação para o uso de inibidores da COMT nas fases iniciais
da DP. O potencial benefício de melhorar aspectos de atividade de vida
diária é ofuscado pelo potencial maior de efeitos colaterais e aumento das
complicações motoras.
ESTRATÉGIAS DE T RATAMENTO NA FASE INICIAL DA DP
Quando iniciar o tratamento? O que se sugere é que o tratamento farmaco-
lógico deve ser iniciado, preferencialmente, quando do diagnóstico.
Como tratar um paciente com DP com idade inferior aos 65 anos?
Recomendações: Nos casos em que os pacientes apresentam boa qualida-
de de vida e sem impacto funcional, pode ser utilizado: anticolinérgico (ní-
vel B) especialmente quando o tremor é o sintoma principal, amantadina
(nível C), agonistas dopaminérgicos (Nível A), selegilina (nível B) ou rasa-
gilina (não existe no Brasil) como monoterapia. A associação com a levo-
dopa deve ser considerada nos casos de resultados que não atinjam a expec-
tativa do paciente. Devemos ressaltar que a levodopa deve ser utilizada nas
menores doses úteis. Quando importante impacto funcional, emocio-
nal, prossional (com risco de perda de emprego) e na qualidade de vida,
devemos iniciar o tratamento com agonista dopaminérgico ou levodopa.
36 Doença de Parkinson – Recomendações
Como tratar inicialmente pacientes com 65 anos de idade ou mais?
Recomendações: Recomenda-se iniciar terapia dopaminérgica ou com
AD (Nível A) ou levodopa (Nível A). Acima dos 80 anos inicia-se trata-
mento com levodopa. Em pacientes que já apresentam inicialmente distúr-
bios cognitivos, a medicação de escolha é a levodopa.
Existe indicação na utilização de acupuntura ou tratamento homeopático para
controle dos sintomas nas fases iniciais do tratamento da DP? Uma revisão
sistemática avaliou a ecácia da acupuntura na DP. Foram incluídos 11 es-
tudos. Em seis destes estudos foi comparada a associação da acupuntura
com drogas convencionais vs. as drogas convencionais. Uma metanálise92
de dois destes estudos sugeriu um efeito positivo da acupuntura. Outros
dois estudos compararam a acupuntura com placebo e resultado favorável à
acupuntura. Entretanto, o número total de pacientes era pequeno e a qua-
lidade dos estudos não era adequada, não sendo possível concluir evidência
para a ecácia da acupuntura.
Conclusão: Não existe evidência cientíca da ecácia desses modos de
tratamento no início da DP (nível U).
Recomendação: Não há evidência para recomendar o uso da acupuntura
como tratamento de primeira escolha na fase inicial da DP.
Existe indicação da utilização de medicamentos com atividade neuroproteto-
ra na fase inicial de tratamento da DP? A selegilina foi a primeira droga a
se investigar um efeito neuroprotetor. Esta possibilidade surgiu porque a
MAO B inibe a oxidação da MPTP (metil-fenil-tetra-hidropiridina) em
MPP+ e bloqueia a formação de radicais livres, tendo assim um efeito
protetor sobre os neurônios93. Isto foi observado em estudos experimen-
tais em animais que foram submetidos à exposição de MPTP e a selegi-
lina impediu a indução de parkinsonismo. É possível que este efeito neu-
roprotetor em estudos experimentais não seja dependente da inibição da
MAO B, mas pela ação de um seu metabólito, a desmetilselegilina (DMS)
e outra propargilarmina que se ligariam a uma enzima gliceroaldeído fos-
tato desidrogenase, permitindo um mecanismo compensatório que teria a
função de proteção94. Os resultados do estudo DATATOP (Classe I), do
estudo sueco (Classe II), de uma metanálise e de uma revisão sistemática
da Cochrane não permitem concluir que a selegilina apresente um efeito
neuroprotetor.
O estudo TEMPO45 avaliou a ecácia da rasagilina em monoterapia
(Classe I) em duas doses 1 mg e 2 mg e placebo. Houve melhora do UPDRS
Doença de Parkinson – Recomendações 37
em comparação ao placebo e melhora na escala de qualidade de vida. A ra-
sagilina foi considerada como ecaz como monoterapia na fase inicial. Os
dados eram insucientes para avaliar neuroproteção.
O estudo ADAGIO33 teve como objetivo avaliar o papel da rasagilina
como terapia que modica a evolução da doença, onde incluiu 1.176 pa-
cientes com extensão de 72 semanas e os resultados mostraram que o tra-
tamento precoce com 1 mg de rasagilina induzia menor piora em relação
ao grupo de tratamento tardio. Entretanto, com o tratamento precoce com
2 mg era semelhante ao tratamento tardio. Estes resultados não provam o
efeito da rasagilina como terapia neuroprotetora.
O efeito neuroprotetor do pramipexol foi avaliado no estudo CALM-
PD através dos resultados de neuroimagem SPECT com β-CIT comparan-
do o grupo em monoterapia com pramipexol com o grupo em uso de le-
vodopa após um período de quatro anos. O grupo que utilizou pramipexol
apresentou menor porcentagem de queda da ligação do β-CIT no estriado,
com diferença estatística signicativa. Entretanto, como não houve um
grupo controle com placebo, não se pode concluir o impacto das medica-
ções na evolução da doença.
Para tentar avaliar posvel efeito neuroprotetor do ropinirol, Whone
e cols.95 compararam a captação de F-dopa putaminal por tomograa por
emissão de pósitrons (PET) no grupo em uso de ropinirol com o grupo em
uso de levodopa, após período de dois anos. Apesar do grupo do ropinirol
apresentar queda signicativamente menor na captação de F-dopa, a in-
terpretação destes resultados é motivo de muita controvérsia, já que não se
pode armar que tais resultados tenham relação com a evolução da DP.
Um estudo Classe I (ELLDOPA)77 avaliou o efeito neuroprotetor da
levodopa, através da comparação de três grupos que utilizavam doses di-
ferentes (300, 400, 600 mg/dia) de levodopa em monoterapia vs. placebo.
Os pacientes que utilizaram levodopa apresentaram melhora motora que
persistia por duas semanas após a retirada da droga experimental compara-
dos ao grupo placebo. Os dados foram inconclusivos porque o período de
duas semanas pode ter sido insuciente para a eliminação total do efeito da
levodopa.
Conclusão: Não existem evidências sucientes (Nível U) para consi-
derar qualquer droga antiparkinsoniana em uso corrente com ação neuro-
protetora.
Recomendação: Embora não exista evidência suciente para o uso de
qualquer droga antiparkinsoniana de uso corrente com ação neuroproteto-
ra, elas podem ser utilizadas na fase inicial para o controle dos sintomas.
38 Doença de Parkinson – Recomendações
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Tratamento da fase
avançada da doença de
Parkinson com estratégias
terapêuticas para flutuações
motoras e discinesias
COORDENAÇÃO
Henrique Ballalai Ferraz e Egberto Reis Barbosa
COMPOSIÇÃO
Orlando Graziani Povoas Barsottini, Denise Hack Nicaretta
Débora Palma Maia, Flávio Augusto Sekeff Sallem
Doença de Parkinson – Recomendações 45
Tratamento da fase avançada
da doença de Parkinson com
estratégias terapêuticas para
utuações motoras e discinesias
COORDENAÇÃO
Henrique Ballalai Ferraz
Egberto Reis Barbosa
COMPOSIÇÃO
Orlando Graziani Povoas Barsottini
Denise Hack Nicaretta
Débora Palma Maia
Flávio Augusto Seke Sallem
INTRODUÇÃO
Os pacientes portadores de doença de Parkinson (DP) apresentam melhora
signicativa dos seus sintomas com a terapia dopaminérgica. Entretanto, com-
plicações motoras, as chamadas utuações e discinesias, são frequentes após al-
guns anos de tratamento e podem interferir na qualidade de vida dos parkin-
sonianos. Os fatores de risco para desenvolvimento das discinesias e utuações
são: idade precoce de início da DP, gravidade e tempo da doença, entre outros.
Questões de como abordar os parkinsonianos que apresentam as com-
plicações motoras são uma rotina entre aqueles que acompanham estes pa-
cientes. A seguir, apresentaremos respostas às perguntas mais frequentes.
QUE MEDIDAS REDUZEM O PERÍODO OFF?
Fracionamento da dose e orientação dietética. Em função da meia-vida cur-
ta da levodopa, recomenda-se o fracionamento das tomadas da medicação
reduzindo os intervalos entre as doses. Além disso, devido à competição
com aminoácidos da dieta, sugere-se uma redistribuição da dieta proteica,
priorizando estes nutrientes para o nal do dia1 (Classe IV).
Agonistas ergolínicos. O interesse pelo uso dos agonistas dopaminérgicos
no tratamento da DP reside no seu potencial efeito antiparkinsoniano,
46 Doença de Parkinson – Recomendações
associado a uma chance menor de complicações motoras do que aqueles
produzidos pela levodopa2. O início de seu uso deu-se na década de 1970,
inicialmente como medicação adjunta a levodopa, em pacientes que co-
meçavam a experimentar complicações motoras. As drogas pertencentes a
este grupo e mais largamente utilizadas em todo o mundo são a bromo-
criptina, a cabergolina, a pergolida e a lisurida.
A bromocriptina foi o primeiro agonista dopaminérgico aprovado para
o tratamento da DP. É um agonista do receptor D2 e fraco antagonista do
receptor D1. Vários estudos demonstraram sua capacidade, associada à le-
vodopa, de diminuir os sintomas parkinsonianos e reduzir discinesias e u-
tuações motoras em pacientes com DP em estágio avançado. Porém, estudo
publicado em 2008 por Katzenschlager e cols.3, após período de 10 anos de
observação, mostrou que o uso precoce da bromocriptina não teve impacto
positivo sobre a mortalidade e o desenvolvimento de complicações moto-
ras, não havendo por tanto vantagens sobre o uso precoce da levodopa.
A pergolida também é um agonista do receptor D2, porém difere da
bromocriptina por ser também um fraco agonista do receptor D1. Vários
estudos prospectivos, controlados, duplos-cegos e com grupo placebo mos-
traram que a adição do pergolida ao tratamento, em pacientes parkinsonia-
nos em estágios avançados, já utilizando levodopa, resultaram em melhoras
dos scores motores e diminuição dos períodos o. Resultados semelhantes
foram obtidos com a cabergolina e lisurida quando associadas à levodopa.
Vários estudos mais antigos já mostravam a ecácia do uso dos agonistas
ergolínicos no tratamento da DP: pergolida2,4, bromocriptina5 e cabergolina6.
Estudos comparativos entre as diversas drogas (ex.: bromocriptina × ca-
bergolina, bromocriptina × pergolida) mostraram que a ecácia dos diversos
agonistas dopaminérgicos ergolínicos parece semelhante. A ecácia destas
medicações tem sido demonstrada tanto como monoterapia, com desenvolvi-
mento menor de complicações motoras, tanto quanto associado à levodopa.
Nos dias atuais o uso dos agonistas ergolínicos vem diminuindo, em
parte pela presença de efeitos colaterais importantes e em outra parte pela
introdução dos agonistas dopaminérgicos não-ergolínicos, como o prami-
pexol e o ropinirol. Efeitos colaterais chamados de centrais são confusão,
alucinações e psicose além de sonolência excessiva diurna. Embora a pre-
sença de ergotismo franco seja muito raro, recentemente descreveu-se a
presença de brose e disfunção valvar cardíaca em pacientes que utilizavam
tanto cabergolina quanto pergolida, possivelmente pela ativação do recep-
tor 5HT2b. Em virtude desta situação o uso tanto de pergolida quanto de
cabergolina tem diminuído drasticamente nos últimos anos. Pacientes que
Doença de Parkinson – Recomendações 47
ainda estão em uso destas drogas devem ser constantemente monitorados
quanto à presença de brose valvar cardíaca. Os efeitos colaterais agudos
normalmente são semelhantes aos da levodopa e incluem náuseas, vômi-
tos e hipotensão postural. O uso de agonistas dopaminérgicos ergolínicos
também pode estar associado a fenômenos Raynaud-like, eritromelalgia e
brose pulmonar e retroperitonial e como já citado acima até 30% dos pa-
cientes poderão desenvolver brose e disfunção valvar cardíaca.
Agonistas não-ergolínicos. Os agonistas dopaminérgicos não-ergolínicos,
lançados na década de 90, são os agonistas dopaminérgicos mais utilizados
atualmente. Dentre estes, temos disponíveis no Brasil o pramipexol e o pe-
ribedil, mas existe no mercado internacional o ropinirol, a rotigotina (for-
mulação em patch) e, mais recentemente, o pramipexol ER (formulação de
liberação prolongada) que permite uma tomada diária apenas.
Os estudos sobre agonistas dopaminérgicos na fase avançada da DP não
demonstraram grandes diferenças entre eles. Os efeitos colaterais mais co-
muns são: sonolência excessiva, náusea e hipotensão postural. Edema e ga-
nho de peso também podem ocorrer. Problemas neuropsiquiátricos como
alucinações, psicose e doenças do controle dos impulsos o mais comuns
em usuários de agonistas dopaminérgicos do que nos em uso de levodopa7.
Ressalta-se que o piribedil não tem sido estudado de forma sistemática nas
fases avançadas da DP. A maioria dos estudos com este agonista dopaminér-
gico são em fases iniciais da DP ou para sintomas especícos como o tremor.
As duas últimas grandes revisões do assunto foram publicadas em 2005
e 2006. Na primeira, publicada no Movement Disorders, Goetz et al.8 ze-
ram uma revisão dos estudos baseados em Nível I de evidência (trabalhos
clínicos randomizados), que haviam sido publicados entre 2001 e 2004,
sobre tratamento farmacológico e cirúrgico da DP. Os autores haviam
publicado uma revisão semelhante no ano de 2002 e tinham como objeti-
vo detectar possíveis mudanças no tratamento da DP. No manejo das com-
plicações motoras, a conclusão desta revisão foi que tanto o pramipexol
quanto o ropinirol são ecazes no manejo das utuações e ambos possuem
evidências sucientes que permitem concluir seu benefício clínico. Os re-
sultados foram semelhantes aos encontrados na primeira revisão. Os auto-
res chegaram a esta recomendação através dos seguintes estudos:
t Mizuno et al.9 (2003), estudo randomizado, 3 braços paralelos
(placebo, bromocriptina e pramipexol) envolvendo 325 pacientes
com DP avançada que apresentavam utuações motoras e freezing
durante 12 semanas. Os scores do UPDRS ADL on e o UPDRS
48 Doença de Parkinson – Recomendações
total foram signicantemente menores no grupo do pramipexol
(p<0,001) e da bromocriptina. Aparentemente, o grupo que usou
pramipexol obteve uma resposta melhor, mas o estudo não foi capaz
de denir esta diferença.
t Wong and associates10, em 2003, acompanharam 150 pacientes du-
rante 15 semanas, em um estudo dublo cego, randomizado, contro-
lado com placebo, em grupos paralelos (levodopa + placebo e levo-
dopa + pramipexol). O resultados foram baseados no UPDRS on e
o. O período o foi menor no grupo em uso de pramipexol.
t Im e colaboradores11, em um estudo randomizado publicado em
2005, duplo cego, em grupos paralelos, controlados com bromo-
criptina, acompanharam 76 pacientes com utuações durante 16
semanas. Foram avaliados a diminuição da dose da levodopa e a me-
lhora de 20% no UPDRS. O grupo em uso do ropinirol permitiu
uma redução maior da dose da ldopa. Ambos os agonistas dopami-
nérgicos melhoram o UPDRS, mas não houve diferença entre eles.
A segunda revisão foi publicada no Neurology em 2006 por Pahwa et
al.12. Nesta revisão membros da Academia Americana de Neurologia esta-
beleceram recomendações para o manejo dos pacientes parkinsonianos com
utuações e disciensias. As conclusões foram: para utuações os agonistas
dopaminérgicos, incluindo os não ergolínicos, demonstram evidência -
vel B em reduzir o período o. Na avaliação do pramipexol havia um estu-
do Classe I e um Classe II, e para o ropinirol, dois estudos Classe II. Não
há evidências de superioridade entre os diversos agonistas não ergolínicos,
mas há indícios de superioridade do ropinirol sobre a bromocriptina.
Trabalhos mais recentes sobre manipulação das complicações motoras
na DP são:
t Stocchi et al.13, 2008: através de uma revisão dos tratamentos vigen-
tes para utuações e discinesias concluem que as utuações podem
ser minimizadas com o uso dos agonistas dopaminérgicos, mas as
discinesias não.
t Olanow, Stern e Sethi7 publicaram uma monograa no Neurology
em 2009 sobre as bases clínicas e cientícas para o tratamento da
DP. As conclusões, resumidas dos autores foram:
Para utuações: o uso dos agonistas dopaminérgicos podem reduzir
o tempo o em 1 a 2 horas em pacientes com wearing o. Não há
diferença entre os diversos agonistas dopaminérgicos. Rotigotina e
Ropinirol de liberação prolongada podem ser utilizados em pacien-
tes com sintomas parkinsonianos durante a noite.
Doença de Parkinson – Recomendações 49
Está em via de lançamento comercial a formulação de ação estendida
do pramipexol que tem evidências de ter o mesmo grau de ecácia da for-
mulação padrão14.
ICOMT. Somente uma pequena quantidade de cada dose de levodopa admi-
nistrada atravessa a barreira hematoencefálica (BHE), sendo a maior parte
metabolizada pela enzima catecol-O-metiltransferase (COMT), em 3-O-me-
tildopa, no fígado e intestino15. Os inibidores da COMT, entacapona e tol-
capona, diminuem o metabolismo da levodopa aumentando sua oferta para
o sistema nervoso central16. A tolcapona, um inibidor seletivo reversível da
COMT com ação central e periférica, administrada em 3 tomadas, permite
a diminuição da dose da total de levodopa e do número de suas tomadas.
Sua ação se faz presente, aproximadamente, duas semanas após o início
do tratamento. A entacapona, também um inibidor reversível da COMT,
tem ação somente periférica e como sua meia-vida é menor que a da tolca-
pona precisa ser administrada, simultaneamente, a cada dose de levodopa17.
Poucos estudos compararam diretamente a ecácia das duas substâncias7.
São geralmente bem toleradas, mas podem induzir ou piorar as discine-
sias, especialmente naqueles pacientes que as já manifestaram previamente.
Nesses casos é necessária uma redução de 15% a 30% na dose total da
levodopa utilizada7. Podem, ainda, provocar náusea e diarreia, hipotensão
ortostática e confusão mental, assim, como alterar a coloração da urina16.
Sabe-se que a tolcapona pode ser hepatotóxico ao contrário da entacapo-
na16 e devemos considerá-la como opção terapêutica quando a utua-
ção motora não for controlada adequadamente com as outras drogas7. Se
utilizada, a função hepática (TGO e TGP) deverá ser monitorada a cada
2 semanas no primeiro ano de tratamento, a cada 4 semanas nos 6 meses
seguintes e após, a cada 8 semanas. Deverá ser descontinuada se, após 3
semanas do seu início, não for vericada melhora clínica12,17.
A associação de levodopa, carbidopa e entacapona em um único com-
primido, conhecida como tríplice combinação, facilita a tomada das me-
dicões e assegura que ambas as drogas sejam tomadas simultaneamente,
garantindo maior aderência do paciente ao tratamento15.
Os inibidores da COMT são utilizados no tratamento das utuações
motoras que ocorrem na fase avançada da DP, sempre em associação com
a levodopa7. Estudos duplo-cegos controlados com inibidores da COMT
mostraram redução do período o, com aumento de 1 a 2 horas no perí-
odo on8; e a maioria dos estudos com a entacapone mostrou melhora no
score motor da Unied Parkinson’s Disease Rating Scale (UPDRS)18.
50 Doença de Parkinson – Recomendações
Levodopa de liberação controlada. Levodopa é a medicação padrão ouro no
tratamento da DP. Entretanto, seu perl farmacocinético acaba por levar à
estimulação pulsátil dos receptores dopaminérgicos produzindo alterações
siológicas nos núcleos da base, sendo as discinesias sua apresentação clí-
nica mais evidente. A tentativa de conseguir a estimulação dopaminérgica
contínua levou às formulações de levodopa de liberação prolongada, cuja
estrutura e perl farmacocinético propõem uma meia-vida mais longa da
levodopa, por conseguinte com maior permanência da dopamina nos ter-
minais dopaminérgicos cerebrais19. Foi realizada uma revisão sistemática, à
procura de evidências que possam conrmar esta hipótese.
A pesquisa MEDLINE de 1980 até 2010 demonstra 32 estudos ava-
liando o papel das várias formulações de levodopa de liberação prolongada
no tratamento da fase avançada da DP20,21.
Entretanto, alguns comentários se impõem:
t Os estudos em sua maioria são abertos, sendo que somente 9 estudos
(28%) são duplo-cegos, randomizados, controlados com placebo21-27.
t O número de paciente foi pequeno nos estudos, com somente um
estudo aberto com 158 pacientes28 (média 22,06 ± 25,79 pacientes,
5 a 158 pacientes).
t O tempo de estudo foi pequeno em praticamente todos os estudos
(somente 2 ou 3 estudos dos 32 com tempos de estudo maior que 1
ano, < 10% do total de estudos).
t As formulações de levodopa de liberação prolongada utilizadas em
cada estudo são as mais variadas, variando na dose de levodopa e
carbidopa, ou na presença de benserazida em vez de carbidopa, o
que acaba por invalidar uma análise de conjunto dos estudos por
falta de homogeneidade.
IMAO-B. Os inibidores da MAO têm sido utilizados como tratamento sin-
tomático da DP nos últimos 20 anos, baseado no potencial bloqueio da
oxidação da dopamina pela MAO e também por aumentar a presença de
dopamina na fenda sináptica. Em suma, a inibição da MAO-B eleva os
níveis de dopamina estriatal.
A selegilina produz uma inibição seletiva e irreversível da MAO-B, com
míninos efeitos sobre a MAO-A, uma enzima envolvida na deaminação da
serotonina e noradrenalina. Em grande parte metabolizada pelo fígado,
seus metabólicos (desmetil-selegilina e metanfetamina) são derivados anfe-
tamínicos, o que em parte explicara os efeitos estimulantes e também efei-
tos colaterais da droga. A selegilina inicialmente foi utilizada com droga
Doença de Parkinson – Recomendações 51
adjunta a levodopa, especialmente em pacientes com utuações motoras,
entretanto, atualmente sua utilização tem se dado em formas iniciais da
doença, em parte pelos teóricos efeitos neuroprotetores (só evidenciados
em modelos animais) e pelo seu efeito sintomático. A monoterapia com se-
legilina (10 mg/dia) pode aliviar sintomas parkinsonianos e durante algum
tempo pode postergar a introdução da levodopa em pacientes com quadros
iniciais de DP29,30. Quando associada à levodopa, a selegilina pode aumen-
tar os efeitos colaterais dopaminérgicos, como piora das discinesias e de
sintomas neuropsiquiátricos, especialmente na população mais idosa com
DP. Uma publicação do PD Research Group do Reino Unido31 mostrou
que o uso concomitante da selegilina e a levodopa aumenta a mortalida-
de, em comparação a pacientes que utilizavam apenas a levodopa. Todavia
este aumento da mortalidade não pode ser demonstrado em metanálises
realizadas. O seguimento do estudo DATATOP32 também não demonstrou
aumento da mortalidade com o uso da selegilina.
Mais recentemente, a rasagilina foi aprovada para o tratamento da DP,
tanto em formas iniciais quanto avançadas da doença. A rasagilina tam-
bém é um inibidor irreversível da MAO-B, sendo mais potente e seletivo
do que a selegilina e com a vantagem de não produzir metabólicos anfe-
tamínicos. Ela tem sido mais bem estudada do que a selegilina tanto em
monoterapia em fases iniciais, como associada à levodopa em estágios mais
avançados da doença33. O estudo TEMPO34 comparando o uso de rasa-
gilina (1-2 mg/dia) e placebo, por período de seis meses, em estudo con-
trolado, randomizado, multicêntrico, duplo-cego, em 404 pacientes ante-
riormente não tratados para DP, mostrou melhora signicativa dos scores
do UPDRS tanto total quanto motor nos pacientes utilizando rasagilina,
em comparação com o grupo placebo. Dois outros estudos, denominados
PRESTO35 e LARGO36, duplo-cegos, randomizados e com grupo controle,
também mostraram a ecácia da rasagilina associada à levodopa em pacien-
tes que apresentavam utuações motoras associadas à levodopa. O estudo
ADAGIO37,38 comparando o uso de doses de 1 mg/dia e 2 mg/dia, além da
introdução precoce ou mais tardia da medicação, mostrou benefícios claros
com a dose de 1 mg/dia, mas não com 2 mg/dia, além de teóricos efeitos
benécos do início precoce da rasagilina quanto à progressão da doença.
Tanto a selegilina quanto a rasagilina quando empregadas em monote-
rapia ou em associação com a levodopa parecem ser drogas bem toleradas.
Os efeitos colaterais mais observados estão relacionados à produção de me-
tabólicos anfetamínicos (em particular a selegilina). A inibição da MAO
também tem um potencial de alterar o metabolismo da serotonina e indu-
52 Doença de Parkinson – Recomendações
zir ao aparecimento de uma “síndrome serotoninérgica”, sendo recomenda-
do que seja evitada a associação de inibidores da MAO-B com inibidores
seletivos da recaptação de serotonina e antidepressivos tricíclicos.
Em função da meia-vida curta da levodopa, recomenda-se o fraciona-
mento das tomadas da medicação reduzindo os intervalos entre as doses
(Nível U).
Devido à competição com aminoácidos da dieta, sugere-se uma redis-
tribuição da dieta proteica priorizando estes nutrientes para o nal do dia
(Nível U).
No Brasil temos disponível a bromocriptina com evidência Nível C de
ecácia para redução de período o. Recomenda-se a adição de bromocrip-
tina a levodopa, embora reconhecendo as diculdades com a tolerabilidade
e os efeitos colaterais de longo prazo. Os pacientes em uso desta droga de-
vem ser monitorados quanto ao aparecimento de brose retroperitoneal,
pleural e disfunção valvar cardíaca.
Os AD não-ergolínicos, pramipexol e ropinirol (este ainda não disponí-
vel no Brasil) têm sido utilizados em associação a levodopa com Nível B de
evidência, no tratamento das complicações motoras do tipo utuações.
A entacapona pode ser utilizada para a redução do period o (Nível
A). A tolcapona também pode ser considerada, mas deve ser utilizada com
cautela e com monitorização rigorosa das provas de função hepática.
Os estudos indicam que a levodopa de liberação prolongada possui Ní-
vel C de evidência no tratamento da fase avançada da DP, apesar da maio-
ria apresentar falhas metodológicas graves. Assim, não é possível concluir
pela ecácia da levodopa de liberação prolongada no tratamento da fase
avançada da DP.
Em virtude dos poucos estudos relacionados ao uso da selegilina em
estágios avançados da DP e seus possíveis efeitos colaterais, não há evidên-
cias para sua utilização nestas fases. No caso da rasagilina, existem estu-
dos consistentes que evidenciam os benefícios de sua utilização em estágios
mais avançados da doença para redução do período o, associada à levodo-
pa (Nível A).
QUE MEDIDAS PODEM MELHORAR O RETARDO NO EFEITO
ON E AS FLUTUAÇÕES ERRÁTICAS?
Não estudos clínicos controlados para controle deste tipo de complica-
ção. Entretanto a prática clinica sugere que as mesmas medidas dietéticas
e de fracionamento da dose da levodopa podem amenizar o problema. No
retardo do on as medidas para aceleração do esvaziamento gástrico como
Doença de Parkinson – Recomendações 53
uso de drogas procinéticas (domperidona) e a erradicação de eventual in-
fecção por H. pylori39,40 podem auxiliar no problema (Nível U).
Com relação às utuações erráticas também não estudos clínicos
abordando especicamente este problema. Porém, a utilização de infusão
subcutânea contínua de apomorna ou de levodopa gel por via duodenal
(ambos ainda não disponíveis no mercado brasileiro) podem amenizar o
problema (Nível U).
Nos episódios de off imprevisíveis e resistentes à dose de levodopa
tem sido recomendado o uso de apomorna subcutânea para o resgate41
(Nível U).
Q U AIS AS MEDIDAS PARA ATUAR NO
BLOQUEIO MOTOR (FREEZING)?
Não há nenhum estudo controlado com número signicativo de pacientes
abordando especicamente este problema. Do ponto de vista prático (Ní-
vel U), no freezing de período o recomenda-se as mesmas medidas uti-
lizadas para o wearing-o. No freezing de período on estratégias visuais e
treinamentos de marcha podem amenizar o problema42-44.
MANEJO DAS DISCINESIAS ASSOCIADAS A LEVODOPA
Quais as medidas para as discinesias de pico de dose? Uma das primeiras me-
didas a serem tomadas é a redução da dose total da levodopa. Frequente-
mente esta medida está associada a piora dos períodos o não sendo fac-
tível do ponto de vista prático na maior parte das vezes. A associação de
agonistas dopaminérgicos pode permitir uma redução da dose de levodopa
sem prejuízo do desempenho motor. Não há estudos desenhados especi-
camente com o objetivo de demonstrar essa estratégia, sendo portanto uma
medida baseada na experiência da prática clinica (Nível U de evidência).
Nos pacientes que estão recebendo ICOMT e IMAO-B devem ter as
doses destas medicações reduzidas ou suspensas.
A amantadina é um agente antiviral inicialmente utilizado no trata-
mento e prevenção da gripe asiática, e que vem sendo usado no tratamen-
to da DP desde a descoberta de suas propriedades antiparkinsonianas em
1969 por Schwab et al.45. Possui ação dopaminérgica, anticolinérgica e
anti-glutamatérgica. É medicação amplamente utilizada para tratar os sin-
tomas motores da DP.
Amantadina, uma droga antagonista de receptores NMDA é capaz de
melhorar as discinesia pela levodopa. Há pelo menos seis publicações evi-
denciando o papel da amantadina nesta situação:
54 Doença de Parkinson – Recomendações
Verhagen Metman et al. (1998)46 recrutaram 18 pacientes em um estu-
do de cross-over duplo-cego controlado de 6 semanas, avaliando amantadi-
na 100 a 400 mg ao dia e placebo. Os autores concluem no estudo que a
amantadina substancialmente melhora as discinesias induzidas por levodopa
sem melhora dos sintomas motores da DP. A amantadina diminuiu ainda a
duração dos períodos o signicativamente e melhorou a qualidade de vida
dos pacientes no período on e no período o. Estes benefícios foram susten-
tados por pelo menos 12 meses. O uso da amantadina levou a efeitos colate-
rais leves em 4 pacientes (boca seca, confusão e piora das alucinações) com
doses acima ou iguais a 300 mg ao dia. Quatro pacientes saíram o estudo
por efeitos colaterais em doses acima ou iguais a 100 mg ao dia (alucinações,
confusão, palpitações, náuseas), com uma taxa de saída do estudo de 22%.
Luginger et al. (2000)47 recrutaram 11 pacientes em um estudo cross-
over duplo-cego controlado com placebo. Os pacientes mantiveram o uso
de suas medicações antiparkinsonianas antes do estudo. Houve melhora
das discinesias em 52% com amantadina (p<0.05), sem melhora nos sin-
tomas motores da DP. Houve uma diminuição não signicante na duração
dos períodos o. Os autores sugerem que é válido em pacientes portadores
de discinesias induzidas por levodopa o uso de amantadina antes de se ten-
tar tratamentos mais complexos ou invasivos.
Snow et al.48 recrutaram 24 pacientes em um estudo duplo-cego, ran-
domizado controlado com placebo com cross-over, com duração de 6 sema-
nas com um breve período de wash-out. Os autores armam que os pacien-
tes em uso de amantadina obtiveram uma redução de 24% nas discinesias
induzidas por levodopa, efeito que segundo os autores durou 6 meses em
alguns pacientes.
omas et al. (2004)49 recrutaram 40 pacientes em um estudo duplo-ce-
go randomizado controlado com placebo de 12 meses de duração. As doses
de amantadina não foram superiores a 300 mg ao dia. Cinco pacientes saí-
ram do estudo por efeitos colaterais (taquicardia, psicose e livedo reticular).
Após 15 a 30 dias de tratamento com amantadina, houve uma diminuição
signicante nos escores de discinesias nos pacientes em uso de amantadina
(45%) (p<0.001). Segundo o estudo, este efeito diminuiu ou sumiu após
3 a 8 meses de tratamento com amantadina, mas a retirada da amantadi-
na levou a um aumento signicante das discinesias em 11 pacientes. Os
autores julgam os efeitos da amantadina de curta duração, mas potentes.
Pereira da Silva Júnior et al.50 recrutaram 18 pacientes em um estudo
duplo-cego randomizado, controlado com placebo com duração de 3 se-
manas. Dois grupos de 9 pacientes foram formados, um recebendo aman-
Doença de Parkinson – Recomendações 55
tadina e outro placebo. Os autores armam que houve uma redução sig-
nicativa no tempo de discinesias nos pacientes com amantadina, e uma
melhora na qualidade de vida. Apesar do uso de duas escalas (UPDRS par-
te II e IVa e Clinical Dyskinesia Rating Scale), houve melhora somente nos
parâmetros de qualidade de vida e discinesias na avaliação pelo UPDRS.
Wolf et al. (2010)51 conduziram um estudo multicêntrico nacional ran-
domizado, duplo-cego, controlado com grupo paralelo pacebo, com 32
pacientes em uso de amantadina por no mínimo 1 ano (média de 4.8
anos) para utuações motoras. Os pacientes foram alocados para um grupo
de amantadina (14 pacientes) e um grupo placebo (18 pacientes). Dois pa-
cientes do grupo placebo saíram do estudo por piora signicativa nas disci-
nesias. Houve aumento signicativo no tempo on com discinesias graves e
na duração das discinesias nos pacientes alocados para o grupo placebo. Os
autores armam que a amantadina mantém um efeito antidiscinético anos
após sua introdução. Não houve evidência de efeito da amantadina sobre
os sintomas motores durante o período on.
A clozapina e a quetiapina têm sido descritas como redutoras da disci-
nesias em alguns estudos52,53, porém os resultados são inconsistentes e po-
dem levar a piora do parkinsonismo em alguns pacientes, principalmente
quando a quetiapina é utilizada.
Conclusão: No manejo das discinesias a redução da dose total da levo-
dopa pode ser uma estratégia ecaz em que pese possa piorar os sintomas
motores (Nível U). O uso da amantadina associado ao tratamento habitual
pode reduzir as discinesias (Nível C). A clozapina deverá ser considerada
para os pacientes que não obtiverem melhora com a amantadina, sempre
com monitorização hematológica (Nível U).
Discinesia bifásica e distonia de período o. É de difícil tratamento e pode
responder a doses mais frequentes e elevadas de levodopa. No caso do pa-
ciente apresentar concomitantemente discinesias de pico de dose estas po-
dem piorar com a conduta7. Não há estudos controlados comparando me-
didas em pacientes com discinesia bifásica.
As distonias de período o, que ocorrem principalmente pela manhã,
estão associadas a uma queda no nível plasmático da levodopa. Não há es-
tudos controlados para avaliar o efeito de medicamentos nesta situação,
mas medidas práticas objetivando aumentar o nível plasmático da levodopa
podem ser uteis. Para tanto, pode-se prescrever levodopa ou agonistas do-
paminérgicos de ação prolongada ao deitar ou orientar para que o paciente
receba uma dose da levodopa antes de se levantar da cama pela manhã7.
56 Doença de Parkinson – Recomendações
Conclusão: Medidas como prescrever levodopa de ação prolongada antes
de deitar ou agonistas dopaminérgicos para aumentar a estimulação dopa-
minérgica, podem melhorar as duas condições (Nível U).
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Tratamento das
complicações
neuropsiquiátricas
COORDENAÇÃO
Francisco Cardoso e Ylmar Correa Neto
COMPOSIÇÃO
João Santos Pereira, Roberto César Pereira do Prado
Guilherme Gustavo Riccioppo Rodrigues,
Antonio Lúcio Teixeira Jr.
Doença de Parkinson – Recomendações 61
Tratamento das complicações
neuropsiquiátricas
COORDENAÇÃO
Francisco Cardoso
Ylmar Correa Neto
COMPOSIÇÃO
João Santos Pereira
Roberto César Pereira do Prado
Guilherme Gustavo Riccioppo Rodrigues
Antonio Lúcio Teixeira Jr.
INTRODUÇÃO
A descrição original da doença de Parkinson (DP) por James Parkinson1
enfatizava a presença de aspectos motores, em especial tremor. Posterior-
mente, foi denido que bradicinesia é o critério motor indispensável, por
sua correlação com deciência de dopamina2. Nos últimos anos, porém, há
volumosa literatura que chama a atenção para a presença de manifestações
não-motoras. O chamado Estudo de Sydney teve como objetivo fazer se-
guimento longitudinal de coorte de portadores de DP, vericando o efeito
de diferentes regimes terapêuticos. No entanto, graças ao seu desenho, foi
possível vericar aspectos importantes da história natural de parkinsonia-
nos tratados conforme padrões contemporâneos. Ao m do período de ob-
servação, demonstrou-se que, se por um lado, utuações e discinesias rela-
cionadas a levodopa estavam presentes em, respectivamente, 96 e 94% dos
pacientes, essas complicações eram incapacitantes em apenas 12% dos indi-
víduos. Em contraste, alucinações foram registradas em 50% dos pacientes,
além de existirem em número apreciável de sujeitos outras complicações
não-motoras como sonolência excessiva diurna (79%), demência (48%),
incontinência urinária (41%) e hipotensão postural sintomática (35%)3.
Conclusões não muito diversas foram encontradas em investigação de mais
de 1000 pacientes com DP na Itália, o chamado Estudo PRIAMO4. Nesta
pesquisa, sintomas não-motores foram identicados em 98,6% dos pacien-
tes, com média de 7,8 sintomas por indivíduo. Mais uma vez, problemas
neuropsiquiátricos, como ansiedade, foram muito comuns. A conclusão
desses estudos é que grande relevância clínica, tanto pela frequência
62 Doença de Parkinson – Recomendações
como pela morbidade, dos problemas não-motores de natureza neuropsi-
quiátricas na DP. Uma questão de interesse acadêmico e não resolvida no
momento é a patogênese dos sintomas não-motores. A teoria que exibe
maior popularidade é a hipótese de Braak. Conforme estudo desse autor e
seus colegas, a DP teria início nas porções caudais do tronco encefálico e
nos núcleos olfatórios do telencéfalo, apenas posteriormente estendendo-se
à parte compacta da substância negra. No primeiro momento, os pacientes
teriam apenas hiposmia e/ou constipação intestinal. No futuro, com o es-
palhamento das lesões anátomo-patológicas para o neocórtex, quadros de
alucinação e demência ocorreriam5. problemas nessa teoria, pois ela se
baseia fundamentalmente na distribuição de corpos de Lewy e não de mor-
te neuronal. Atualmente, muitos pensam que aquelas inclusões têm efeito
protetor e não xico aos neurônios. Além disso, é incerto se todos, ou
mesmo apenas a maioria dos pacientes com DP evoluem de mesmo modo6.
Nas seções que se seguem, serão apresentados resultados de revisão sis-
temática feita pelo grupo referentes aos seguintes tópicos: depressão, ansie-
dade, psicose e síndrome de desregulação dopaminérgica. Um documento
recente produzido pela American Academy of Neurology é fonte impor-
tante de recomendações nessa área7.
DEPRESSÃO
Quais tratamentos são ecazes para a depressão associada à DP? Depressão é
uma das principais manifestações neuropsiquiátricas na DP, afetando entre
40 e 50% dos pacientes. Estima-se que a frequência de depressão maior, de
depressão menor e de distimia seja de 17, 22 e 13%, respectivamente8. Além
do sofrimento subjetivo, a depressão está associada a comprometimento da
qualidade de vida e do funcionamento motor e cognitivo dos pacientes9.
O diagnóstico de depressão associada à DP é complexo, visto que pode
ocorrer considerável superposição de sintomas entre as duas condições,
como lenticação psicomotora, redução da expressão afetiva, alterações do
apetite, do sono e de funções cognitivas9.
Para o diagnóstico clínico da depressão associada à DP, vêm sendo em-
pregados inventários de sintomas, como o Inventário de Depressão de Beck
(BDI), e escalas que exigem experiência em sua aplicação, como a Escala
de Depressão de Hamilton e a Escala de Depressão Montgomery-Asberg.
Segundo a Academia Americana de Neurologia, esses instrumentos podem
ser úteis na identicação da depressão associada à DP10. No sentido de va-
lidar os instrumentos para a população brasileira, dois estudos indepen-
dentes (Classe III) foram realizados, sugerindo que o escore de 18 no BDI
Doença de Parkinson – Recomendações 63
identicaria casos de depressão maior associada à DP11,12. Ressalta-se que
esse valor difere signicativamente do escore de 13, proposto pela Acade-
mia Americana de Neurologia10. Estabeleceu-se a validade da Escala de Au-
to-Preenchimento para Depressão de Zung para a identicação de depres-
são associada à DP13 (Classe I). Assim, para pacientes brasileiros com DP,
o Inventário de Depressão de Beck e a Escala de Auto-Preenchimento para
Depressão de Zung são possivelmente úteis para a triagem de depressão.
Três revisões sistemáticas, embora divergindo quanto aos estudos incluí-
dos, concordam que os dados sobre a ecácia de qualquer estratégia antide-
pressiva na DP são insucientes14-16. Em 2009, foi publicado estudo duplo-
cego controlado com placebo na depressão associada à DP, comparando a
ecácia e a segurança da nortriptilina (até 75 mg/dia) e da paroxetina (até
37,5 mg/dia)17 (Classe I). A nortriptilina mostrou-se ecaz no tratamen-
to da depressão associada à DP (NNT=3,5), sendo seu efeito superior ao
placebo e à paroxetina. O efeito terapêutico da paroxetina foi comparável
ao do placebo. Apesar da inexistência de diferença estatisticamente signi-
cativa, pacientes tratados com nortriptilina apresentaram maior número de
efeitos colaterais anticolinérgicos. Esses dados corroboram estudos prévios,
controlados com placebo, que indicaram ecácia dos antidepressivos tri-
cíclicos na depressão associada à DP (Classe II18; Classe I19) e ausência de
efeito dos inibidores seletivos de recaptura da serotonina (Classe I20; Classe
II21). Ressalta-se que, no estudo de Devos et al.19, a ecácia do citalopram
foi comparável à da desipramina.
Não evidências sucientes da ecácia de outras modalidades tera-
pêuticas, como estimulação magnética transcraniana, eletroconvulsoterapia
ou psicoterapia, bem como outros agentes farmacológicos, inclusive ago-
nistas dopaminérgicos e antidepressivos de ação dual.
Conclusões: Nortriptilina e desipramina são provavelmente ecazes no
tratamento da depressão associada à DP (Nível B). Embora apresentem um
perl mais favorável de efeitos colaterais, não evidências sucientes da
ecácia dos inibidores seletivos de recaptura da serotonina.
Contexto clínico: É boa prática clínica iniciar o manejo da depressão
associada à DP com otimização da terapêutica antiparkinsoniana. Os da-
dos de ecácia contrastam sobremaneira com o observado na prática, em
que os inibidores seletivos da recaptura de serotonina são considerados por
neurologistas os antidepressivos de primeira linha no tratamento da depres-
são na DP22,23. Isso reete, em parte, a segurança relacionada ao seu uso em
contraposição ao perl menos favorável de efeitos adversos dos antidepres-
sivos tricíclicos, que incluem efeitos anticolinérgicos e cardíacos. Outros
64 Doença de Parkinson – Recomendações
antidepressivos podem ser interessantes em contextos clínicos especícos.
A mirtazapina, por exemplo, pode ser útil no manejo de pacientes com DP
com depressão e anorexia, pois seu efeito colateral de aumentar o peso tem
utilidade clínica nesse cenário24.
Recomendação: Em nosso meio, nortriptilina é o medicamento com
mais evidência de ecácia para tratar a depressão associada à DP. Entretan-
to, deve-se ter cautela com seus efeitos colaterais anticolinérgicos Não
evidências sucientes para sustentar ou refutar o uso de outras drogas ou
modalidades terapêuticas.
ANSIEDADE
Quais tratamentos são ecazes para a ansiedade associada à DP? Sintomas re-
lacionados aos transtornos de ansiedade são frequentes em pacientes com
DP, sendo relatados em 51% dos 450 pacientes do estudo francês DoPa-
MiP (utilizando a escala HADS-A)25, 55,5% dos 1072 pacientes do estudo
italiano PRIAMO26 e 68,8% dos 1351 pacientes do estudo espanhol TRA-
PECIO (utilizando o Inventário Neuropsicológico)27.
Aplicando critérios do DSM IV-R, a prevalência de transtornos de an-
siedade em um grupo de 127 pacientes com DP sem demência foi de 49%,
sendo o transtorno de ansiedade não especicado o mais comum (30%),
seguido de fobias especicas (24%), síndrome do pânico (10%) e fobia
social32,33. Neste estudo 20% dos pacientes apresentaram dois ou mais
transtornos de ansiedade28.
Apesar de frequentes e com signicativo impacto na qualidade de vida
dos pacientes29, tanto o diagnóstico quanto o tratamento dos transtornos
de ansiedade foram pouco avaliados até o momento. Uma análise crítica
de sete escalas de quanticação de ansiedade, já utilizadas em estudos com
parkinsonianos, salienta que nenhuma delas foi especicamente validada
nesta subpopulação30.
Recomendação recente da Academia Americana de Neurologia limita-
se a estabelecer que as evidências são insucientes para sustentar ou não
o uso de levodopa no tratamento de ansiedade na DP31. Especicamente
em relação ao uso de levodopa, é necessário salientar que a ansiedade é
considerada uma das manifestações não motoras da utuação de nal de
dose32,33. Utilizando-se a Escala de Ansiedade de Spielberger, sintomas de
ansiedade são mais intensos no período o 34. A infusão endovenosa de
levodopa em 8 pacientes com utuação motora mostrou redução de an-
siedade e melhora do humor, sem contudo atingir signicância estatística
(Classe IV35). Um estudo duplo cego cruzado, comparando levodopa de
Doença de Parkinson – Recomendações 65
liberação imediata com levodopa de liberação lenta em 14 pacientes, a me-
tade deles com utuação de nal de dose, mostrou melhora da ansiedade
através de uma escala de análise visual apenas quando os utuadores utili-
zaram levodopa de liberação imediata (Classe III36).
De forma geral, todavia, encontramos a avaliação do efeito ansiolítico
de diversos tratamentos utilizados no complexo rol de transtornos neurop-
siquiátricos da DP. Frequentemente avaliações qualitativas de sintomas de
ansiedade são objetivos secundários de tratamentos na DP, fora do contex-
to exclusivo de transtornos de ansiedade. Assim, a título de exemplo, em
um estudo comparativo entre nortriptilina, paroxetina de liberação lenta e
placebo em pacientes com depressão associada à DP observou-se redução
de sintomas ansiosos no grupo que utilizou nortriptilina tanto em compa-
ração com o grupo placebo como com o grupo da paroxetina de liberação
lenta. A resposta no grupo da paroxetina de liberação lenta não foi superior
à observada no grupo placebo (Classe II37). Outro estudo, aberto e com 10
pacientes avaliando o citalopram também no contexto de DP e depressão,
observou melhora na Escala de Ansiedade de Hamilton (Classe IV38). Mes-
mo o uso de estimulação cerebral profunda bilateral do núcleo subtalâmico
com objetivo primário de controle motor, mostrou redução de sintomas de
ansiedade como desfecho secundário (Classe IV39). Considerando o núme-
ro restrito de pacientes avaliados e as diculdades metodológicas, a transfe-
rência destes resultados para pacientes com DP e diagnóstico de transtor-
nos de ansiedade permanece incerta.
Embora usados com alguma frequência em pacientes com DP (cerca
de 22% dos participantes do estudo TRAPECIO27), muitas vezes com in-
dicação para os transtornos do sono, não há estudos avaliando a ecácia de
ansiolíticos nos transtornos de ansiedade na DP.
Conclusões: Não há estudos que investigaram primariamente o tratamen-
to dos transtornos de ansiedade na DP. Possivelmente, a nortriptilina reduz
sintomas ansiosos em pacientes com depressão associada à DP (Nível C).
Contexto clínico: É boa prática clínica iniciar o manejo de sintomas
ansiosos associados à DP otimizando o tratamento antiparkinsoniano, es-
pecialmente o controle das utuações relacionadas à levodopa. O uso de
antidepressivos possivelmente é útil no controle de sintomas ansiosos em
pacientes com DP. Benzodiazepínicos podem ser utilizados transitoriamen-
te no controle de sintomas ansiosos. Cautela é necessária, no entanto, fren-
te ao risco aumentado de quedas e deterioração cognitiva40.
Recomendação: Em nosso meio, nortriptilina é o medicamento com mais
evidência de ecácia para tratar sintomas ansiosos na depressão associada à
66 Doença de Parkinson – Recomendações
DP. Entretanto, deve-se ter cautela com seus efeitos colaterais anticolinérgicos
Não há evidências sucientes para sustentar ou refutar o uso de outras dro-
gas ou modalidades terapêuticas no tratamento de ansiedade associada à DP.
PSICOSE
Quais tratamentos são ecazes para a psicose associada à DP? A psicose, carac-
terizada pela presença de alucinações e/ou delírios, é frequente na DP, aco-
metendo cerca de 50% dos pacientes em algum momento de sua doença40,41.
É uma manifestação potencialmente grave, relacionando-se a maior risco de
internação em asilo42 e morte43. Os neurolépticos de primeira geração (por
exemplo, haloperidol e clorpromazina) apresentam maior anidade por re-
ceptores dopaminérgicos do tipo D2, sendo contra-indicados em pacientes
com DP. Os antipsicóticos de segunda geração (risperidona, olanzapina,
quetiapina, clozapina, ziprasidona e aripiprazole) em geral bloqueiam re-
ceptores D2 de forma mais fraca, o que lhes confere um menor risco de efei-
tos extrapiramidais e um possível lugar no tratamento da psicose na DP44.
Em relação à clozapina, estudos não controlados sugerem que a droga
leva a bom controle dos sintomas psicóticos sem piora do parkinsonismo
(Classe IV45-57). Os estudos controlados com placebo conrmaram a obser-
vação de que doses baixas de clozapina (até 50 mg/d) são ecazes no con-
trole dos sintomas psicóticos associados à DP (Classe III58,59; Classe I60).
A frequência de efeitos colaterais foi similar à do grupo placebo, exceto
em um estudo, cujo número de pacientes era pequeno (n=6) e as doses
utilizadas foram consideravelmente maiores58. Um ponto importante a ser
considerado nos pacientes que recebem a clozapina é o risco de agranuloci-
tose. De acordo com a Agência de Drogas e Alimentos dos Estados Unidos
(Food and Drug Administration - FDA), a incidência anual de agranulo-
citose com o uso de clozapina é de 1,3%, o que explica a decisão desse ór-
gão de obrigar a realização de contagem de glóbulos brancos semanais nos
primeiros 6 meses de prescrição, quinzenais nos 6 meses seguintes e men-
sais após o primeiro ano de uso. A agência nacional de vigilância sanitária
(ANVISA) sugere que se mantenha a periodicidade de exames hematológi-
cos conforme recomenda o FDA.
Quanto à quetiapina, os estudos não controlados demonstram melhora
do quadro psicótico (Classe IV61-68), exceto em um estudo (Classe IV69).
Por outro lado, os estudos controlados com placebo70-72 revelaram ausência
de superioridade da quetiapina (Classe II70,71; Classe III72). Destes traba-
lhos, apenas um evidenciou piora do parkinsonismo, ocorrendo em 13%
dos pacientes64. dois estudos comparando quetiapina e clozapina que
Doença de Parkinson – Recomendações 67
demonstram ecácia similar (Classe II73,74). Esses resultados devem ser en-
carados com cuidado pois comparam duas drogas ativas sem grupo placebo.
Estudos não controlados utilizando a olanzapina no tratamento de
sintomas psicóticos na DP são controversos (Classe IV75-77). os estudos
controlados demonstram consistentemente que a olanzapina piora os sin-
tomas parkinsonianos (Classe II78-80).O uso da risperidona no tratamento
da psicose na DP foi associado a piora do parkinsonismo em estudos não
controlados (Classe IV81,82). Um estudo controlado com clozapina sugere
igual ecácia e perl de efeitos colaterais entre as duas drogas, porém deve-
se considerar o baixo número de pacientes que completaram este estudo
(n=7) e o potencial viés de estudos sem grupo placebo (Classe IV83).Há
apenas estudos não controlados e com pequeno número de pacientes que
avaliaram a ecácia e segurança da ziprasidona e do aripiprazole no trata-
mento da psicose associada à DP (Classe IV84-88). Não é possível estabele-
cer conclusões sobre ecácia ou segurança desses medicamentos. O mesmo
pode ser armado sobre o uso de drogas anticolinesterásicas como donepe-
zila (Classe IV89) e rivastigmina (Classe IV90).
Conclusões: A clozapina é provavelmente ecaz no tratamento da psi-
cose na DP (Nível B). A quetiapina provavelmente não apresenta ecácia
superior ao placebo no tratamento da psicose associada à DP (Nível B). A
olanzapina é provavelmente deletéria para o paciente com psicose associa-
da à DP pelo risco de piora motora (Nível B). Não é possível estabelecer
recomendação quanto à ecácia e segurança de risperidona, ziprasidona,
aripiprazole e agentes anticolinesterásicos no tratamento dos sintomas psi-
cóticos da DP (Nível U).
Contexto clínico: A primeira medida no tratamento da psicose associada
à DP deve ser a suspeno ou redão de medicamentos que sabidamente
têm maior potencial em desencadear sintomas psicóticos, como biperide-
no, selegilina, amantadina e agonistas dopaminérgicos. Essa decisão deve
ser individualizada conforme o julgamento clínico. Nos casos de início
recente, principalmente quando associados a confusão mental, utuações
da atenção e alteração do ciclo sono-vigília, faz-se necessário investigação
de causas clínicas que possam estar desencadeando esse quadro, como in-
fecções ou distúrbios hidroeletrolíticos. Apenas quetiapina e clozapina não
pioram parkinsonismo. Mesmo com estudos controlados revelando que a
quetiapina não difere de placebo, pela sua facilidade de uso a maioria dos
clínicos opta por inicialmente prescrevê-la na abordagem inicial do parkin-
soniano com psicose. Não havendo resposta satisfatória, a quetiapina pode
ser substituída pela clozapina.
68 Doença de Parkinson – Recomendações
Embora o nível de evidência seja variável, a experiência clínica apon-
ta que olanzapina, risperidona e aripiprazole não devem ser utilizadas
para tratar psicose associada à DP em virtude de exacerbarem sintomas
motores.
Por m, deve-se considerar a elevação do risco cardiovascular associa-
do ao uso prolongado de antipsicóticos em idosos, particularmente em pa-
cientes com doença cérebro-vascular instalada. Por esse motivo, essa infor-
mação deve ser discutida com pacientes e familiares e o uso das drogas em
questão deve ser limitado ao menor tempo possível91.
Recomendação: Clozapina é o medicamento com evidência de mais e-
cácia para tratar a psicose associada à DP. Entretanto, deve-se fazer mo-
nitoração hematológica e ter cautela com seus outros efeitos colaterais. É
provável que quetiapina não seja superior a placebo. A olanzapina é prova-
velmente deletéria.
NDROME DE DESREGULAÇÃO DOPAMINÉRGICA
Quais tratamentos são ecazes para a síndrome de desregulação dopaminérgica
(SDD)? A SDD se caracteriza pela compulsão para ingerir medicação do-
paminérgica, mesmo sem necessidade para tal, ocasionando auto-adminis-
tração de doses extras, além de comportamentos motores estereotipados,
repetitivos e complexos, denominados “punding”92-96. Durante o efeito má-
ximo da medicação, podem surgir manifestações de hipomania com sen-
timentos de euforia, onipotência ou grandiosidade, enquanto sua retirada
induz a disforia, caracterizada por tristeza, lentidão psicomotora, fadiga
ou apatia92. Os transtornos do controle do impulso podem associarem-se
à SDD, sendo caracterizados por vício em jogos de azar, compulsão para
compras e alimentação e hipersexualidade92-95. As drogas dopaminérgicas,
principalmente em altas doses havendo predominância dos agonistas dopa-
minérgicos, principalmente o pramipexole, pergolida e ropinorole96-98.
Não existem estudos controlados do tratamento da SDD. Relatos de
caso sugerem que essa condição pode ser abordada com redução da dose
dopaminérgica da medicação ou mesmo sua retirada ou troca (Classe
IV99,100). Outras opções terapêuticas incluem uso de amantadina, antipsi-
cóticos atípicos ou mesmo estimulação cerebral profunda do núcleo sub-
talâmico ou globo pálido (Classe IV101-106).
Conclusões: Não há estudos controlados investigando o tratamento da
SDD (Nível U).
Contexto clínico: Baseados nos relatos de caso e na boa prática clínica,
recomenda-se a redução ou mesmo retirada de drogas dopaminérgicas no
Doença de Parkinson – Recomendações 69
manejo da SDD. No sub-grupo de pacientes com SDD e transtornos de
controle de impulso, sugere-se a suspensão de agonistas dopaminérgicos107.
Recomendação: Não há evidências sucientes para sustentar ou refutar
quaisquer modalidades terapêuticas na SDD. No entanto, a boa prática
clínica recomenda a redução ou suspensão de drogas dopaminérgicas.
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Tratamento da demência
na doença de Parkinson
COORDENAÇÃO
Vitor Tumas e Mônica Santoro Haddad
COMPOSIÇÃO
Ricardo Nitrini, Paulo Caramelli,
Marcus Vinicius Della Coletta,
Maria Sheila Guimarães Rocha
Doença de Parkinson – Recomendações 77
Tratamento da demência
na doença de Parkinson
COORDENAÇÃO
Vitor Tumas
Mônica Santoro Haddad
COMPOSIÇÃO
Ricardo Nitrini
Paulo Caramelli
Marcus Vinicius Della Coletta
Maria Sheila Guimarães Rocha
INTRODUÇÃO
A prevalência de demência em pacientes com doença de Parkinson (DP) é
cerca de seis vezes maior do que na população geral e os estudos apontam
para uma taxa geral de prevalência de demência em torno de 25-30%. Esses
números aumentam progressivamente com a idade e o tempo de duração da
doença, alcançando índices em torno 80% em pacientes com idade avançada.
Os principais fatores de risco associados ao desenvolvimento de de-
mência na doença de Parkinson (DDP) são: idade avançada, gravidade do
parkinsonismo e o aparecimento de comprometimento cognitivo leve. A
demência proporciona uma perda adicional na qualidade de vida do pa-
ciente e especialmente dos seus parentes e cuidadores, e aumenta a morbi-
mortalidade dos pacientes.
As bases patológicas da perda cognitiva na DP são múltiplas. A depleção
de dopamina no estriado compromete o funcionamento das alças subcorti-
cais que inuenciam o funcionamento do córtex frontal, a perda de células
no núcleo basal de Meynert promove depleção colinérgica cortical e conse-
quentemente perda cognitiva, além do desenvolvimento de anormalidades
corticais com a formação de corpos de Lewy. Além disso, o aparecimen-
to concomitante de patologia semelhante à da doença de Alzheimer tam-
bém pode colaborar para a ocorrência das manifestações cognitivas na DP.
Os tratamentos disponíveis para tratar a DDP são limitados até esse
momento. As drogas mais utilizadas para tratar outras formas de demência
poderiam teoricamente beneciar os pacientes com DP. O fato de que na
DP cit colinérgico cortical acentuado e até maior que o observado
78 Doença de Parkinson – Recomendações
na doença de Alzheimer, sugere que o uso de drogas colinérgicas possa tra-
zer benecio clínico a esses pacientes. Um dos motivos do receio inicial
para utilizar essa classe de drogas nos pacientes com DP foi a ideia de que
elas poderiam piorar o quadro motor parkinsoniano.
As drogas antiglutamatérgicas, que também são usadas para tratar de-
mência, poderiam ser úteis no tratamento das alterações cognitivas da DP.
Um dos pontos cruciais desse tema é a discussão sobre os métodos e
critérios utilizados para diagnosticar a DDP. A maioria dos estudos até
aqui utilizou os critérios de diagnóstico do DSM-IV para demência por
outra condição médica geral. Além de preencher os critérios de diagnósti-
co, muitos autores ainda exigiam que o paciente apresentasse desempenho
anormal num teste cognitivo global simplicado como o mini-exame do
estado mental (MEEM) para denirem o diagnóstico. Recentemente foi
publicado por um grupo de especialistas, critérios especícos para o diag-
nóstico da DDP . Infelizmente, tanto os critérios do DSM-IV, quanto os
recentemente propostos não foram denitivamente validados.
Nessas condições, em que é evidente a urgência para denir formas e-
cazes de tratamento para a DDP, realizamos uma análise sistemática da li-
teratura recente baseada na seguinte pergunta:
EXISTEM ESTUDOS SOBRE MÉTODOS FARMACOLÓGIC O S
E NÃO-FARMACOLÓGICOS UTILIZADOS PARA TRATAR A
DEMÊNCIA NA DP?
Para responder a essa questão zemos uma pesquisa na base de dados “ME-
DLINE”, utilizando os termos: Parkinson”, “dementia”, treatment”, e ava-
liamos os estudos publicados entre os anos de 2000 e março de 2010. Foram
encontrados na pesquisa inicial 1221 artigos. Denimos como objetivo prin-
cipal procurar por qualquer estudo clínico realizado em pacientes com DDP
que tivesse testado qualquer tipo de intervenção para tratar os problemas
cognitivos desses pacientes. Numa análise inicial de todos os títulos desses es-
tudos, selecionamos 133 para analisarmos seus resumos. Dessa segunda ava-
liação, selecionamos 45 artigos para serem lidos na íntegra, já que pudemos
excluir aqueles que não eram certamente intervenções terapêuticas através
do resumo. Desses 45 artigos analisados individualmente, havia 21 artigos
que eram estudos de intervenção para tratar demência em pacientes com DP.
Desses 21 artigos havia:
t 6 estudos que utilizaram donepezil, sendo que em um deles alguns
pacientes foram tratados com tacrina.
t 2 estudos que utilizaram galantamina.
Doença de Parkinson – Recomendações 79
t 10 estudos que utilizaram rivastigmina, sendo que em um deles al-
guns pacientes foram tratados com donepezil.
t 3 estudos que utilizaram memantina.
Não foi encontrado nenhum estudo clínico sobre intervenções não-far-
macológicas para tratar demência em pacientes com DP.
O próximo passo foi dividir esses 21 artigos1-21 entre os seis participan-
tes do grupo que foram designados para analisar esse tema. Cada artigo
foi lido por pelo menos dois especialistas e todos eles foram analisados e
classicados segundo as recomendações da Academia Americana de Neu-
rologia em uma reunião nal com a presença de todos. A classicação foi
denida por consenso e unanimidade entre os especialistas. Os resultados
estão descritos abaixo.
ESSAS DROGAS SÃO EFICAZES E SEGURAS PARA
TRATAR A DEMÊNCIA NOS PACIENTES COM DP?
Estudos com donepezil
t Dos sete estudos que utilizaram o donepezil, um estudo foi classi-
cado como Classe I e seis estudos como Classe IV.
t O estudo de Ravina et al.2, que foi classicado como Classe I, con-
siste em ensaio clínico cruzado, duplo-cego, randomizado e con-
trolado com placebo, que incluiu 22 pacientes, e que utilizou uma
dose diária de 5-10 mg de Donepezil para tratar os pacientes por
10 semanas. O desfecho primário do estudo era a escala cognitiva
Alzheimers disease Assessment Scale Cognitive Subscale (ADAScog).
Vários outros desfechos foram avaliados. Como resultado, não foi
observada melhora na escala ADAScog, porém houve signicativa
melhora no escore do MEEM e numa escala de impressão clínica
global subjetiva (Clinical Global Impression of Change, CGIC).
t 3/4 dos estudos classicados como Classe IV que também usaram
o MEEM como desfecho cognitivo também mostraram benefício
signicativo do tratamento.
t Nesses sete estudos os efeitos colaterais da droga foram em geral le-
ves, mas mais frequentes que nos grupos que tomaram placebo. En-
tretanto, ocorreram raros casos com eventos adversos graves que não
puderam ser claramente associados ao medicamento em questão.
t A maioria dos estudos não mostrou melhora nos sintomas compor-
tamentais, nem piora nos sintomas motores parkinsonianos
Conclusão: Nível de evidência U, os dados são insucientes para denir
se o donepezil é eciente para tratar a demência na DP.
80 Doença de Parkinson – Recomendações
Nota: Embora exista um estudo Classe I que mostrou melhora no esco-
re do MEEM, esse não era o teste escolhido como desfecho primário, por
isso o resultado nal do estudo foi classicado como inconclusivo.
Estudos com galantamina
t Os dois estudos que utilizaram a galantamina foram classicados
como Classe IV.
t Os efeitos colaterais foram em geral leves, mas houve relato de
eventos adversos graves, porém sem comprovada relação com o uso
da droga em questão.
t Os pacientes tratados não apresentaram piora dos sintomas motores
parkinsonianos
Conclusão: Nível de evidência U: os dados são insucientes para denir
se a galantamina é eciente para tratar a demência na DP.
Estudos com rivastigmina
t Dos 10 estudos que utilizaram a rivastigmina: 5 eram sub-análises
de um dos estudos principais e foram excluídos da análise nal, 1 foi
classicado como Classe II, 1 como Classe III e 3 como Classe IV .
t O estudo de Emre et al.11, que foi classicado como Classe II, é um
estudo randomizado, duplo-cego e controlado por placebo, que in-
cluiu 541 pacientes divididos numa proporção de 2:1 para os trata-
mentos com rivastigmina e placebo respectivamente. A dose média
da medicação foi de 9 mg/dia, o tratamento perdurou por 24 sema-
nas, e os desfechos primários foram: a escala cognitiva ADAScog,
e a escala de impressão geral: Alzheimer’s Disease Cooperative Study
- Clinicians Global Impression of Change (ADCS-CGIC)
t Como resultado, houve melhora signicativa no desempenho dos
pacientes tratados com a droga na escala ADAS-cog, na ADCS-
CGIC, no MEEM, nos testes de uência verbal e de atenção e no
teste do desenho do relógio. Também houve melhora nos escores de
uma escala de sintomas comportamentais (Inventário Neuropsiqui-
átrico) e numa escala de atividades da vida diária (Alzheimer’s Disea-
se Cooperative Study - Activities of Daily Living scale, ADCS-ADL)
t Esse estudo não foi classicado como Classe I porque o mero de
pacientes que saiu do estudo foi superior a 20%, o que compromete
a sua qualidade.
t Os demais estudos avaliados mostraram resultados convergentes aos
desse estudo melhor classicado.
Doença de Parkinson – Recomendações 81
t Nesses estudos os efeitos colaterais da droga foram em geral leves,
mas mais frequentes que nos grupos que tomaram placebo. Entre-
tanto, ocorreram raros casos com eventos adversos graves que não
puderam ser claramente associados ao medicamento em questão.
t A maioria dos estudos não mostrou piora nos sintomas motores
parkinsonianos.
Conclusão: Nível de evidência C: a droga é possivelmente efetiva para
tratar demência em pacientes com DP.
Estudos com memantina
t Dos 3 estudos que utilizaram a memantina, 1 estudo foi classicado
como Classe II, 1 estudo como Classe III e 1 estudo como Classe IV .
t O estudo de Aarsland et al.16, que foi classicado como Classe II, é
um estudo randomizado, duplo-cego e controlado por placebo, que
incluiu 40 pacientes, que foram tratados com placebo ou memantina
(20 mg/dia) por um período de 24 semanas. O desfecho primário era
uma escala de impressão geral de mudança (CGIC). Como resultado,
houve melhora signicativa segundo a escala CGIC, além de ocor-
rer melhora também no MEEM e no AQT. Não houve melhora nos
sintomas comportamentais (Inventário Neuropsiquiátrico), numa
escala de atividades da vida diária e no quick test of cognitive speed .
t Nesse estudo, o número incluído de 40 pacientes com DDP foi
considerado como representativo, por isso a classicação do estudo
como Classe II.
t Os outros dois estudos não mostraram melhora global na cognição,
mas um deles mostrou melhora signicativa em um teste de funções
frontais (Frontal Assessment Battery, FAB)
t Os eventos adversos nesses estudos foram mínimos e leves
t Não houve relato de piora dos sintomas motores parkinsonianos
Conclusão: Nível de evidência C, a droga é possivelmente efetiva para
tratar demência em pacientes com DP.
Conclusões: evidências de que a rivastigmina seja possivelmente efe-
tiva no tratamento da DDP (Nível C). Há evidências de que a memantina
seja possivelmente efetiva no tratamento da DDP (Nível C). Não evi-
dências sucientes para apoiar ou refutar o uso do donepezil no tratamen-
to da DDP. Entretanto, algumas evidências apontam para a existência de
um possível efeito benéco sobre os sintomas cognitivos dos pacientes com
DDP (Nível U). Não há evidências sucientes para apoiar ou refutar o uso
da galantamina no tratamento da DDP (Nível U).
82 Doença de Parkinson – Recomendações
Recomendações: [1] É importante que o diagnóstico de demência seja
claramente estabelecido antes que se proponha qualquer tratamento es-
pecíco para o problema. Nesse momento, podem ser utilizados para isso
tanto os critérios de demência por outra condição médica geral do DSM-IV
e a performance anormal no MEEM, ou os critérios e o uxograma de
diagnóstico propostos pelo grupo de especialistas da Movement Disorders
Society. [2] A performance anormal no MEEM e outros testes cognitivos
deve seguir os valores normais aceitos para a população brasileira e adapta-
dos para a idade e nível educacional do paciente. [3] Talvez o ponto mais
crítico para a denição da DDP seja estabelecer a ocorrência de perda fun-
cional secundária à perda cognitiva, e diferenciar daquela produzida pelos
outros sintomas da doença. Como não existe ainda um instrumento váli-
do para isso na literatura corrente, recomenda-se que a denição de perda
funcional decorrente de perda cognitiva seja feita pela impressão do exa-
minador, após extensa entrevista sobre o assunto. É recomendável que essa
denição seja consensual entre pelo menos dois examinadores diferentes,
sendo que um deles pode ser outro prossional não-médico com atividade
prossional na área, como o terapeuta ocupacional ou o neuropsicólogo.
[4] O diagnóstico da DDP exige que o quadro cognitivo tenha se inicia-
do após pelo menos um ano de aparecimento dos sintomas motores. Caso
contrário o diagnóstico mais provável será o de demência com corpos de
Lewy difusos. [5] O diagnóstico de DP segundo critérios especícos é fun-
damental e antecede o diagnóstico de DDP. É recomendado para isso o uso
dos critérios de diagnóstico da DP segundo o banco de cérebros de Lon-
dres. [6] Da mesma forma como ocorre durante o tratamento farmacológi-
co das outras demências, a melhora cognitiva observada na DDP, segundo
os resultados dos estudos acima, é também discreta. É recomendável que
a resposta terapêutica seja continuamente monitorada através do desem-
penho em testes cognitivos especícos e de avaliações do desempenho em
atividades da vida cotidiana, para justicar o uso da medicação. [7] Não
existem ainda estudos que estabeleçam denitivamente a duração da e-
cia do tratamento da DDP em longo prazo (>6 meses)
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84 Doença de Parkinson – Recomendações
Tratamento dos distúrbios
do sono da doença de
Parkinson
COORDENAÇÃO
Geraldo Nunes Vieira Rizzo e Hélio Afonso Ghizoni Teive
COMPOSIÇÃO
Renato Puppi Munhoz, Nasser Allam
Wagner de Góes Horta, Sarah Teixeira Camargos
Doença de Parkinson – Recomendações 87
Tratamento dos distúrbios do sono
da doença de Parkinson
COORDENADORES
Geraldo Nunes Vieira Rizzo
Hélio Afonso Ghizoni Teive
COMPOSIÇÃO
Renato Puppi Munhoz
Nasser Allam
Wagner de Góes Horta
Sarah Teixeira Camargos
INTRODUÇÃO
Embora frequentemente abafados pelas manifestações motoras da doença
de Parkinson (DP), os problemas de sono têm se tornado cada vez mais
estudados e sendo reconhecidos como um assunto clinico importante para
melhor entender a siopatologia dessa doença neurodegenerativa. A im-
portância desse capitulo se deve ao fato de que os distúrbios de sono são
tratáveis e, se não o forem, podem ter um efeito adverso signicante na
qualidade de vida desses pacientes sendo causa frequente de hospitalização
e institucionalização, aumentando o custo do cuidado em 4 vezes1-5.
INSÔNIA
Quais tratamentos são efetivos para a insônia na DP? A insônia é o distúrbio
do sono mais comum na DP ocorrendo entre 60 a 83% dos pacientes com
um impacto signicativo sobre sua qualidade de vida, semelhante ao cau-
sado pela gravidade da doença e depressão6. Este sintoma pode ser dividido
em inicial, de manutenção ou terminal7. Apesar de todas estas formas ocor-
rerem na DP, a insônia inicial ocorre com a mesma frequência que em in-
diduos sauveis pareados por idade. A diculdade de manuteão, com
fragmentação do sono, por outro lado, ocorre em 74 a 88% dos casos de
insônia na DP8.
A insônia na DP tem origem multifatorial relacionada com a idade,
o processo patológico ou secundária a fatores associados com a DP como
distonia dolorosa em o, câimbras, re-emergência de sintomas de parkin-
sonismo noturno, distúrbios do humor, psicose, apneia do sono, noctúria,
88 Doença de Parkinson – Recomendações
higiene do sono, distúrbios motores (síndrome das pernas inquietas,
movimento periódico de extremidades, distúrbio comportamental de sono
REM) e efeito de drogas usadas no tratamento de sintomas motores6,8.
Dentre os sintomas motores que re-emergem ou não são completamente
suprimidos durante o sono, o tremor é comum durante o sono não REM,
geralmente de forma subclínica detectável com eletromiograa9. Rigidez e
bradicinesia tipicamente ocorrem relacionadas ao período o, restringindo
a mobilidade adequada4.
Os fatores de risco mais consistentemente descritos incluem dose total
diária de levodopa, duração da terapia dopaminérgica e da DP, grau de in-
capacitação e estadiamento, depressão e sexo feminino6,7,9,10.
O tratamento inclui adequação do tratamento farmacológico usado
para os sintomas motores, por exemplo, substituição de selegilina, amanta-
dina ou outra droga potencialmente causadora de insônia11.
Dois estudos Classe I avaliaram a ecácia de levodopa/carbidopa de li-
beração lenta na qualidade do sono na DP. O primeiro avaliou a ecácia
de uma tomada de levodopa/carbidopa 200/50 mg ao deitar vs. 100/25
mg ao deitar mais a mesma dosagem as 3:00 h vs. placebo em 11 pacien-
tes com DP usando uma escala visual analógica de qualidade da noite de
sono, a medida objetiva da movimentação dos membros e avaliação mati-
nal de movimentação funcional. O estudo avaliou cada grupo por 4 noites
e encontrou escores signicativamente melhores nos 2 grupos que usaram
a droga ativa12. O segundo foi um estudo duplo cego usando dose notur-
na única de levodopa/carbidopa, não demonstrando ecácia em relação ao
número de despertares, latência e satisfação geral como o sono, apesar de
reduzir o escore de acinesia noturna e melhorar a duração do sono13. Roti-
gotina e outros agonistas dopaminérgicos de duração mais prolongada têm
o potencial de produzir o mesmo efeito, porém não foram ainda estudados.
Um estudo Classe I comparou melatonina 5 e 50 mg com placebo por 10
semanas mostrando um benefício modesto da dose maior em relação a du-
ração total do sono (aumento de 3% na duração do sono). Porém, ambos
os grupos que receberam a substância ativa demonstraram uma melhora
subjetiva importante14. Outro estudo Classe I demonstrou que melatoni-
na 3 mg melhorou a qualidade subjetiva, mas não objetiva do sono usan-
do parâmetros polissonogracos15. Benzodiazepínicos como clonazepam,
midazolam e lorazepam são ecazes para o tratamento de curto prazo em
casos com aumento da latência ou de redução da duração total do sono.
Por outro lado, esta classe de drogas está também relacionada com maior
risco de quedas e fraturas em idosos, bem como piora cognitiva e tolerân-
Doença de Parkinson – Recomendações 89
cia11. O hipnótico não diazepínico zolpidem tem um potencial menor des-
tas complicações. Os antidepressivos sedantes, em especial a trazodona, são
comumente usados, porém tem ecácia questionável11. Anti-histamínicos
são usados ocasionalmente com ecácia variável. Tanto os antidepressivos
quanto anti-histamínicos têm o potencial de apresentarem efeitos anticoli-
nérgicos causando ou agravando constipação e décits cognitivos.
Apesar de não terem sido estudados em casos especícos de insônia,
antipsicóticos atípicos como quetiapina e clozapina podem beneciar pa-
cientes com disfunção cognitiva, psicose e sonhos vívidos. Estas drogas são
geralmente ecazes e bem toleradas em doses baixas. Três estudos Classe
III usando polissonograa em pacientes submetidos à estimulação cerebral
profunda demonstraram uma melhora signicativa da qualidade do sono,
incluindo aumento da duração do sono, redução do número de despertares
e da ecácia total do sono16. Finalmente, existe um relato de caso de me-
lhora do padrão de sono com uso de infusão subcutânea de apomorna17.
Conclusão: Dose noturna de levodopa/carbidopa pode ser útil em pa-
cientes cuja insônia está relacionada a distúrbios motores como acinesia
e tremor, mas não dados subjetivos ou objetivos (PSG) demonstrando
melhora do sono. Benzodiazepínicos, especialmente zopiclone e zolpidem,
por períodos curtos são ecazes, mas devem ser evitados em pacientes com
cits cognitivos e instabilidade postural signicativos, bem como em pa-
cientes com distúrbios respiratório do sono. Melatonina tem ecácia sub-
jetiva, não conrmada objetivamente usando parâmetros polissonográcos.
Como a droga o é comercializada em nosso meio sugerimos o uso de
agomelatina.
SONOLÊNCIA DIURNA EXCESSIVA
Quais tratamentos são efetivos para sonolência diurna excessiva? Sonolência
diurna excessiva (SDE) é denida como uma tendência indesejável de co-
chilar ou adormecer em varias circunstâncias que interferem com a vida
familiar, prossional e social. Em razão do grande risco de acidentes para
motoristas o nível de sonolência diurna deve ser regularmente vericado
em pacientes com DP, especialmente quando o tratamento dopaminérgico
está sendo mudado. A sonolência pode ser facilmente avaliada com escala
de Epworth18 e a versão brasileira da escala de sonolência de distúrbios de
sono em DP19.
Pacientes com DP têm comumente distúrbios do sono que acabam
por interferir na sua qualidade de vida e muitas vezes são negligenciados.
A sonolência diurna excessiva afeta aproximadamente 33% dos pacientes
90 Doença de Parkinson – Recomendações
com DP e de 1 a 4% dos pacientes m também ataques abruptos de sono.
Desses últimos, 33 a 41% entram diretamente em sono REM durante a
monitorização com testes de latência múltiplas do sono. Um terço desses
pacientes não tem consciência de que dormiram. Alucinações visuais po-
dem coincidir com episódios de sono REM assim como as alucinações hip-
nagógicas da narcolepsia20.
As causas são multifatoriais, e incluem a degeneração de centros cor-
ticais do sono assim como medicações usadas para o controle de sintomas
motores21 e desordem do sono noturno com privação do sono (pernas in-
quietas distonia dolorosa e acinesia)22.
Tal qual o distúrbio comportamental do sono REM, SDE pode ser um
sintoma inicial na doença, reetindo as áreas anatômicas que primariamen-
te sofrem degeneração23. A SDE foi pesquisada no estudo de envelheci-
mento de Honolulu Ásia com 3078 homens de 71 a 93 anos entre 1991 e
1993. Nenhum paciente era portador de DP ou demência no início do es-
tudo. O risco de desenvolvimento de DP foi três vezes maior em pacientes
com SDE. Suspeita-se que haja perda de neurônios noradrenérgicos no loc-
cus cerúleo, serotoninérgicos no núcleo dorsal da rafe, acetilcolinérgicos em
neurônios basais e hipocretinérgicos em hipotálamo. Alem desses, indí-
cios de que o fórnix sofra uma maior degeneração em pacientes com SDE24.
Num estudo polissonográco seguido de teste das latências múltiplas do
sono em 47 pacientes com DP, 50% dos pacientes relataram SDE. O grupo
de pacientes com DP teve uma menor eciência do sono, aumento de está-
gio 2 e redução de sono REM. Dados clínicos e de arquitetura do sono fo-
ram semelhantes em pacientes com e sem SDE. Os pacientes em uso de clo-
nazepam tiveram menos SDE com menor movimento periódico das pernas.
Não houve correlação de dados clínicos, depressão, Mini Mental e SDE25.
Um total de 420 pacientes com DP foram avaliados num estudo em re-
lação a eventos noturnos e SDE. Essa última correlacionou-se com a idade,
a dose de agonista dopaminérgico e o grau de severidade da doença. A fre-
quência de SDE nos pacientes com DP foi superior a eventos noturnos e
não se correlacionou com dados demográcos ou outras variáveis clínicas26.
Um outro estudo conduzido na França com 1625 pacientes parkinsonianos
sem demência mostrou que 29% dos pacientes apresentavam SDE (escala
de sonolência de Epworth 10). Apenas 0,8% dos pacientes declararam
alta chance de dormir enquanto dirigiam e 0,5% dos pacientes informaram
ataques súbitos e imprevisíveis de sono durante a direção. Os fatores de ris-
co para SDE foram o sexo masculino, a diminuição do escore de atividades
de vida diária e altas doses de levodopa. Os fatores de risco para os ataques
Doença de Parkinson – Recomendações 91
abruptos de sono foram o sexo masculino, escala de sonolência de Epworth
maior que 10 e baixos escores de Hoehn e Yahr27. Em um estudo de 2006
foi demonstrado que ataques de sono são relativamente comuns em DP
(27%), principalmente em tarefas que exijam atenção e são também rela-
cionados ao tempo de uso de levodopa28. Outro estudo avaliou 232 pacien-
tes com DP prospectivamente em relação a SDE, depressão e transtorno
cognitivo após 4 e 8 anos. SDE aumentou prospectivamente de 5,6% para
22,5% e 40,8%. Na maioria dos pacientes SDE foi sintoma persistente e
relacionado à idade, uso de agonistas dopaminérgicos e estadiamento de
Hoehn Yahr.29 Sonolência diurna excessiva foi recentemente estudada em
pacientes com DP com e sem demência e a escala de sonolência de Epwor-
th foi signicativamente maior em pacientes com demência30.
O tratamento deveria iniciar com o aconselhamento quanto à direção
de veículos, avaliação de distúrbios noturnos de sono (polissonograa e
teste das latências múltiplas de sono) e dos possíveis paraefeitos dos medi-
camentos. A primeira tentativa deverá se basear no remanejo de drogas po-
tencialmente sedativas preferencialmente sem comprometer o quadro mo-
tor do pacientes. Caso isso seja inecaz outra tentativa seria introduzir um
estimulante durante o dia. A modanila foi testada por 37 pacientes com
DP e SDE mensurada pela escala de sonolência de Epworth na dose de
200-400 mg ao dia. A medicação falhou em melhorar a SDE em 2/3 dos
pacientes31. Segundo as orientações da Academia Americana de Neurologia
a modanila pode melhorar apenas subjetivamente a SDE (A), mas não o
suciente para estabelecer a segurança em atividades de risco como, por
exemplo, dirigir (U)32. Um estudo com oxibato de sódio em 27 pacientes
com DP melhorou a SDE medida pela escala de sonolência de Epworth
(média de 7), a qualidade do sono medida pela escala de qualidade de sono
de Pittsburgh, a fadiga medida pela escala de gravidade de fadiga e também
a o tempo de sono de ondas lentas que dobrou33. Entretanto, o oxibato é
também um depressor do sistema nervoso central e pode causar (princi-
palmente junto com álcool) estados confusionais. Existem poucos estudos
mensurando a ecácia do metilfenidato em pacientes com DP e SDE. Em
um estudo com 17 pacientes ele melhorou a apatia, cognição, marcha e a
escala de sonolência de Epworth34.
Drogas que bloqueiam a recaptação de histamina (anti-H3) têm sido
testadas em pacientes com DP com bons resultados, mas ainda insucientes
para recomendação prática. Pacientes submetidos à estimulação cerebral pro-
funda em núcleo subtalâmico, foram avaliados em relação a SDE prospec-
tivamente em um período de 24 meses. A estimulação bilateral aumentou o
92 Doença de Parkinson – Recomendações
tempo de sono total, reduziu problemas do sono e distonia da manhã (efei-
tos relacionados à bradicinesia). Apesar da redução signicativa de medica-
ções, a estimulação cerebral profunda nessa localização não reduziu a SDE35.
A estimulação do núcleo pedúnculo-pontino pode ter efeito sedativo
ou estimulante, dependendo da frequência da estimulação: em dois pacien-
tes submetidos à estimulação devido a problemas relacionados com a mar-
cha, foi observado que a baixa frequência aumenta tanto o estado de alerta
durante o dia quanto o tempo de sono REM noturno; já a alta frequência
induz à sedação e ao sono imediato36.
Conclusão: Uma vez afastados os medicamentos sedativos e excluída
privação crônica de sono ou apneia de sono, o uso de modanila é efetivo
segundo a opinião dos pacientes (2 estudos Classe I) mas não efetivo do
ponto de vista polissonográco (2 estudos Classe I)
PARASSONIAS
Quais tratamentos são efetivos para parassonias? Não há estudos controlados
para o tratamento de sonambulismo, terror noturno, pesadelos, sonilóquio
e outras parassonias, mas normalmente a droga mais utilizada é o benzo-
diazepínico clonazepam.
APNEIA OBSTRUTIVA DO SONO
Quais tratamentos são efetivos para apneia obstrutiva do sono? O tratamento
mais efetivo é o uso de aparelho de pressão aérea continua positiva (CPAP),
porém não há estudos controlados na DP.
NDROME DAS PERNAS INQUIETAS E
MOVIMENTO PERIÓDICO DE EXTREMIDADES
Quais tratamentos são efetivos para Síndrome das Pernas Inquietas e Movi-
mento Periódico de Extremidades? Síndrome das pernas inquietas é diagnos-
ticada clinicamente de acordo com os quatro critérios essenciais denidos
pelo Grupo de Estudos Internacionais da Síndrome das Pernas Inquietas
(IRLSSG)37.
t Necessidade imperiosa de movimentar as pernas, geralmente acom-
panhada ou associadas à sensações desagradáveis.
t Os sintomas começam ou pioram durante o repouso.
t Os sintomas são parcialmente ou totalmente aliviados pelo movi-
mento pelo menos durante o tempo da atividade.
t Os sintomas são piores no nal do dia ou a noite do que durante o
dia, ou só ocorrem a noite.
Doença de Parkinson – Recomendações 93
Síndrome das Pernas Inquietas (SPI) e Movimentos Periódicos de Ex-
tremidades (MPE) podem causar distúrbios de sono em DP e têm sido re-
latados com prevalência aumentada em alguns, mas não em todos os estu-
dos em DP38.
Discute-se muito ainda a importância do achado de MPE na polisso-
nograa e a necessidade ou não de tratar especìcamente esse transtorno39.
Um estudo encontrou uma correlação entre perda celular dopaminérgica e
o número de MPEs num grupo de pacientes com DP usando SPECT e ava-
liando a ligação estriatal com radiofármaco40. Embora as observações de que
SPI seja uma doença de deciência dopaminérgica está claro que SPI difere
patologicamente de DP e envolve vias dopaminérgicas outras que não a via
nigroestriatal da DP38. A siopatologia da SPI em DP apresenta um dilema:
SPI poderia corresponder a um cit de estimulação da dopamina à noite
(o individuo se beneciaria de uma dose adicional noturna de um agonista
dopaminérgico) ou corresponderia a um excesso de estimulação dopaminér-
gica durante o dia com pernas inquietas de rebote durante à noite, uma
condição chamada aumentação (nesse caso o individuo se beneciaria da
diminuição da dose diária de dopamina). A ocorrência de SPI anos após (e
não antes) do início de parkinsonismo favorece esta ultima hipótese.
Não há critérios estabelecidos para o diagnóstico de SPI em DP. É possí-
vel que o próprio tratamento da DP interra na manifestação clinica da SPI
nestes pacientes. Agentes dopaminérgicos (levodopa, pramipexol, cabergo-
lina, ropinirol, rotigotina) o usados no avio dos sintomas de DP, SPI e
MPE41,42. Outras drogas úteis em SPI e/ou MPE incluem clonazepam, ga-
bapentina e opioides mas esses últimos podem desencadear confusão notur-
na43 e por isso não são usados em DP com SPI. Pacientes submetidos a DBS
com doses dos medicamentos após cirurgia, desenvolvem mais SPI e MPE44.
Em dois estudos Classe III, pacientes com DP e SPI foram tratados
com cabergolina e houve melhora sintomática45,46. Entretanto são raros os
estudos de tratamento de SPI e MPE em DP.
Conclusão: Apesar de não haver estudos controlados, as drogas recomen-
dadas para tratamento de SPI e MPE em DP são o pramipexol e a levodopa.
Não nenhum estudo recomendando o uso de ferro, opioides (oxicodo-
na), clonazepam, gabapentina em doentes com DP. É necessário evitar dro-
gas como os antidepressivos que podem causar ou agravar esses distúrbios.
TRANSTORNO COMPORTAMENTAL DO SONO REM
Qual o tratamento efetivo para o Transtorno Comportamental do Sono REM
(TCSREM) em DP? Transtorno Comportamental do Sono REM (TCS-
94 Doença de Parkinson – Recomendações
REM) é um distúrbio de sono caracterizado pela ocorrência de atividade
muscular durante a fase REM com ocorrência de sonhos vívidos47. Achados
polissonográcos incluem tônus muscular excessivo no queixo e movimen-
tos de perna durante o sono REM. TCSREM idiopático é caracterizado
pela perda da atonia normal que acompanha o sono de movimentos rápi-
dos dos olhos. Consequentemente, pacientes podem falar, gesticular, bater
ou chutar em associação com conteúdos dos sonhos. Aproximadamente 80
a 90% dos pacientes são masculinos e a razão para essa grande diferença
sexual não é clara. Comportamentos complexos, vigorosos e algumas vezes
violentos podem ocorrer. Pacientes e parceiros de cama costumam apre-
sentar equimoses, lacerações, fraturas e deslocamentos como resultado dos
comportamentos anormais48-50.
Sono REM sem atonia (RSA) tem sido descrito como uma entidade
aparte e consiste na ativação muscular anormal durante o sono REM sem
as manifestações comportamentais51. TCSREM ou RSA estão presentes em
25 a 50% de pacientes com DP51. TCSREM pode preceder o início dos
sintomas clínicos de parkinsonismo em muitos anos52.
Na atroa de múltiplos sistemas e demência de Corpos de Lewy os sin-
tomas de TCSREM são mais propensos a preceder outras manifestações da
doença, e ocorre em idades mais precoces quem em DP sugerindo que as al-
terações patológicas mais extensas nessas doenças possam envolver áreas de
tronco cerebral controlando o sono REM mais precocemente na doença53.
Não estudos controlados para o tratamento de TCSREM e, em
muitos pacientes, a intervenção farmacológica pode não ser necessária no
caso de sintomas leves ou intermitentes. Nos casos em que o comporta-
mento é mais violento, pequenas doses de clonazepam tais como 0,25mg
são capazes de reduzir os episódios de TCSREM ou eliminá-los e prevenir
os acidentes54,55.
Donezepil parece melhorar TCSREM56 assim como a melatonina57 e
o pramipexol58,59. Deve-se evitar o uso de anti-depressivos serotonérgicos
que aumentam o risco de TCSREM60. Nenhuma dessas drogas, entretanto,
aparece em estudos baseados em evidência.
Conclusão: Clonazepam é a droga de eleição em TCSREM em pacientes
com DP, exceto caso sejam também portadores de Síndrome das Apneias
Obstrutivas do Sono. Nesse caso, o pramipexol está indicado. A agomelati-
na também pode ser tentada.
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98 Doença de Parkinson – Recomendações
Tratamento das
disautonomias na
doença de Parkinson
COORDENAÇÃO
Elizabeth M.A. Barasnevicius Quagliato e
Ailton de Souza Melo
COMPOSIÇÃO
André Carvalho Felício, Arlete Hilbig,
João Carlos Papaterra Limongi, Mariana Spitz
Doença de Parkinson – Recomendações 101
Tratamento das disautonomias
na doença de Parkinson
COORDENADORES
Elizabeth M.A. Barasnevicius Quagliato
Ailton de Souza Melo
COMPOSIÇÃO
André Carvalho Felício
Arlete Hilbig
João Carlos Papaterra Limongi
Mariana Spitz
INTRODUÇÃO
Apesar de facilmente reconhecíveis, as manifestações clínicas clássicas da
doença de Parkinson (DP) traduzem um processo degenerativo de alguns
anos. O envolvimento de áreas externas ao sistema dopaminérgico nigroes-
triatal, aliado ao envolvimento do sistema nervoso autonômico periférico são
responsáveis por múltiplos sinais e sintomas não-motores da doença, alguns
dos quais podem preceder em anos os sintomas motores1,2. As manifestações
autonômicas da DP são disfagia, disfunções cardiovasculares, urogenital,
termorregulatória, respiratória e gastrointestinal3. Estas manifestações podem
anteceder os sintomas motores, como foi relatado em estudos histológi-
cos por Braak et al.2 e ocorrem, com proporções diversas, em todas as fases
da doença4,5.
A degeneração inicial que ocorre na DP, precedendo os sintomas moto-
res em cerca de seis anos, inicia-se provavelmente no bulbo olfatório e nú-
cleo ambíguo, acometendo bras do IX e X nervos cranianos. Evidências
atuais mostram maior suscetibilidade dos neurônios situados nessas áreas
para a degeneração neurobrilar e a inclusão citoplasmática dos corpos de
Lewy, favorecendo o estresse oxidativo e a morte neuronal precoce e seleti-
va. A deagração desse processo, porém, ainda não está bem esclarecida6.
DISFA G IA
A deglutição é o fenômeno responsável por conduzir o bolo alimentar da
boca até o estômago, proteger e limpar as vias aéreas7. Quando inuen-
ciada por dano neurológico, mecânico ou psicogênico, a deglutição pode
102 Doença de Parkinson – Recomendações
comprometer a nutrição, a hidratação, as vias respiratórias, o prazer ali-
mentar e o convívio social do indivíduo8.
As alterações na fase oral da deglutição na DP envolvem a organização
e a ejeção do bolo alimentar para a orofaringe9 e são atribuídas às bradici-
nesias e rigidez10,11. Na fase faríngea, são comumente descritos a presença
de resíduos em valécula e recessos piriformes, o atraso no início da elevação
laríngea e os episódios de penetração e aspiração silentes11,12.
Através do exame de videouoroscopia, Nagaya et al.13 identicaram na
fase oral da deglutição: diculdades em controlar o bolo alimentar na cavida-
de oral, escape precoce, festinação lingual, deglutição fracionada e presença
de resíduos na cavidade oral após a deglutição. Na fase faríngea, foi constata-
da a presença de resíduos em valécula e recessos piriformes, bem como atra-
so no início da elevação laríngea, penetração laríngea e aspiração brônquica.
Como principais consequências da disfagia entre os portadores de DP,
citam-se as infecções de vias aéreas recorrentes, episódios de broncoaspira-
ção e maior frequência de broncopneumonias aspirativas10.
Todos os estudos que investigaram se a levodopa é superior a placebo
no tratamento da disfagia da DP não demonstraram qualquer evidência de
melhora com essa substância.
Quais são as técnicas para reabilitação da deglutição na DP? As técnicas para
reabilitação da disfagia orofaríngea são denidas como compensatórias ou
reabilitadoras14,15. A terapia compensatória não altera a siologia da degluti-
ção e inclui mudanças posturais, estímulos sensitivos, alteração do volume e
consistência do bolo alimentar. Os benefícios dessas técnicas são imediatos,
porém não resultam em alteração permanente para a deglutição do paciente.
Gage e Storey (2004)16 realizaram uma revisão sistemática sobre reabili-
tação na DP. Nos dois estudos encontrados, o efeito benéco da intervenção
foi demonstrado pelo relato subjetivo aliado ao uso de tecnologias como a
videouoroscopia e eletromiogramas. Em um dos estudos foram avaliados os
efeitos da técnica de Lee Silverman (LSVT) na deglutição e na voz de indiví-
duos com DP. Foram realizadas 16 sessões ao longo de quatro semanas com
o tempo de cada sessão variando entre 50 e 60 minutos. Os resultados com
relação à deglutição demonstraram melhora na mobilidade da língua e farin-
ge, diminuição do tempo de trânsito oral e melhora da eciência faríngea17.
SIALORREIA
As glândulas parótidas e submandibulares respondem cada uma delas por
45% deste volume, enquanto os 10% restantes são produzidos pelas glân-
Doença de Parkinson – Recomendações 103
dulas sublinguais e glândulas salivares menores18. As parótidas são glându-
las serosas e produzem uma saliva uida e aquosa, rica em ptialina, que
umedece a boca, dilui os alimentos para facilitar a mastigação e remove
partículas de alimentos da cavidade bucal. As submandibulares e sublin-
guais são glândulas mistas e produzem tanto saliva serosa como saliva mu-
cosa, uma secreção viscosa e espessa importante para a formação do bolo
alimentar e rica em mucina. Outras funções da saliva são a facilitação da
gustação, através da dissolução das substâncias alimentares, o início da di-
gestão de certos hidratos de carbono, o umedecimento da mucosa bucal e a
proteção dos dentes19,20.
A sialorreia ou o escape extraoral e não intencional de saliva pode re-
sultar tanto das alterações de sensibilidade, mobilidade e coordenação das
estruturas orofaciais responsáveis pela deglutição, como da produção au-
mentada da saliva, devido ao uso de medicamentos ou problemas dentários
e gástricos21,22. Medicamentos como tranquilizantes e colinesterásicos, que
aumentam direta ou indiretamente a atividade secretora da via parassim-
pática, além de enfermidades esofágicas obstrutivas e inamatórias, podem
resultar em hipersecreção salivar23. Outros fatores, como processos inama-
tórios da cavidade oral e dos dentes, alterações oclusais e ortodônticas, bem
como sequelas cirúrgicas de ressecções e reconstruções na região da cabeça
e pescoço, também contribuem para o aumento da produção de saliva21.
Entre os portadores de DP e outras enfermidades neurológicas, a sia-
lorreia é um sintoma comum e frequentemente atribuído à diminuição da
taxa de deglutição voluntária, fraqueza e incoordenação dos músculos fa-
ríngeos. Os cits cognitivos e as alterações posturais acentuam este pro-
blema. O comprometimento das habilidades necessárias para transportar a
saliva da boca até o estômago promove a estase, a sialorreia e o aumento do
risco de aspiração traqueal e de pneu monias22,24-27.
A sialorreia tem forte impacto negativo na qualidade de vida dos seus
portadores. Provoca problemas de higiene oral, com rachaduras e macera-
ção da região perioral, acompanhada de odor desagradável e umedecimen-
to de roupas e objetos. Motivos pelos quais cria barreiras para a educação
e a reabilitação dos pacientes, e termina por contribuir fortemente para es-
tigmatizar e isolar estes indivíduos21,22.
Quais são os tratamentos da sialorreia na DP? O tratamento da sialorreia
com medicamentos anticolinérgicos apresenta ecácia parcial e nem sem-
pre é bem tolerado, principalmente pelos idosos28-30. Como efeitos colate-
rais, são descritas, entre outros, alucinações, confusão mental, retenção uri-
104 Doença de Parkinson – Recomendações
nária e arritmia cardíaca29,30. Por sua vez, procedimentos cirúrgicos, como
transposição dos ductos excretores ou ressecção glandular, bem como o uso
de radiação local das glândulas salivares, são procedimentos invasivos oca-
sionalmente considerados e aceitos pelos pacientes18,28.
A partir de 1997, a aplicação de toxina botulínica (TB) nas glândulas
parótidas e submandibulares começou a ser descrita como um método ecaz
e seguro para o tratamento da sialorreia em pacientes adultos com enfermi-
dades neurológicas31,32. A ecácia da TB foi comprovada a partir da dimi-
nuição do uxo salivar e da redução da sialorreia em diferentes graus28,29,33,34.
E a segurança foi respaldada pela ausência de prejuízos em estruturas
nervosas e vasculares, e infecções em ductos e glândulas salivares28,29,35.
Os ensaios realizados no período de 1989 a 2006 são unânimes quanto
à segurança e à ecácia do uso de TB. No entanto, apesar de pesquisarem
o mesmo desfecho, a variedade de doses, métodos de avaliação e dados pu-
blicados prejudica a comparação dos resultados. Na maioria dos estudos, o
período de diminuição da sialorreia não foi avaliado de forma sistemática.
Também não há dados que demonstrem associação entre a dose de TB apli-
cada e as respostas obtidas na diminuição da saliva e na redução da sialor-
reia. Entre os estudos, apenas dois são duplos-cegos placebo-controlados,
um realizado com toxina botulínica tipo A e o outro com toxina tipo B34,36.
Há evidências para o tratamento da disfagia e da sialorreia na DP?
Conclusões
t Não existem evidências que demonstram melhora em qualquer fase
da deglutição do paciente com DP após uso de levodopa. Estudos:
Classe III. Nível de recomendação: C
t Ensaios clínicos abertos demonstram que exercícios faríngeos me-
lhoram a deglutição do paciente com DP. Estudos: Classe III. Nível
de recomendação: C.
t As drogas anticolinérgicas diminuem o volume de saliva em pacien-
tes com DP. Estudos: Classe III. Nível de recomendação: C.
t Apesar de não existirem estudos randomizados para determinar se
a TB é superior a placebo no tratamento da sialorreia da DP, não
existem dúvidas sobre sua capacidade de diminuir o volume da sali-
va nos pacientes com DP, sem, entretanto, diminuir a frequência de
salivação. Estudos: Classe II. Nível de recomendação: B.
t A toxina botulínica do tipo A não modica os parâmetros da deglu-
tição na DP. Estudos: Classe III. Nível de recomendação: C.
t Outros: radioterapia ou procedimentos cirúrgicos, como transpo-
Doença de Parkinson – Recomendações 105
sição dos ductos excretores ou ressecção glandular. Estudos: Classe
III. Nível de recomendação: C.
Contexto clínico: A boa prática clínica recomenda exercícios faríngeos
para melhorar a deglutição do paciente com DP. Embora não altere a fre-
quência da salivação, a toxina botulínica A melhora a sialorreia por dimi-
nuir o volume da saliva.
DISAUTONOMIA CARDIOVASCULAR
Quais tratamentos são ecazes para hipotensão ortostática? Disfunção autonô-
mica cardiovascular na DP é frequente e se manifesta principalmente por
hipotensão ortostática (HO). Hipertensão na posição supina, disfunção dos
reexos cardiovasculares e arritmias, além da própria terapêutica antiparkin-
soniana, frequentemente complicam o manejo da HO nestes pacientes37,38.
A prevalência varia em diferentes estudos de acordo com a metodologia
empregada, de 14%39 a 47%40 e HO sintomática foi evidenciada em 30%
de pacientes com DP patologicamente comprovada41.
Hipotensão ortostática é denida como redução sintomática ou não de
20 mmHg ou mais na pressão sistólica e de 10 mmHg ou mais na pres-
são diastólica dentro de 3 minutos em ortostatismo42. Jamnadas-Khoda et
al. (2009)47, estudando pacientes com DP, evidenciaram HO com maior
frequência após teste de inclinação do que em ortostatismo, embora os sin-
tomas se manifestem com maior frequência no último grupo. Além disso,
muitas vezes a HO ocorre em um período superior a 3 minutos (HO tar-
dia). Os autores sugerem que a avaliação de pacientes com DP deve incluir
medida da pressâo arterial antes e após inclinação de 60 graus, por em tor-
no de 5 minutos.
Em idosos, e em especial na população com DP, a hipotensão pós-pran-
dial e a hipertensão na posição supina, especialmente hipertensão sistólica
isolada, são situações frequentes43. A hipotensão pós-prandial, provavel-
mente por vasodilatação esplâncnica, é denida como uma queda de 20
mmHg na pressão sistólica, ocorrendo dentro de 2 h após as refeições43,44.
Os sintomas são relacionados à redução da pressão de perfusão quando o
paciente assume a posição ereta e incluem, tipicamente, sensação de cabeça
leve ou vazia, distúrbios visuais, pré-síncope e síncope por redução do uxo
sanguíneo encefálico. Ocasionalmente, a HO pode ser assintomática apesar
de níveis tensionais muito baixos, supostamente em função de vasodilata-
ção compensatória em alguns indivíduos45. Sintomas inespecícos como
fraqueza, desequilíbrio, letargia e fadiga são também comuns. Angina e oli-
gúria com falência renal podem ocorrer por hipoperfusão cardíaca e renal,
106 Doença de Parkinson – Recomendações
respectivamente. Dor na região suboccipital e ombros por baixa perfusão
dos músculos cervicais podem estar presentes. A HO também acrescenta
risco de quedas, com aumento de morbimortalidade associada à doença46,47.
A principal causa de disautonomia cardiovascular (CV) é o dano em
neurônios pós-ganglionares simpáticos, impedindo o funcionamento ade-
quado dos reexos cardiovasculares. Estudos histopatológicos demonstram
desnervação e presença de corpos e neuritos de Lewy no coração48. Lesão
neuronal em centros autonômicos também deve ser considerada e pode se
somar com o avanço da doença.
O tratamento compreende medidas farmacológicas e não-farmacológicas.
Tratamento não-farmacológico. Diferentes fatores podem desencadear
sintomas em pacientes com disautonomia CV e a informação correta com
adoção de medidas não-farmacológicas pode minimizar a necessidade de
tratamento farmacológico, especialmente em casos pouco sintomáticos.
Os pacientes devem ser orientados a evitarem mudança rápida de po-
sição, especialmente de deitado ou sentado para em e devem sempre
esperar alguns segundos nesta posição antes de começar a caminhar. Dor-
mir com cabeceira elevada em 20-30 graus também pode auxiliar, evitando
mudanças mais dramáticas de postura49. Sempre que os sintomas se inicia-
rem, a melhor estratégia é não permanecer em pé, procurando sentar ou
deitar até melhora sintomática42.
O esforço durante micção ou defecação pode resultar em manobra de
Valsalva com marcada redução da pressão sanguínea, precisando ser evita-
do com tratamento especíco.
Meias elásticas ou bandagens de compreso abdominal podem ajudar
a reduzir o volume de sangue venoso com melhora sintomática50,51.
Exposição a altas temperaturas, como banhos muito quentes ou sauna,
e exercícios físicos vigorosos devem ser evitados pela diculdade de regula-
ção dos reexos cardiovasculares, podendo desencadear sintomas.
Uma ingesta de água de 2 a 2,5 L, bem como aumento da ingesta de
sal (até 8 gramas/dia) está recomendada para assegurar uma hidratação
adequada42. É necessário cautela em recomendar estas medidas a pacientes
com insuciência cardíaca ou hipertensão supina associada a HO.
O manejo da hipotensão pós-prandial consiste em redução do volume
das refeições, redução dos carboidratos na dieta, evitar bebidas alcoólicas e
recomendar que pacientes quem sentados após refeições.
A utilização de medicamentos para comorbidades (especialmente dro-
gas vasodilatadoras e que causem bradicardia), assim como o tratamento
especíco da DP, pode piorar os sintomas resultando em hipotensão severa.
Doença de Parkinson – Recomendações 107
É fundamental uma revisão das medicações que estão sendo administradas.
Korchounov et al. (2004)38, estudaram um grupo de pacientes com DP
utilizando associação de drogas e concluíram que existe piora dos sintomas
cardiovasculares com qualquer das associações estudadas, se comparada ao
uso de levodopa em monoterapia. As drogas de maior impacto na função
CV foram selegilina e bromocriptina, enquanto amantadina e ropinirol ti-
veram menor efeito CV. Portanto, a função CV deve ser avaliada antes de
decidir qual droga será adicionada ao esquema terapêutico.
Tratamento farmacológico. O tratamento farmacológico tem como obje-
tivo expandir o volume vascular total ou reduzir o leito vascular que pode
sequestrar volume (veias e arteríolas).
1. Fludrocortisona: É um mineralocorticoide sintético com mínimos
efeitos glicocorticoides, que aumenta a reabsorção renal de sódio e expande
o volume plasmático. Também causa aumento da sensibilidade dos vasos
sanguíneos a catecolaminas, aumentando a resistência vascular42.
Não existem estudos Classe I e II. Um estudo Classe III em pacientes
com neuropatia diabética e outro em DP52-54 mostraram um aumento na
PA e melhora sintomática. Estudos pequenos, não controlados (Classe IV),
sugerem que ela previne sintomas relacionados à HO em DP43.
A dose inicial deve ser de 0,1 mg, aumentando progressivamente até
2,0 mg/dia, dependendo do controle dos sintomas. Deve haver cautela em
pacientes com albumina sérica baixa; altas doses podem causar sobrecarga
por retensão de líquidos e insuciência cardíaca congestiva. Alimentação
rica em potássio deve ser utilizada para prevenir hipocalemia. É recomen-
dado dormir com cabeceira elevada.
2. Desmopressina: Atua nos túbulos renais prevenindo poliúria notur-
na e aumentando a pressão pela manhã. Pode ser utilizada na forma de
spray nasal (10 a 40 µg) ou via oral (100 a 400 µg)55. Hiponatremia é um
efeito colateral potencial e deve ser monitorada.
3. Midodrina: Droga anti-hipotensiva mais utilizada nos EUA e Eu-
ropa para HO. É uma prodroga cujo principal metabólito ativo atua sobre
receptores adrenérgicos pós-sinápticos produzindo vasoconstrição em arte-
ríolas e veias, sem modicação da frequência cardíaca e sem cruzar a bar-
reira hematoencefálica. Um estudo multicêntrico, controlado por placebo,
randomizou um grupo heterogêneo de 171 pacientes com HO, incluindo
pacientes com DP, para receber 10 mg de midodrina, 3 vezes/dia ou place-
bo56. A midodrina foi signicativamente superior no controle dos sintomas
e na melhora da PA, especialmente sistólica. O uso concomitante de meias
compressivas ou udrocortisona não trouxe melhora adicional42,56.
108 Doença de Parkinson – Recomendações
É recomendada em monoterapia ou terapia combinada (com udrocor-
tisona, por exemplo). A dose inicial é de 2,5 mg/2-3 vezes/dia, aumentan-
do gradualmente até 10 mg/3 vezes/dia. A hipertensão supina é um efeito
adverso comum (25% casos) e pode ser severa. A última dose deve ser ad-
ministrada pelo menos 4 h antes de dormir e a PA deve ser monitorada. É
contraindicada em doença cardíaca severa, em pacientes com história de
AVC ou AITs, insuciência renal aguda, retensão urinária, feocromocito-
ma e tireotoxicose.
4. Di-hidroxi-fenil-serina (L-DOPS): É uma prodroga convertida pela
dopa-descarboxilase em noradrenalina. Estudo Classe I com grupo de pa-
cientes em hemodiálise demonstrou melhora dos sintomas. Em estudos
Classe III com pacientes com hipotensão ortostática neurogênica57, MAS e
PAF58-60, foi efetiva no controle dos sintomas. A ingestão concomitante de
inibidores da dopa-descarboxilase em altas doses (200 mg) inibe a resposta
pressórica da L-DOPS. Não está claro se as doses usuais utilizadas na DP,
combinadas com levodopa, causam o mesmo efeito61. Faltam estudos que
permitam uma recomendação sobre seu uso na DP até o momento.
5. Domperidona: É um antagonista periférico de receptor D2 e foi
sugerido como tratamento de HO por que receptores de dopamina pré-
sinápticos em terminais simpáticos também modulam a liberação de no-
radrenalina. Um estudo Classe III, com 17 pacientes com DP, comparou
domperidona com udrocortisona, demonstrando melhor resposta com
domperidona54.
Outros tratamentos sem evidência clara são utilizados para melhora
sintomática de HO: octreotide (25-50 µg); efedrina (15 mg/3 vezes/dia);
ioimbina (6 mg/dia); diidroergotamina (3 a 5 mg/dia); eritropoetina; in-
dometacina (75-150 mg/dia)37,42,44.
Conclusões: A udrocortisona é possivelmente efetiva no tratamento da
HO na DP (Nível C). Faltam estudos randomizados e controlados. Os da-
dos são insucientes para recomendar ou refutar o tratamento medicamen-
toso com domperidona, desmopressina ou octreotide, embora suas ações
farmacológicas sejam consistentes com melhora da HO (Nível U).
Contexto clínico: A boa prática clínica recomenda que todos os pacien-
tes sejam orientados sobre situações que potencialmente desencadeiam
sintomatologia e que medidas não-farmacológicas sejam adotadas. As
medicações potencialmente hipotensoras devem ser identicadas e, sem-
pre que possível, retiradas. É aconselhável a simplicação do tratamento
antiparkinsoniano buscando a monoterapia com levodopa. Drogas como
selegilina, bromocriptina e agonistas dopaminérgicos devem ser evitadas.
Doença de Parkinson – Recomendações 109
A avaliação criteriosa da PA para identicar hipertensão supina associada
à hipotensão ortostática deve ser realizada antes de iniciar e monitorada
durante o tratamento farmacológico. Existe evidência limitada que supor-
ta o tratamento medicamentoso da HO em DP. Os estudos disponíveis
em geral incluem pequenos grupos de pacientes com DP; estudos maiores
agrupam populações heterogêneas, limitando uma recomendação especí-
ca para DP. Das medicações disponíveis no Brasil, a udrocortisona é pos-
sivelmente efetiva para tratamento farmacológico da HO na DP (Nível C).
Não é possível recomendar ou refutar outras intervenções farmacológicas
com base nas evidências atuais (Nível U).
DISFUNÇÃO GASTROINTESTINAL
Quais são os tratamentos efetivos para disfunção gástrica? A disfunção gas-
trointestinal (DGI) na DP é muito comum, podendo preceder em muitos
anos o início dos sintomas motores62. Interfere signicativamente com a
qualidade de vida dos pacientes e suas principais manifestações clínicas en-
volvem todo o tubo digestivo (boca-ânus), levando a problemas dentários,
diminuição da produção de saliva, sialorreia, disfagia orofaríngea, disfagia
esofágica, dispepsia, constipação intestinal e perda de peso63,64. Eventual-
mente, complicações graves podem ocorrer, necessitando abordagem imedia-
ta, muitas vezes com intervenção cirúrgica. Exemplos de urgências gastroin-
testinais na DP são o megacólon, volvo de sigmoide e perfuração de alça
intestinal. Não se pode esquecer também que o próprio tratamento da DP é
responsável, em parte, por estas DGI. Os anticolinérgicos, por exemplo, le-
vam a constipação intestinal, enquanto a levodopa pode levar a dispepsia65.
Tratamento farmacológico. A estratégia para o tratamento baseia-se no
bloqueio de receptores dopaminérgicos gástricos, acelerando o esvaziamen-
to gástrico64,65.
1. Cloridrato metoclopramida e cisaprida: Estão contraindicados por-
que embora bloqueiem receptores dopaminérgicos gástricos, também al-
cançam o Sistema Nervoso Central via barreira hematoencefálica (BHE),
levando ao bloqueio de receptores dopaminérgicos estriatais e consequente
piora dos sintomas motores parkinsonianos (Classe IV).
2. Domperidona (comprimidos de 10 mg ou suspensão 1 mg/mL.
Dose máxima de 80 mg/dia): Ação semelhante à metoclopramida, porém
não atravessa a BHE, podendo ser usada com segurança (Classe IV).
3. Outros: Existem alternativas como os agonistas da motilina (eritro-
micina), pró-cinéticos outros como o betanecol, clonidina e como solução
nal marcapasso gástrico que ainda não foram estudados em DP.
110 Doença de Parkinson – Recomendações
Conclusões: Os dados ainda são insucientes para recomendação de tra-
tamento da disfunção gástrica, uma vez que não existem estudos especí-
cos com estas medicações em DP. Nível de recomendação U.
Contexto clínico: Embora ainda não existam estudos que recomendem
ou refutem o uso da domperidona, nossa sugestão é usá-la como primeira
opção. Não usar metoclopramida ou bromoprida devido ao risco de pio-
rar os sintomas parkinsonianos motores. A presença de Helicobacter pylori
também deverá ser tratada porque interfere com a absorção da levodopa
devido à gastroduodenite66. A disfunção gástrica é em parte responsável pe-
las utuações motoras e discinesias induzidas por levodopa na DP.
Quais os tratamentos efetivos para constipação intestinal? Tratamento não-
farmacológico. As principais medidas não-farmacológicas consistem em ati-
vidade física regular, ingestão de água e dieta rica em bras, uma vez que
auxiliam na motilidade intestinal. Suplementos alimentares à base de bras
como Psyllium, metilcelulose, policarbola são boa opção para aumentar
a quantidade de bras da dieta. Os alimentos ricos em bras são frutas,
vegetais, pão integral, nozes, legumes, cereais integrais e farelos. Alimentos
funcionais (probióticos, simbióticos, prebióticos e pós-bióticos), como é o
caso do Bidobacterium animalis, também auxiliam. Outra forma de facili-
tar o trânsito intestinal é treinar” o hábito intestinal para ritualizar o ciclo
de evacuações, uma vez que a defecação tem inuência psíquica e social65.
Todas essas medidas são baseadas em estudos Classe IV.
Tratamento farmacológico. O tratamento farmacológico da constipação
deve levar em conta um escalonamento da terapia, que consiste em uma
sequência de agentes laxativos que auxiliam na motilidade intestinal. Os
principais grupos de laxantes ou auxiliadores da motilidade intestinal clas-
sicam-se em55,64,65,67-70,73:
1. Emolientes fecais: Aumentam a quantidade de água retida nas fezes,
amolecendo-as. No nosso meio utilizamos docussato de sódio, normalmen-
te em associação com algum laxante de contato.
2. Laxantes de contato: Bisacodil (drágeas de 5 mg ou supositórios de
10 mg, dose máxima de 4 drágeas antes de deitar ou 1 supositório/dia).
3. Laxantes osmóticos: Causam secreção de água pelo intestino. Dentre
eles destacam-se lactulose, sorbitol, sulfato de magnésio, polietilenoglicol (em
associações), manitol. Muitos laxantes osmóticos precisam de poucos dias
para mostrar ecácia, e eles podem resultar em uma sobrecarga de eletrólito
e de volume em pacientes com insuciência renal ou insuciência cardíaca.
Além disto, também podem causar cólicas abdominais, distensão e atulência.
Doença de Parkinson – Recomendações 111
4. Toxina botulínica: Obstrução da via de saída das fezes na ampola
anorretal também contribui para o alentecimento do trânsito intestinal na
DP. Acredita-se que isto se deve a uma distonia focal do músculo puborec-
talis. Assim, uma das opções terapêuticas possíveis seria aplicação de Toxi-
na Botulínica Tipo A71. Obviamente, como em todo tratamento com toxi-
na, o benefício terapêutico não é permanente, durante em média 3 meses.
Um dos efeitos colaterais possíveis seria a incontinência fecal, mas também
é transitório72.
5. Outros: Outros tratamentos incluem novamente a eritromicina e o
betanecol, outros laxantes irritativos como o sene e o tegaserode.
Conclusões: Existem 4 estudos Classe III67-69,73 e 1 estudo Classe II70 que
avaliam a ecácia de agentes farmacológicos para constipação intestinal e
1 estudo Classe III com toxina botulínica. Uma metanálise recente da Co-
chrane conclui que ainda não é possível fazer qualquer recomendação for-
mal para o tratamento da DGI na DP com as evidências disponíveis. As-
sim, o manejo ainda será empírico até que futuros estudos bem desenhados
e controlados estejam disponíveis74.
Nível de evidência C: De acordo com o Colégio Americano de Gastroen-
terologia, existe uma recomendação que pode servir como auxílio no ma-
nejo da constipação intestinal, mas cabe ressaltar que não se trata de uma
recomendação formal para o manejo da DGI em DP75. Assim, os níveis de
recomendação para bras (Psyllium, policarbola cálcica, metilcelulose e
farelo), laxantes estimulantes e hidróxido de magnésio seriam grau B, en-
quanto os laxantes polietilenoglicol e lactulose e o tegaserode seriam grau A.
Contexto clínico: A maioria dos pacientes com DP refere constipação in-
testinal, tornando-se este o principal sintoma não-motor associado à doen-
ça. Alguns estudos mostram prevalência superior a 70%72, mas se levarmos
em conta a denição de constipação intestinal como sendo menos de 3
evacuações por semana, o número absoluto de acometidos é menor. Em
um estudo com follow-up de 12 anos, o risco relativo de desenvolver DP
em quem tinha menos de 1 evacuação/dia foi 4 vezes maior do que em
quem evacuava 2 ou mais vezes/dia76. A constipação intestinal inuencia
na qualidade de vida dos doentes com DP e não pode ser subestimada.
DISFUNÇÃO URINÁRIA
A disfunção urinária ocorre em 27 a 71% dos pacientes com DP e predo-
mina nos homens. Esta variação de frequência se deve à inclusão de outras
formas de parkinsonismo e à falha na identicação dos sintomas urinários
nas diversas casuísticas.
112 Doença de Parkinson – Recomendações
Os sintomas urinários ocorrem por disfunção do sistema nervoso peri-
férico77, ou pela perda do efeito inibitório sobre o reexo urinário exercido
pelos neurônios dopaminérgicos da parte compacta da substância negra,
mediado por receptores D178.
Os sintomas mais frequentes são os irritativos (frequência, urgência, in-
contincia e nocria), ocorrendo em 57 a 83% dos pacientes com DP.
As manifestações clínicas correlacionam-se com o achado urodinâmico de
contrações involuntárias do detrusor, nos estágios iniciais do enchimento
vesical (hiper-reexia do detrusor). Os sintomas obstrutivos (esvaziamen-
to vesical incompleto, intermitência, hesitação e fraqueza do jato urinário)
ocorrem em 17 a 27%79,80.
Duas séries investigaram a prevalência de sintomas urológicos em pa-
cientes com DP, comparando-os com controles. Os pacientes com DP
apresentaram uma prevalência signicativamente maior de urgência, es-
vaziamento vesical incompleto, noctúria, aumento da frequência diurna e
urge-incontinência. Sintomas obstrutivos (sensação de hesitação e jato uri-
nário curto) foram mais frequentes nos homens, talvez pela sobreposição
com sintomas prostáticos78,81.
Um estudo brasileiro controlado82 avaliou do ponto de vista urodinâ-
mico 61 pacientes com DP e 74 controles, tendo observado uma preva-
lência de 39,3% de disfunção urinária, contra 10,8% do grupo controle.
Todos os pacientes sintomáticos apresentavam sintomas irritativos e 25%
destes tinham sintomas obstrutivos relacionados à DP, sendo o mais co-
mum esvaziamento vesical incompleto. O sintoma irritativo mais comum
foi a noctúria, seguida por frequência e incontinência urinária. A sintoma-
tologia urinária não se associou ao sexo, duração e gravidade da doença,
hipotensão postural e sintomas ortostáticos, nem aos sinais cardeais e ao
tratamento com a levodopa. Somente a idade dos pacientes se correlacio-
nou com a disfunção urinária, o mesmo se observando no grupo controle.
Outras publicações relacionam a presença de sintomas urinários com tem-
po médio de sintomas motores de 5,75 anos83, ou com a gravidade da DP84.
Mecanismos infravesicais, como a disfunção do esfíncter uretral ou do
soalho pélvico, podem originar disfunção urinária, mas são relatados em
poucos estudos79.
O manejo terapêutico das disfunções urinárias da DP é complexo, devido
aos efeitos colaterais dos tratamentos farmacológicos e ao risco de deterio-
ração após o tratamento cirúrgico da uropatia obstrutiva nestes pacientes85.
O subcomitê de Padronização de Qualidade da Academia Americana de
Neurologia publicou em 2010 os parâmetros para tratar os sintomas não-
Doença de Parkinson – Recomendações 113
motores da DP, concluindo que não evidências sucientes para apoiar
ou refutar os tratamentos especícos para incontinência urinária (Nível U).
Recomendou também novas pesquisas multidisciplinares direcionadas à re-
solução destes problemas44.
Quais são os tratamentos dos sintomas irritativos? A síndrome da bexiga hi-
perativa é uma condição comum na DP, com impacto negativo na qualida-
de de vida. Os sintomas de bexiga neurogênica, principalmente urgência
e frequência, respondem ao tratamento com drogas anticolinérgicas, sen-
do as mais usadas a oxibutinina (2,5 a 15 mg/dia), a oxibutinina de longa
ação e transdérmica (5 a 30 mg/dia) e a tolterodina (longa ação, 2 a 4 mg/
dia, dose única)77. Os efeitos colaterais mais comuns são jato urinário cur-
to, boca seca, diculdade de acomodação visual, constipação e agravamen-
to do glaucoma.
Caso o tratamento com anticolinérgicos não apresente resultados su-
cientes, pode ser adicionado um antidepressivo tricíclico, o hidrocloreto de
imipramina.
Num estudo Classe III com 30 pacientes com DP, observou-se relaxa-
mento pélvico incompleto ou retardado em 11 deles, ocorrendo melhora
com apomorna subcutânea (4 mg). Não se observou melhora da hiper-
reexia do detrusor86.
Um estudo Classe III com 10 pacientes com DP e sintomas urinários,
o estudo urodinâmico pré e pós-apomorna evidenciou que esta melhora o
esvaziamento vesical, o uxo urinário e reduz o volume residual pós-mic-
cional, tendo sido observado um alargamento do esfíncter distal da uretra
após a sua aplicação87.
Numa série de nove pacientes com sintomas urológicos e DP, o efeito
da levodopa na hiper-reexia do detrusor foi variável, podendo melhorar
ou desaparecer no período o, ou melhorar sob o efeito da levodopa88.
A injeção intravesical de toxina botulínica (TB) tem sido cada vez mais
utilizada nos pacientes com bexiga hiperativa refratária aos anticolinérgi-
cos. Várias publicações sugerem efeitos benécos da aplicação intravesical
na bexiga neurogênica secundária a lesões medulares. Uma revisão para a
base de dados Cochrane concluiu que o uso terapêutico da TB intravesical
é relativamente recente, e que eventos adversos no curto e longo prazo po-
dem ocorrer com o aumento das suas indicações. Os estudos experimentais
com seguimento longo não incluíram participantes em número suciente
para garantir que não ocorram eventos adversos graves. A dose ótima de
TB que atenda aos critérios de ecácia e segurança também ainda não foi
114 Doença de Parkinson – Recomendações
determinada. Esta revisão, no entanto, não especica o papel da TB na be-
xiga neurogênica relacionada à DP89.
Quais são os tratamentos dos sintomas obstrutivos? O diagnóstico etiológi-
co da obstrução deve descartar causas estruturais, e o tratamento imediato
deve restaurar a excreção urinária através de sondagem, se necessário.
A medicação dopaminérgica melhora o esvaziamento vesical, através do
relaxamento do esfíncter estriado externo. Um estudo Classe III da pressão
uretral demonstrou seu decréscimo após tratamento com levodopa em 10
pacientes com DP e sintomas urológicos, ocorrendo um aumento da pres-
são uretral após uma semana sem levodopa90.
A literatura mostra dados conitantes sobre a dissinergia do esfíncter
vesical na DP, sendo a micção descrita em algumas publicações como si-
nérgica. Os alfabloqueadores têm ação na hipertonia uretral, com o risco
de hipotensão arterial91.
A indicação de cirurgia prostática deve ser analisada com cautela, pre-
cedida por avaliação clínica, urodinâmica e eletromiográca, pelo risco ele-
vado de incontinência pós-cirúrgica. Uma alternativa para o caso de obs-
trução prostática é a prótese endouretral91.
A hiporreexia do detrusor é um sintoma raro, geralmente relacionada
ao uso de anticolinérgicos. Se houver necessidade do seu uso, deve ser com-
binado com cateterização intermitente para prevenir infecção urinária79.
A estimulação do núcleo subtalâmico (NST), terapia ecaz para melho-
rar o período o e as discinesias na fase avançada da DP, pode melhorar a
função vesical. Estudos de urodinâmica em pacientes tratados com estimu-
lação bilateral do NST mostraram normalização da sensação de enchimen-
to vesical (Classe IV)92,93.
A estimulação do NST modula o controle cortical da função urinária,
retardando o primeiro desejo miccional e aumentando a capacidade vesical.
Um estudo Classe III avaliou as mudanças do uxo sanguíneo cerebral re-
gional em 11 pacientes submetidos a estimulação cerebral profunda bilate-
ral, através da tomograa de emissão de pósitrons. Seus resultados sugerem
que a estimulação cerebral profunda melhora a disfunção vesical, através de
facilitação do processamento da informação proveniente da bexiga94,95.
Conclusões: Não há estudos aleatorizados e controlados com anticolinér-
gicos no tratamento dos sintomas irritativos, mas seu mecanismo de ação e
uso clínico disseminado são consistentes com resultados benécos - dados
insucientes, Nível de evidência U. Não existem evidências sucientes para
tratar a incontinência urinária na DP com apomorna, toxina botulínica
Doença de Parkinson – Recomendações 115
intravesical ou estimulação cerebral profunda - dados inadequados ou con-
itantes - Nível de evidência U.
Contexto clínico: Os anticolinérgicos beneciam os sintomas irritativos
que geram incontinência urinária na DP, são amplamente usados e podem
causar quadro confusional na DP.
DISFUNÇÃO SEXUAL
Quais tratamentos são ecazes para a disfunção sexual na DP? A disfunção
sexual é um problema frequente, porém pouco investigado na DP. Disfun-
ção erétil e alteração da ejaculação foram descritos em 79% dos homens
com DP e redução da libido em 44%; em mulheres a diminuição da libido
ocorre em mais de 70%96.
A disfunção na DP é multifatorial: além da contribuição do compro-
metimento autonômico na doença, depressão, idade, comorbidades, uso
de medicamentos, alteração da imagem corporal e dependência do compa-
nheiro completam o quadro97,98.
A principal manifestação da disfunção sexual na DP é a diminuição da li-
bido em mulheres e a disfunção erétil em homens55. No entanto, outras quei-
xas comuns são: em mulheres, diculdade em atingir o orgasmo, redução do
desejo sexual e insatisfação sexual e, em homens, além da disfunção erétil,
insatisfação sexual, ejaculação precoce e diculdade em atingir o orgasmo99.
Há poucos estudos terapêuticos envolvendo a disfunção sexual na DP.
O tema muitas vezes não é abordado durante as consultas médicas de ro-
tina como deveria, porque tanto pacientes como médicos frequentemente
cam constrangidos em conversar a respeito100.
O foco principal dos estudos é o tratamento da disfunção erétil, que
engloba o uso de inibidores da fosfodiesterase (principalmente a sildena-
la), agonistas dopaminérgicos, reposição de testosterona, estimulação cere-
bral profunda e administração intracavernosa de prostaglandina E1. A dis-
função erétil é denida como incapacidade de alcançar ou manter ereção
peniana suciente para desempenho sexual satisfatório (NIH).
O inibidor seletivo da fosfodiesterase-5, citrato de sildenala, é a droga
mais usada para o tratamento de disfunção erétil mundialmente, na popu-
lação geral e também na DP55. O uso de inibidores da fosfodiesterase na
DP se mostrou seguro, porém pode desencadear hipotensão ortostáti-
ca101, particularmente em pacientes com DP e disautonomia, portanto o
médico deve aferir a pressão arterial em decúbito e em pé antes de prescre-
ver o medicamento. A sildenala e os demais medicamentos do grupo ini-
bem a fosfodiesterase GMP-cíclica especíca, aumentando o relaxamento
116 Doença de Parkinson – Recomendações
do corpo cavernoso mediado por óxido nítrico102. dois estudos Classe
IV avaliando o uso de sildenala em pacientes com DP103,104, na dose de
50 a 100 mg, que observaram melhora da função sexual nos pacientes com
DP, sem efeitos colaterais signicativos. Hussain et al.105 observaram me-
lhora signicativa na capacidade de obter e manter uma ereção após 10
semanas de tratamento ativo com sildenala em 12 pacientes com DP, ini-
ciando com 50 mg e titulando até 100 mg, com alterações mínimas na
pressão arterial (estudo Classe II)105.
A apomorna já foi usada para disfunção erétil em indiduos sem DP
e em pacientes parkinsonianos se descreveu que ela causa ereção penia-
na62. O sítio de ação da apomorna é o núcleo paraventricular do hipo-
tálamo. A apomorna sublingual na dose de 2 a 4 mg se mostrou ecaz
no tratamento da disfunção erétil, como indicado pelos resultados de um
estudo duplo-cego multicêntrico de 8 semanas por Dula et al.106, pom
este estudo não avaliou especicamente pacientes com DP106.
Um único relato de caso foi publicado de um paciente com ação bené-
ca potencial do ropinirol em paciente com DP e disfunção erétil107.
Alguns estudos mostram que a deciência de testosterona seria um fa-
tor adicional na explicação da alta frequência de disfunção erétil em pa-
cientes com DP, que ela afeta 20 a 25% dos homens acima de 60 anos
na população geral e é causa documentada de depressão, fadiga, diminui-
ção da libido e redução do desempenho no trabalho108. Alguns autores su-
gerem que homens mais velhos com DP e sintomas não-motores refratários
devem ser investigados para deciência de testosterona antes de se atribuir
os sintomas à DP. Em estudo de Okun et al.109, 5 mg de gel tópico de tes-
tosterona administrados diariamente para homens com DP e deciência de
testosterona melhoraram os sintomas da deciência da mesma (Classe IV).
Em pacientes com DP e disfunção erétil, sem resposta à farmacotera-
pia oral, a administração intracavernosa de prostaglandina E1 ativa é uma
alternativa possível110. se demonstrou benefício também da estimulão
cerebral profunda sobre a disfunção erétil em homens com DP, particular-
mente naqueles com menos de 60 anos (estudo Classe IV)111. Finalmen-
te, como último recurso, para pacientes que não respondam ao tratamento
convencional, a prótese peniana pode representar uma opção55.
Hipersexualidade é descrita na DP e faz parte da síndrome de desregula-
ção dopaminérgica, geralmente em associação com terapia dopaminérgica,
particularmente os agonistas37. Em caso de hipersexualidade, além de mo-
dicar a terapia dopaminérgica, podem ser prescritos antipsicóticos atípi-
cos, como a clozapina. Em caso de hipersexualidade ativa e repetida, pode
Doença de Parkinson – Recomendações 117
ser necessária uma terapia antiandrogênica. Já foi descrito também um caso
de hipersexualidade tratada com donepezil em um paciente com DP97.
Conclusão: Os estudos avaliando o tratamento da disfunção sexual na
DP são escassos e abordam basicamente a conduta na disfunção erétil. O
citrato de sildenala é possivelmente ecaz para tratamento da disfunção
sexual na DP (Nível C). Não estudos com outros inibidores de fosfo-
diesterase. Não há evidências sucientes da ecácia do uso de outras estra-
tégias nesta população, incluindo apomorna, agonistas dopaminérgicos e
estimulação cerebral profunda.
Contexto clínico: Questionamento acerca de disfunção sexual deve fazer
parte da avaliação de rotina dos pacientes com DP. Antes de se atribuir a
queixa a um quadro de disautonomia, devem ser excluídas outras causas,
como depressão e efeitos colaterais de medicamentos.
DISTÚRBIOS DA TERMORREGULAÇÃO
Quais tratamentos são ecazes para os transtornos da termorregulação? A pre-
sença de hiperidrose e de distúrbios da termorregulação na DP tem sido
descrita ao longo do tempo. Entretanto, apenas nos últimos anos esses sin-
tomas têm sido objeto de maior atenção. Estudos recentes estimam que
2/3 dos pacientes com DP apresentam sudorese excessiva, que pode estar
presente tanto na fase o como durante períodos de discinesias da fase
on112-114. Pacientes que evoluem com deterioração de m de dose frequen-
temente apresentam aumento episódico da sudorese ou outros transtornos
da termorregulação. Estudo com medidas sequenciais de sudorese em pa-
cientes com utuações motoras com deterioração de m de dose demons-
trou que os níveis de sudorese são maiores nos períodos de maior escore na
escala UPDRS115.
Quando comparados com controles normais, pacientes na ausência de
medicação apresentam maior intensidade de sudorese, enquanto após a me-
dicação a sudorese era igual aos controles116. Por outro lado, a suspensão
abrupta da medicação dopaminérgica pode causar sudorese intensa, hiper-
termia, taquipneia, taquicardia e alterações cognitivas. Em casos mais graves,
pode ocorrer rabdomiólise. Essas observações sugerem que a levodopa de-
sempenha papel importante na regulação dos mecanismos termorregulatórios
em pacientes com DP. Como forma frustra da síndrome neuroléptica malig-
na, a hipertermia isolada pode ocorrer 10-15 dias após início de tratamento
com clozapina ou após retirada abrupta de anticolinérgicos e amantadina117.
Sanghera et al.118 relataram paciente com DP que apresentava sudorese
profusa generalizada que desapareceu após estimulação do núcleo subtalâ-
11 8 Doença de Parkinson – Recomendações
mico. A sudorese retornava quatro horas após se desligar o gerador de pul-
so e cessava novamente após este voltar a ser ligado.
Estudos não controlados, com poucos pacientes, mostraram moderada
ecácia de agentes como cloreto de alumínio, anticolinérgicos (glicopir-
rolato), iontoforese e toxina botulínica para o tratamento de hiperidrose
focal55,119.
Conclusão: Embora vários estudos abertos, não controlados sugiram be-
nefício da levodopa no controle da sudorese excessiva e de uma série de subs-
tâncias como cloreto de alumínio e glicopirrolato no tratamento da hiperi-
drose focal, não existem estudos controlados para o tratamento dos distúrbios
da termorregulação na DP (estudos Classe IV, Nível de recomendação U).
Contexto clínico: A levodopa e outros agentes dopaminérgicos podem
aliviar, ou raramente acentuar, os sintomas. A siopatologia dos transtor-
nos da termorregulação na DP provavelmente envolve múltiplos mecanis-
mos neurais. O hipotálamo depende de modulação dopaminérgica para seu
funcionamento normal e parece desempenhar papel central nessa disfun-
ção. Entretanto, algumas áreas corticais, tálamo, tronco cerebral e medula
espinal provavelmente desempenham papel complementar para a regulação
da temperatura corporal63.
O tratamento mais efetivo para sudorese excessiva e disfunção termor-
regulatória da DP consiste no ajuste das doses de medicação dopaminér-
gica120. Quando a hiperidrose é focal, o tratamento pode ser feito com
agentes tópicos que incluem: cloreto de alumínio, anticolinérgicos (glico-
pirrolato) e iontoforese (técnica não-invasiva que utiliza corrente elétrica
contínua). A toxina botulínica tem sido usada para hiperidrose axilar, pal-
mar e plantar com bons resultados.
DISTÚRBIOS RESPIRATÓRIOS
Pacientes que apresentam deterioração de m de dose podem apresentar
utuações sensoriais, autonômicas, psiquiátricas e motoras. Embora pouco
frequente, a dispneia pode ser um sintoma importante associado a utua-
ções da terapia com levodopa. Embora seja um sintoma que acompanha as
oscilações motoras, outras causas de dispneia devem ser consideradas, tais
como doenças pulmonares, cardíacas e ansiedade. Dessa forma, impõe-se a
identicação da causa da dispneia para que se possa instituir o tratamento
adequado. Quando outras causas são excluídas e a dispneia pode ser atri-
buída à deterioração de m de dose, a adição de um inibidor da COMT
ou de um agonista dopaminérgico de meia-vida mais longa pode aliviar
esse sintoma121.
Doença de Parkinson – Recomendações 119
Causa rara de insuciência respiratória aguda é a paralisia da prega vo-
cal, uni ou bilateral, que raramente ocorre nas fases avançadas da DP122.
Outra causa potencial de insuciência respiratória e infecção pulmonar
consiste em penetração laríngea e aspiração silenciosa em pacientes que
apresentam sialorreia diurna25.
Indivíduos adultos normais deglutem preferencialmente durante a ex-
piração. Quando ocorre durante a inspiração, segue-se imediatamente uma
expiração. Estudos com eletromiograa que registram a ocorrência de cada
deglutição durante o ciclo respiratório sugerem que pacientes com DP apre-
sentam incoordenação entre deglutição e respiração durante a alimentação.
Quando comparados com um grupo controle, pacientes com DP deglutiam
preferencialmente durante a inspiração e com menor volume corrente. Além
disso, pacientes com DP exibem mais períodos inalatórios pós-deglutição.
A incidência elevada de disfagia orofaríngea e o risco de pneumonia aspi-
rativa encontrado em pacientes com DP podem ser, em parte, relaciona-
dos ao comprometimento da coordenação entre respiração e deglutição123.
Estudo avaliou a função pulmonar em 53 pacientes com DP que não
apresentavam sintomas de disfunção pulmonar ou cardíaca. Foi encontrada
disfunção pulmonar signicativa do tipo restritiva, parcialmente responsiva
a levodopa124.
Distúrbios respiratórios podem contribuir para a disartrofonia, fre-
quentemente encontrada na DP. Estudo de correlação entre capacidade vi-
tal, fonação vocálica sustentada e inteligibilidade sugere que a mobilidade
torácica esteja reduzida na DP e pode contribuir para a disartrofonia. Em-
bora o tratamento farmacológico resulte em melhora parcial desse distúr-
bio, é possível que as discinesias contribuam negativamente para a disfun-
ção do controle respiratório125.
Quais tratamentos são ecazes para o tratamento de distúrbios respiratórios na
DP? Quando a dispneia puder ser atribuída à deterioração de m de dose,
a adição de um inibidor da COMT ou de um agonista dopaminérgico de
meia-vida mais longa pode aliviar esse sintoma121.
Disartrofonia associada a distúrbios respiratórios apresenta melhora
parcial com o tratamento farmacológico adequado.
O controle das discinesias pode melhorar a disfunção respiratória.
Conclusão: Diversas medidas podem ser úteis para o tratamento dos
distúrbios respiratórios associados à DP. Entretanto, faltam estudos con-
trolados para o tratamento desses trantornos (estudos Classe IV, Nível de
recomendação U).
120 Doença de Parkinson – Recomendações
Contexto clínico: Distúrbios respiratórios são frequentes na DP e podem
estar associados a mecanismos diversos que incluem: oscilações motoras (as-
sociadas à deterioração de m de dose ou a discinesias), transtornos da coor-
denação entre deglutição e respiração e transtornos restritivos da caixa torá-
cica. Medidas que visem melhor controle dos sintomas motores com redução
dos períodos o e das discinesias podem reduzir o impacto desses distúrbios.
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126 Doença de Parkinson – Recomendações
Indicações de tratamento
cirúrgico na doença
de Parkinson
COORDENAÇÃO
Carlos Roberto de Mello Rieder e Delson José da Silva
COMPOSIÇÃO
Márcio da Cunha Andrade, Clécio de Oliveira Godeiro Jr.
Sônia Maria César de Azevedo S.M.M. Gomes,
José Marcelo Ferreira Bezerra
Doença de Parkinson – Recomendações 129
Indicações de tratamento cirúrgico
na doença de Parkinson
COORDENAÇÃO
Carlos Roberto de Mello Rieder
Delson José da Silva
COMPOSIÇÃO
Márcio da Cunha Andrade
Clécio de Oliveira Godeiro Jr.
Sônia Maria César de Azevedo S.M.M. Gomes
José Marcelo Ferreira Bezerra
INTRODUÇÃO
Durante os últimos anos, a estimulação cerebral profunda (DBS) tem sido
estabelecida como um tratamento seguro e ecaz para um grupo selecio-
nado de pacientes com a doença de Parkinson (DP)1-6. O DBS pode trazer
uma redução marcada dos sintomas parkinsonianos e trazer melhorias sig-
nicativas na qualidade de vida de pacientes adequadamente selecionados.
A identicação de pacientes que são os mais prováveis de se beneciar de
DBS é extremamente importante, sendo o primeiro passo para uma bem-
sucedida intervenção cirúrgica. Este capítulo apresentará os vários aspectos
que devem ser considerados na seleção adequada destes pacientes.
TRATAMENTO CIRÚRGIC O
Embora a cirurgia como opção terapêutica na DP tenha iniciado seu de-
senvolvimento ainda no começo do século XX, no nal da década de 60,
com a introdução da levodopa, houve uma redução acentuada da opção
cirúrgica como forma de tratamento da DP. As melhoras que a levodopa
trouxe por ocasião de sua introdução foram tão espetaculares que se acre-
ditava ter encontrado uma solução para esta doença. Contudo, após alguns
anos os problemas relacionados com o uso crônico da levodopa se torna-
ram evidentes. As utuações motoras e discinesias se tornaram problemas
de difícil controle em uma proporção signicativa de indivíduos. Com isso,
a partir do nal das décadas de 80 e os anos 90 houve um renascimento da
neurocirurgia para a DP, e novas técnicas começaram a surgir7,8.
As técnicas cirúrgicas mais utilizadas foram as ablativas, especialmente as
talamotomias e palidotomias estereotáxicas realizadas por radiofrequência,
130 Doença de Parkinson – Recomendações
e mais recentemente a técnica de estimulação cerebral profunda conhecida
como DBS, do inglês “Deep Brain Stimulation”. As técnicas ablativas são téc-
nicas onde através de um orifício de trepanação um alvo nos núcleos da base
é localizado e atingido por um eletrodo. Através desse eletrodo o neuroci-
rurgião realiza uma lesão gerada por radiofrequência nestes núcleos. São ca-
racterísticas dos métodos ablativos a sua irreversibilidade e limitação quanto
ao seu uso bilateralmente, devido ao aumento de morbidade, principalmen-
te no que se refere à diminuição do volume da voz e alterações cognitivas.
Outros fatores contribuíram para o ressurgimento da cirurgia da DP.
Um deles foi um melhor entendimento da organização funcional dos -
cleos da base. Outro aspecto importante foi o de melhoria das técnicas es-
tereotáxicas neurocirúrgicas associada às melhorias nas técnicas de neuroi-
magem, permitindo visualizar várias partes dos núcleos da base. As técnicas
modernas de estereotaxia utilizam alvos guiados por imagens de ressonância
magnética (RNM), tomograa computadorizada (TC) e modernamente por
fusão de imagens de TC e RNM. Somada a isso, a utilização de monitori-
zação eletrosiológica intraoperatória, disponível em alguns centros, pode
auxiliar na localização precisa de alvos cerebrais. Foi no início dos anos 90,
com os trabalhos de Benabid e Pollak, que a cirurgia de implante de DBS
foi introduzida, trazendo novos rumos no tratamento neurocirúrgico da
DP. Desde então inúmeros trabalhos têm descrito a ecácia da técnica9-12.
O cateter cerebral do DBS contém uma extremidade distal com quatro
eletrodos e é implantado em um alvo cerebral profundo utilizando técnicas
estereotáxicas neurocirúrgicas, semelhantes às utilizadas nos procedimen-
tos ablativos. Estes procedimentos geralmente utilizam imagens de RNM e
TC, ou ambas em fusão13. Quando disponível, a conrmação neurosioló-
gica transoperatória através de microeletrodos pode auxiliar na precisão de
alcance dos alvos desejados (núcleos cerebrais especícos)14. Os eletrodos
do DBS são colocados através de estereotaxia por um orifício de trepanação
e anestesia local, com o paciente acordado. Tal situação possibilita um con-
trole siológico operatório adequado, bem como facilita a observação de
efeitos adversos induzidos pela estimulação. Após o implante do eletrodo,
o neuroestimulador (também chamado de gerador de pulso implantável)
é sepultado, sob anestesia geral, geralmente na região subclavicular, muito
semelhante a um marcapasso cardíaco. Os cabos extensores são tunelizados
sob a pele, conectando os eletrodos ao neuroestimulador15. O Núcleo Sub-
talâmico (NST) e o Globo Pálido Interno (GPi) são os alvos mais utiliza-
dos atualmente no implante de DBS para tratamento da DP3. A escolha do
alvo não foi tema da reunião de recomendações.
Além da necessidade de um centro altamente capacitado na técnica de
Doença de Parkinson – Recomendações 131
implante do DBS, são necessários para o sucesso do procedimento pros-
sionais bem treinados na arte” da programação do mesmo. Utilizando o
programador de DBS, pode-se programar o gerador por telemetria, sele-
cionando quais eletrodos do cateter quadripolar deseja-se utilizar na esti-
mulação, bem como os parâmetros elétricos de estimulação (incluindo am-
plitude, largura de pulso e frequência de estimulação)16. Os mecanismos
siológicos sobre o benefício da DBS são extremamente complexos e não
bem compreendidos17-19. Independente do mecanismo siológico de ação,
a DBS tem um efeito supressivo reversível no NST e GPi, bem como mi-
metiza os efeitos das ablações destes alvos.
CRITÉRIOS DE SELEÇÃO
Os principais objetivos da cirurgia são buscar um benefício terapêutico
mais constante e previsível de terapia médica, tais que os pacientes podem
alcançar: (1) uma redução da gravidade dos períodos o; (2) aumento do
tempo em on (3) redução de discinesias; (4) supressão do tremor refratário
ao tratamento medicamentoso; (5) melhoria no desempenho das atividades
de vida diária; (6) melhoria na qualidade de vida.
Quais sintomas melhoram com o tratamento cirúrgico da DP? A cirurgia é
unicamente direcionada para o tratamento dos sintomas motores da DP. A
sintomatologia que melhora com DBS no STN e GPi são as do período
o (acinesia, rigidez, tremor), as distonias dolorosas e as discinesias. O be-
nefício é maior no paciente que tem o maior escore motor do UPDRS no
período o e o menor UPDRS no período on. De fato, o menor UPDRS no
período on é melhor preditor de resposta do que a magnitude de melhora
entre o on e o 2. O DBS no STN melhora a gravidade do tremor em torno
de 80%, logo pacientes com tremor, como sintoma predominante, são bons
candidatos para o DBS. A severidade da distonia no período o melhora em
90% e a dor reduz-se em 66%, logo distonia é também um bom critério de
seleção para DBS. Alguns sintomas não respondem ao implante de DBS,
tais como os sintoma axiais, especialmente marcha, instabilidade postural
e freezing, e os distúrbios da fala20,21. Sintomas parkinsonianos que não res-
pondem com o pico de dose de levodopa não costumam responder ao DBS.
Embora o DBS seja um tratamento ecaz para sintomas motores da
DP, ele não fornece uma cura e a doença vai continuar a progredir. No
momento, o DBS deverá ser considerado em pacientes que não conseguem
obter um controle adequado com terapia farmacológica otimizada.
A maioria dos ensaios com cirurgia na DP é de seguimentos inferiores
a 6-12 meses. Outra limitação importante destes estudos são as metodo-
132 Doença de Parkinson – Recomendações
lógicas, comuns aos desenhos de estudo não analíticos. No entanto, em
dois estudos o melhor tratamento medicamentoso foi comparado com a
cirurgia de forma randomizada1,6. No primeiro estudo (Classe II) foram
avaliados 156 pacientes com DP avançada aleatoriamente randomizados
para intervenção cirúrgica vs. não-cirúrgica (tratamento medicamentoso
otimizado) e mostrou-se que após 6 meses a opção associada ao tratamen-
to cirúrgico é mais efetiva que somente o tratamento medicamentoso em
pacientes com grave comprometimento motor1. No segundo e mais re-
cente estudo os pacientes foram randomizados ou para DBS no NST bi-
lateral (n=60) ou DBS no GPi bilateral (n=61) ou para tratamento clínico
(n=134)6. Neste estudo controlado e randomizado, a cirurgia com DBS foi
superior ao melhor tratamento clínico nos 6 meses de seguimento. O gru-
po com DBS apresentou aumento estatisticamente signicativo do período
on, sem discinesias, melhora na função motora e qualidade de vida quando
comparado aos pacientes em tratamento clínico. No entanto, eventos ad-
versos graves ocorreram em 49 pacientes com DBS e em 15 pacientes com
terapia clínica (P<0,001), incluindo 39 eventos adversos relacionados com
o procedimento e 1 morte secundária a hematoma intracraniano. Os efei-
tos a mais longo prazo não são bem estabelecidos22.
Qual paciente é candidato ao tratamento cirúrgico da DP? A correta seleção
dos pacientes é certamente o fator mais importante no sucesso do trata-
mento cirúrgico. Várias publicações têm dado recomendações para indica-
ção cirúrgica na DP4,23-25. Abaixo são apresentados critérios que devem ser
sempre obedecidos na seleção dos pacientes:
t Diagnóstico estabelecido da DP26,27.
t O paciente obrigatoriamente tem que ser responsivo à levodopa.
Exceto pacientes cujo sintoma predominante é o tremor, que po-
dem se beneciar de tratamento cirúrgico independente da resposta
prévia à levodopa. Tremor de repouso, por exemplo, pode ser resis-
tente a terapia dopaminérgica e necessitar de doses de levodopa não
toleradas pelo paciente; dessa forma, benefício independente da
resposta à levodopa.
t Controle insatisfatório de sintomas motores com melhor trata-
mento clínico. Resposta à levodopa no pré-operatório é o melhor
preditor para resposta positiva da cirurgia. Pacientes com parkinso-
nismo atípico não-responsivos à levodopa têm resposta pobre com
implante de estimulador cerebral profundo. São candidatos a ci-
rurgia pacientes com presença de utuações motoras ao tratamento
dopaminérgico (deterioração de nal de dose, efeito on-o e doses
Doença de Parkinson – Recomendações 133
isoladas sem efeito), discinesias e/ou tremor não controlados com
esquema medicamentoso. Uma das formas de denir a responsivi-
dade à levodopa é através da quanticação de mudanças no UPDRS
motor. Levodopa responsivo tem sido denida como a redução de
>25-50% na escala motora UPDRS (parte III) após administração
de dose efetiva de levodopa em comparação com o período o. Su-
gere-se o uso de 200 mg de levodopa na primeira dose do dia.
t Pacientes que têm intolerância à medicação devem ser considerados
candidatos para cirurgia.
t Possuir pelo menos 5 anos de doença. Pacientes com menor tem-
po de doença podem ser portadores de parkinsonismo atípico sem
as manifestações ainda claras no início do curso da doença. Como
mencionado previamente, pacientes com parkinsonismo atípico não
apresentam boa resposta cirúrgica.
t Objetivo de melhora de sintomas motores do tipo tremor, bradi-
cinesia e rigidez. Sintoma axial, especialmente marcha, instabilida-
de postural, freezing e distúrbio da fala que não respondem com o
pico de dose de levodopa não costumam responder a cirurgia. Ex-
ceto freezing do período o, onde pode haver melhora. Freezing do
período on apresenta pouca melhora28.
t Paciente deve ter facilidade de acesso ao centro para realizar ajustes
periódicos na programação do estimulador.
Conclusões: Existem evidências Classe B de recomendação de cirurgia
para DP nas condições acima.
Quais os riscos do tratamento cirúrgico na DP? Em grandes séries de pacientes
analisados com implante de DBS no NST uma melhora motora signican-
te com baixo perl de morbidade. Em uma série de 100 casos consecutivos
de implante de DBS na DP foram observados 7 casos de infecção pós-opera-
tório, 1 infarto cerebral, 1 hematoma intracerebral, 1 hematoma subdural, 1
quadro de embolia gasosa, 2 casos de hematoma de ferida operatória neces-
sitando de reintervenção, 2 de erosões de pele sob o gerador de DBS, 3 casos
de crise convulsiva durante o procedimento, 6 casos de necessidade de revi-
são do posicionamento do eletrodo, 13 pacientes com quadro confusional
pós-operatório e 16 casos de falência da bateria necessitando revisão. Den-
tre todos os 100 casos não houve nenhum óbito e nem caso de cit neu-
rológico novo permanente. A média de internação hospitalar cou em 3,1
dias29. Com base em 19 publicações revisadas, com um total de 913 pacien-
tes com DP e DBS no NST, a taxa de mortalidade foi de 0,3% (3 mortes)29.
Estes valores são inferiores aos observados com as técnicas ablati-
134 Doença de Parkinson – Recomendações
vas. Nas palidotomias unilaterais, por exemplo, observa-se um índice de
mortalidade de 1,2% e morbidade permanente de 13,8%. Nas palidoto-
mias bilaterais, procedimento abandonado devido ao elevado índice de
complicações, observa-se uma morbidade neurológica permanente maior
que 30%30-32.
Os efeitos da estimulação cerebral crônica em relação às funções cogni-
tivas, comportamentais e humor, não são bem compreendidos e os resulta-
dos das publicações se baseiam em seguimentos de curto prazo, com amos-
tras pequenas e por vezes contraditórios33. Os efeitos neuropsicológicos da
ECP no NST geralmente não acarretam deterioração cognitiva global34,
exceto por pequeno grupo de pacientes idosos, onde a descompensação
cognitiva é mais frequente ou em pacientes com declínios cognitivos pre-
sentes no pré-operatório35,36.
Não estudos que indiquem um pior prognóstico no pós-operatório nos
pacientes com prejuízo cognitivo leve. Um dos aspectos de que existem evi-
dências de deterioração no pós-operatório é no relativo à uência verbal37,38.
No entanto, em estudos com 5 anos de observação, as alterações de declí-
nio da uência verbal, apesar de existentes, não manifestaram um efeito
clínico signicativo nas atividades de vida diária dos pacientes com DP39.
Sintomas relacionados com depressão devem ser constantemente vigia-
dos após cirurgia de DBS. Em uma série de 24 pacientes, em 25% houve
piora signicativa do humor através das escalas de depressão de Montgo-
mery Asberg e Hamilton, sendo que em 3 pacientes houve ideação suicida
transitória mesmo com uma clara melhora motora. O posicionamento do
eletrodo em áreas especícas do NST talvez exerça relação com os sinais e
sintomas encontrados40. Estudos relatam a incidência aumentada de idea-
ção e suicídio no pós-operatório de implante de DBS na DP41.
Existe limite de idade para cirurgia? Não evidência suciente para esta-
belecer limite de idade para candidatos à DBS independente do sítio de
estimulação, STN ou GPi. A maior parte dos estudos exclui pacientes com
>75 anos. Estimulação do núcleo STN pode ter piores desfechos em ido-
sos. O mais importante que a idade cronológica é a idade correlacionada
com as comorbidades, como: disfunção cognitiva, avaliação de sintomas
resistentes à levodopa, incluindo disartria, disfagia, instabilidade postural
e distúrbio da marcha. Portanto, a avaliação do risco-benefício consideran-
do comorbidades e desfechos a longo prazo incluindo taxa de complica-
ção é o determinante para o candidato para DBS. Pacientes mais jovens no
momento da cirurgia e com duração menor de doença apresentam melhor
desfecho benéco pós-cirurgia23.
Doença de Parkinson – Recomendações 135
Contraindicações cirúrgicas. A avaliação pré-operatória de pacientes candi-
datos para cirurgia e implante de DBS inclui idade, alterações neuropsico-
lógicas e neuropsiquiátricas e presença de outras comorbidades23,42.
Quais as comorbidades clínicas que contraindicam cirurgia? Não existem es-
tudos com bom delineamento avaliando as comorbidades dos pacientes
candidatos a DPS.
Conclusões: Comorbidades sistêmicas sérias não compensadas devem ser
consideradas como contraindicação, incluindo doença cardíaca instável, in-
fecção ativa, doença cerebrovascular debilitante, neoplasias malignas.
Alterações na RNM de encéfalo contraindicam cirurgia? poucos estudos
avaliando a imagem cerebral como contraindicação para DBS e preditor
pós-operatório. Alguns centros contraindicam cirurgia em paciente com
atroa cerebral signicativa, aumento de ventrículos laterais ou outra es-
trutura patológica23.
Conclusões: É recomendada RNM de encéfalo no pré-operatório. Evitar
cirurgia em paciente com atroa cerebral signicativa, aumento de ventrí-
culos laterais ou outra estrutura patológica.
Presença de demência ou cit cognitivo signicativo contraindica cirurgia?
Apesar das poucas evidências, a tendência é excluir os pacientes com décit
cognitivo signicativo (pacientes com disfunção executiva no pré-operató-
rio têm um risco maior de desenvolver demência)36. Não está estabelecido
se o declínio cognitivo leve e de funções executivas em pacientes com DP
submetidos a cirurgia predizem risco de demência.
Conclusões: Pacientes com demência e prejuízo cognitivo grave não de-
vem ser submetidos à cirurgia para tratamento da DP. Testagem neuropsi-
cológica deve ser realizada na avaliação pré-operatória.
Presença de transtornos do humor contraindica cirurgia? A relação entre de-
pressão entre o pós-operatório e pré-operatório não foi completamente
avaliada. Os dados disponíveis não permitem concluir se a depressão piora
após a cirurgia. Existe risco de ideação suicida e suicídio em alguns pacien-
tes com depressão após cirurgia41.
Conclusões: Pacientes com depressão grave presente não devem ser sub-
metidos a cirurgia. Pacientes com história de depressão maior no passado
devem ser avaliados e seguidos por psiquiatra.
Presença de psicose contraindica cirurgia? Sintomas psicóticos são fator de
136 Doença de Parkinson – Recomendações
risco para o desenvolvimento de demência na DP. A presença de psicose
não controlada contraindica cirurgia23. História de sintomas psicóticos
deve ser cuidadosamente avaliada porque os sintomas podem ser um in-
dicativo de cit cognitivo precoce. Estes sintomas psicóticos devem ser
avaliados individualmente. Sintomas psicóticos isolados no passado, indu-
zidos por medicamentos anticolinérgicos, amantadina, selegilina.
Conclusões: Pacientes com psicose ativa não devem realizar cirurgia. Sin-
tomas psicóticos isolados e secundários a drogas potencialmente indutoras
de psicose podem ser considerados a cirurgia.
Existe diferença entre cirurgia ablativa e estimulação cerebral profunda? Sim.
O DBS é mais efetivo e com menos riscos no controle dos sintomas e com-
plicações motoras que a cirurgia ablativa. O DBS permite a possibilidade
de intervenção bilateral, procedimento contraindicado em métodos ablati-
vos. Além disso, o DBS, contrariamente ao que ocorre em cirurgias ablati-
vas, é um método reversível43.
Existe contraindicação de pacientes previamente submetidos a cirurgia ablativa
para o implante de DBS? Não. Pode ser recomendada a DBS contralateral ou
ipsilateral desde que não no alvo previamente submetido a cirurgia ablativa.
Existe algum papel para cirurgia ablativa? Sim. É um procedimento de me-
nor custo, e de fácil manejo operacional44. Não apresenta complicações
técnicas de longo prazo para acompanhamento do paciente em relação ao
DBS, tais como: fratura do eletrodo, infecção, migração do eletrodo, alte-
rações da programação do gerador.
Conclusões: DBS é a primeira escolha sempre. No entanto, em centros
remotos onde não disponibilidade de DBS, e onde a sintomatologia é
predominante unilateral, devemos considerar o método ablativo.
RECOMENDAÇÕES
t Pacientes devem ter diagnóstico estabelecido de DP. Incluir pacien-
tes com acinesia, rigidez, tremor, distonia dolorosa e discinesias nos
quais não se consegue controle adequado com melhor tratamento
medicamentoso. Somente incluir pacientes com DP sem manifesta-
ções atípicas. Com exceção do tremor, a sintomatologia deve ser res-
ponsiva à levodopa. Sugere-se que seja realizado UPDRS e avaliada
a resposta ao mesmo. Sempre avaliar se fez uso de esquemas medica-
mentosos otimizados, incluindo, além da levodopa, agonistas dopa-
minérgicos, inibidores da COMT, inibidores da MAO, amantadina.
Doença de Parkinson – Recomendações 137
t Não há limitação de idade. Pacientes jovens possuem maior chance
de terem benefício.
t Considerar comorbidades e espectativa de vida. Excluir pacien-
tes com comorbidades: (1) cardiovascular; (2) oncológicas de mau
prognóstico; (3) cerebrovasculares; (4) infecções ativas.
t Excluir pacientes com parkinsonismo plus. Excluir pacientes com pre-
domínio de sintomas axiais (marcha, instabilidade postural, freezing).
t Tempo do início dos sintomas no mínimo 5 anos. Exceções podem
ser consideradas no caso de tremores incapacitantes não responsivos
ao tratamento medicamentoso.
t Excluir pacientes com signicativa atroa cerebral, doença micro-
angiopática signicativa e/ou outras lesões estruturais signicativas
no exame de imagem.
t Avaliação cognitiva incluindo uma avaliação neuropsicológica: pacien-
tes com cits cognitivos importantes e/ou demência serão excluídos.
t Realizar rastreamento psiquiátrico. Pacientes com depressão maior
e/ou história de doença psiquiátrica signicativa no passado devem
realizar avaliação psiquiátrica. Pacientes devem ter seu quadro psi-
quiátrico controlado antes da cirurgia.
t Presença de sintomas psicóticos atuais e/ou passados induzidos por
levodopa são contraindicações cirúrgicas. Pacientes com episódios
isolados induzidos por drogas comumente relacionadas como in-
dutoras de psicose podem ser considerados para cirurgia desde que
apresentem funções cognitivas preservadas.
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